José Almaça aproveitou a conferência anual da Associação Portuguesa de Seguradores, para recordar o papel fundamental do seguro de proteção contra eventos catastróficos, em particular os relacionados com os fenómenos naturais. “Esta é uma área onde os riscos tenderão a agravar-se por via do efeito das alterações climáticas. Considerando o território nacional, hoje não merece discussão a importância da proteção contra os riscos de fenómenos sísmicos, bem como dos efeitos de grandes incêndios e de tempestades. Apesar disso, a penetração deste tipo de coberturas é ainda bastante incipiente na sociedade portuguesa”, alertou.
“Neste âmbito, relembro o projeto que se encontrou em consulta pública há alguns anos, mais precisamente no final de 2010, de criação de um sistema de cobertura do risco de fenómenos
sísmicos, que incluía a criação de um fundo para fazer face às perdas decorrentes deste tipo de
eventos”, salienou o regulador do setor.
“É tempo de recuperar este projeto e de lhe dar prioridade nacional. O seu estágio de desenvolvimento avançado permitiria recolocar este tema na agenda pública num curto espaço de tempo, sem prejuízo, naturalmente, da atualização dos estudos técnicos e da incorporação dos melhoramentos necessários ao desenho do sistema”, apelou o presidente da ASF.
Sugeriu ainda que este sistema poderia, numa segunda fase, ser alargado à cobertura de outros tipos de catástrofes naturais, “reforçando assim a resiliência da sociedade e da economia a este tipo de eventos, infelizmente cada vez mais frequentes, ao mesmo tempo que se aprofunda o papel do setor
segurador nacional na gestão deste tipo de riscos, que pode e deve incluir a atuação na fase de
prevenção”.
O Fundo Sísmico seria um fundo público em que o Estado assume o papel de ressegurador de recurso das seguradoras que têm seguros para catástrofes naturais.
“O tema escolhido para esta conferência anual da Associação Portuguesa de Seguradores – “A
importância da atividade seguradora na economia portuguesa” – não podia ser mais adequado e
atual”, começou por dizer José Almaça, presidente da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF).
Num momento que se espera ser de confirmação e reforço da retoma económica, o regulador dos seguros diz que importa “refletir de que forma o setor tem contribuído, e pode continuar a contribuir, para a melhoria progressiva do panorama macroeconómico nacional”
Destacou três áreas, que considera “bem demonstrativas da importância do setor no contexto da economia portuguesa, a saber: A função do seguro como mecanismo de proteção contra eventos adversos de ocorrência incerta; O setor segurador como grande investidor institucional, com capacidade de mobilização e de investimento de fundos numa ótica de médio e longo prazo; e, finalmente, o papel estabilizador do setor durante períodos de crise”.
A função natural e primordial do negócio segurador é a assunção e gestão de riscos que os agentes económicos não têm capacidade para suportar individualmente.
“Ao levar a cabo a gestão dos riscos presentes na sociedade, o setor segurador permite o
desenvolvimento de atividades que, de outro modo, seriam abandonadas pelos diferentes agentes
económicos, por falta de capacidade financeira individual”, disse Almaça na conferência anual dos seguros que tornou público um Estudo da Nova SBE sobre o setor segurador, da autoria de Francesco Franco.
“Como exemplo da dimensão dos riscos dos agentes económicos que são atualmente assumidos pelo
setor, a nível nacional, salientaria um valor agregado de salários seguros superior a 45 mil milhões de
euros, quase sete milhões de veículos seguros, dois milhões e setecentas mil pessoas abrangidas por
seguros de saúde e mais de seiscentos milhares de milhões de euros de capitais seguros de riscos
múltiplos habitação”, enumerou Almaça.
“A amplitude da cobertura proporcionada pela atividade seguradora manifesta-se desde a intervenção nas pequenas ocorrências comuns do nosso quotidiano, até aos eventos de baixa frequência, mas de elevada severidade” disse citando os “incêndios de calamitosas proporções que devastaram o nosso país nos segundo e terceiro trimestres deste ano”, onde a resposta do setor segurador “tem vindo a contribuir para a minimização dos impactos, tanto ao nível individual das pessoas afetadas, como ao nível coletivo, na reconstrução das comunidades e no apoio às atividades empresariais atingidas”.
Seguradoras como motores dos investimentos de longo prazo
“Gostaria de destacar, em segundo lugar, a capacidade do setor de mobilização e investimento de
fundos numa ótica de médio-longo prazo”, disse José Almaça.
“O ciclo de produção invertido que caracteriza o negócio das seguradoras confere-lhes liquidez para
investimento. Os fundos recebidos por via dos prémios são investidos predominantemente em
função da tipologia das responsabilidades assumidas, numa lógica de asset-liability matching,
atendendo ao perfil de longo prazo que caracteriza muitos dos contratos de seguro”, explica.
“Por sua vez, a própria natureza das responsabilidades de seguro leva a que, em muitos casos, os pagamentos das indemnizações e dos benefícios decorram no decurso de um período de tempo prolongado. Por estes motivos, é possível canalizar os fundos geridos pelas seguradoras para investimentos de médio e longo prazo, indispensáveis para o desenvolvimento estável e sustentado da capacidade produtiva nacional”, salientou Almaça.
Como se sabe, o setor segurador assume-se como um dos principais investidores institucionais,
injetando importantes montantes nos mercados de capitais. Com referência ao final do terceiro
trimestre de 2017, a carteira de investimentos do conjunto das empresas de seguros sob a supervisão prudencial da ASF ultrapassava os cinquenta mil milhões de euros, valor que corresponde
a mais de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) português.
No final de 2016, o setor segurador detinha mais de 10% do total das obrigações do tesouro nacionais admitidas à negociação na Euronext Lisboa – e como tal era um dos principais financiadores do Estado português e contribuindo decisivamente para a estabilização das suas condições de financiamento.
Adicionalmente o setor disponha ainda de mais de 3 mil milhões de euros investidos em títulos de emitentes privados nacionais, e de cerca de mil milhões de euros aplicados em fundos de investimento mobiliário e imobiliário geridos por entidades portuguesas.
“Tão importante como o elevado volume de capitais movimentados é a forma como os mesmos são
investidos, bem como o perfil deste investidor: um investidor qualificado e profundo conhecedor do
funcionamento dos mercados; um investidor que aplica os seus fundos numa lógica de obtenção de
fluxos de rendimentos estáveis; que diversifica o seu investimento e adota princípios de gestão sã e
prudente; e um investidor não especulativo”, disse o presidente da ASF.
As seguradoras assumem-se como um investidor que desempenha um papel fundamental na dinamização e na promoção da liquidez e da estabilidade dos mercados financeiros.
Em terceiro lugar, salientou o papel estabilizador que o setor assume durante períodos de crise, “com natural destaque para o exemplo da crise financeira recente por que passámos”, referindo-se à crise que afectou essencialmente o setor bancário.
“As empresas de seguros encontram-se expostas aos mesmos riscos que outras instituições financeiras, nomeadamente riscos de mercado, de crédito e operacionais. O seu modelo de negócio – baseado no princípio da mutualização do risco – é, no entanto, marcadamente distinto, assentando na agregação de um elevado número de riscos idiossincráticos, geralmente não correlacionados com os mercados financeiros e com o ciclo económico”, disse José Almaça.
Numa perspetiva global, “o setor segurador tem demonstrado um grau de resiliência superior aos
impactos da crise financeira, revelando capacidade de absorção dos choques sem propagação ou
ampliação material a outras componentes do setor financeiro. Nesse seguimento, é de realçar a atuação do setor nacional durante o auge da recente crise que afetou severamente toda a economia, tendo atuado como fonte de financiamento e de liquidez para outras entidades e setores do sistema financeiro”, referiu.
“Em particular, algumas das empresas de seguros integradas em grupos bancários foram chamadas a acorrer às dificuldades de financiamento e de liquidez de outras entidades do próprio grupo, não raramente à custa do agravamento do seu próprio perfil de risco”, disse Almaça sem citar exemplos, mas de que o caso da Tranquilidade é um exemplo paradigmático (foi chamada a financiar as empresas do Grupo Espírito Santo).
“Não obstante, fruto do maior grau de resiliência intrínseco à atividade seguradora, conjugado com a exigência de manutenção de adequado níveis de solvabilidade e de gestão prudente, foi possível navegar por essas águas turbulentas sem nenhum ‘naufrágio’ dentro deste setor, nem impactos no erário público a lamentar”, disse o supervisor dos seguros.J
José Almaça realçou que a “Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões – à qual tenho a honra de presidir – desempenha um papel fulcral, sendo responsável pela regulação e supervisão, quer prudencial, quer comportamental, da atividade seguradora e resseguradora e da mediação de seguros.
A missão da ASF, de assegurar o bom funcionamento do mercado segurador em Portugal com o objetivo de garantia da proteção dos tomadores de seguro, pessoas seguras, participantes e beneficiários, é inestimável do ponto de vista económico e social”.
Esta missão é assegurada através da promoção da estabilidade e da solidez financeira de todas as
instituições sob a sua supervisão – vertente prudencial –, bem como da garantia da manutenção de
elevados padrões de conduta por parte dos operadores – vertente comportamental, descreve.
Sendo “o acompanhamento de ambas as vertentes decisivo para a tomada das decisões que, em cada momento, melhor acautelam os interesses dos tomadores e seguros, segurados e beneficiários, não apenas numa ótica de curto prazo, mas principalmente no médio e longo prazo”, adiantou.
“Um setor segurador sólido e íntegro é condição prévia para o desenvolvimento e estabilidade de
outras atividades produtivas e contribui eficazmente para o crescimento económico e para a
estabilidade do sistema financeiro”, referiu ainda.
Numa visão para o futuro, Almaça disse que “o mercado, não obstante o seu elevado grau de maturidade, apresenta ainda um espaço de desenvolvimento significativo, quando comparado com os nossos parceiros europeus. No final de 2016, o índice de penetração do mercado nacional encontrava-se 1,5 pontos percentuais abaixo da média europeia, e o índice de densidade era inferior a metade da área do Euro”.
No caso do ramo Vida, a produção continua a estar intimamente ligada a fatores como os níveis de
concessão de crédito – sobretudo credito à habitação – e à existência de benefícios fiscais em
produtos de reforma ou de poupança de médio-longo prazo.
Já os ramos Não Vida continuam a ser dominados pelos seguros obrigatórios – nomeadamente os seguros Automóvel e de Acidentes de Trabalho. Estes dois seguros agregam atualmente mais de metade da produção total, “denotando que o seguro é ainda visto por muitos como uma obrigatoriedade e não como uma ferramenta essencial na nossa vida em sociedade”.
“Naturalmente, não posso deixar de, num parenteses, fazer menção à evolução francamente positiva
do ramo Doença, que desde o virar do milénio apresenta taxas de crescimento robustas, demonstrando que o setor tem sabido dar resposta ao aumento progressivo da procura de cuidados de saúde no setor privado. Deste modo, o seguro Doença assume uma crescente importância para a afirmação da relevância da atividade seguradora no contexto económico e social português, sendo um excelente exemplo que importa alargar a outros quadrantes”, referiu.
José Almaça pediu ainda ao setor para “enveredar esforços no sentido de uma maior consciencialização de todos os agentes económicos – famílias, empresas e Estado – da importância da atividade seguradora, que se traduza na criação de uma cultura de gestão de risco transversal e numa maior densificação e abrangência do setor”.
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