O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, o primeiro-ministro, António Costa, assim como muitas outras Altas Entidades do Estado vacinaram-se contra a Covid-19 no Hospital das Forças Armadas. Neste e noutros âmbitos, as Forças Armadas têm sido ultimamente objeto dos maiores encómios por parte dos altos dirigentes da Nação, tendo-se desdobrado nos mais rasgados elogios, louvores e aplausos.

As palavras “orgulho e gratidão” têm sido repetidas amiudadas vezes. Mas, como diz o ditado, quando a esmola é grande o pobre desconfia. Pena é que, para lá das demonstrações verbais de simpatia, essas palavras não se materializem em ações concretas, em atos tangíveis.

Ilustremos com um caso. Passados 13 anos sobre o início do processo de reestruturação hospitalar nas Forças Armadas, grande parte das intervenções previstas ainda não ocorreu. Em 2014, foi aprovado um Plano Diretor para o Hospital das Forças Armadas – Polo de Lisboa (HFAR-PL), no montante de 40 milhões de euros, com o objetivo de concentrar quatro hospitais e outras infraestruturas de saúde militar dos Ramos, repor e racionalizar as capacidades neles existentes.

Esse Plano Diretor previa numa primeira fase verbas no valor de 21,9 milhões de euros. Contudo, entre 2014 e 2016 foram utilizados apenas 3,8 milhões de euros, não tendo, até à data, sido autorizada a utilização dos 18,1 milhões em falta. Por outras palavras, os 40 milhões de euros iniciais foram primeiro transformados em 21,9 milhões e, mais tarde, em 3,8 milhões.

Segundo o Despacho 8430/2013, de 5 de junho de 2013, a verba destinada à “racionalização de capacidades” das várias infraestruturas de saúde militar teria origem na venda do Edifício do Hospital da Marinha, da Cerca do Convento da Estrela – Ala norte, e do Hospital Militar Principal (HMP), designado no diploma por Casa de Saúde da Família Militar. Dizia taxativamente esse Despacho, que esta seria a “forma de obtenção de receitas que contribuam para uma mais célere concretização das instalações do Hospital das Forças Armadas”.

O HMP do Exército foi vendido por 13.394 milhões de euros, e o Hospital da Marinha por 16.110 milhões de euros, já descontados os 10% que foram diretamente para os Ministérios das Finanças e da Defesa. Nos termos da Lei das Infraestruturas Militares (Lei 3/2019, de 3 setembro), estas verbas continuam cativas e disponíveis nos cofres do Ministério das Finanças para as necessidades identificadas no HFAR-PL. Segundo o Art.º 26.º daquela Lei, “os saldos apurados na execução da Lei Orgânica n.º 6/2015, de 18 de maio, transitam para o orçamento de 2019 para reforço das dotações das mesmas medidas e projetos no âmbito da presente lei, mediante autorização do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional.”

Passados 13 anos, em completo desrespeito pela Lei das Infraestruturas Militares, essas verbas que estavam alocadas ao HFAR-PL foram desviadas para outros fins, sabendo-se que aquele não possuía todas as capacidades hospitalares e estruturais necessárias ao seu funcionamento. Estas decisões prejudicaram e continuam a prejudicar significativamente os cuidados de saúde e a qualidade de vida dos utentes, para além de representarem, também, um profundo e descarado desrespeito pela condição militar. Ou seja, as capacidades existentes nos quatro hospitais não foram até hoje repostas, o que produziu uma degradação significativa do apoio sanitário aos militares.

Continua por construir um edifício para o bloco operatório. O atual, além de exíguo, obriga, a que nalguns casos, as macas com os doentes e os cirurgiões, enfermeiros e demais técnicos e auxiliares tenham de atravessar a sala de espera do serviço da imagiologia, na ida e vinda das intervenções cirúrgicas; falta construir um edifício para o serviço de imagiologia; continua a ser imperativo construir a ligação entre edifícios de modo a evitar que os doentes sejam submetidos à adversidade das condições meteorológicas. A generosidade das palavras, por mais ritmo, harmonia e beleza que tenham, sem respaldo em atos perdem credibilidade.