A esperança média de vida está a aumentar. É um facto. Mas viver mais não é sinónimo de viver com qualidade. Por esta razão, toda a tecnologia que possa ajudar a viver mais tempo, com mais qualidade, deve ser bem-vinda, mesmo com riscos associados.

O progresso tecnológico dos últimos anos, que envolve a Saúde Digital e os Dispositivos Médicos (novos sensores, computação de alto desempenho, algoritmos de inteligência artificial, big data, entre outros), está a oferecer a possibilidade de se obter melhores diagnósticos e tratamentos e, como consequência, o aumento ainda mais expressivo da esperança média de vida. Não obstante, para explorar em pleno estas capacidades, ainda falta um passo crucial: uma melhor ligação entre o corpo humano e os sistemas digitais.

A abordagem “Internet of Bodies” poderá ser esse passo. Considerando apenas aspetos técnicos, aparentemente, a “Internet of Bodies” (IoB) não é mais que uma extensão da Internet das Coisas (IoT), ao estabelecer a ligação entre o corpo humano e a Internet. Contudo, apesar das semelhanças técnicas, os conceitos tornam-se bastante diferentes quando juntamos os termos “corpo humano” e “segurança” na mesma frase.

Imaginar o nosso corpo como parte de uma rede exposta a potenciais falhas tecnológicas e ao eventual controle por parte de hackers gera, é claro, um sentimento de medo. No entanto, e apesar destes receios naturais, os benefícios gerados para a nossa saúde justificam a importância de encararmos a IoB com seriedade. Embora este cenário pareça fazer parte de um futuro ainda longínquo, a abordagem da IoB está a acontecer, colocando questões novas, que envolvem matérias legais e de segurança.

Nos próximos anos, prevê-se que haja uma tensão entre três pontos de vista diferentes. Por um lado, a pressão para ter melhores soluções de saúde. Um outro ponto de vista será o facto da tecnologia já estar disponível e pronta a utilizar. Por último – mas não menos importante –, as questões legais, éticas e de segurança. Dada a complexidade da tipologia de produtos relacionados com IoB, a cadeia de inovação terá de sofrer alterações, sob pena de nunca usarmos todo o potencial desta oportunidade.

Se usarmos uma abordagem clássica – do ponto de vista de ideação, desenvolvimento, teste e experimentação –, vamos ter ciclos de desenvolvimento demasiado longos, ou, eventualmente, parte desses produtos nunca chegarão ao mercado. Usando o modelo de desenvolvimento CIMIT, que acompanhou vários dos dispositivos médicos que desenvolvi no IPNlas, tenho a perceção de que existe uma disrupção na cadeia de inovação logo a seguir à etapa “provas de conceito”.

As invenções (protótipos) não conseguem provar o seu valor e não progridem na cadeia, ou seja, nunca se transformam em inovação. Apesar de um investimento considerável em Investigação e Desenvolvimento, a sociedade não beneficia em pleno dessa aposta que todos estamos a fazer nas fases iniciais. A ineficiência é particularmente expressiva no setor da saúde, pois necessita de duas perspetivas particulares, não presentes noutros mercados: a perspetiva clínica e a perspetiva regulamentar.

Estas duas abordagens podem ser um bloqueio à inovação, se não forem criadas “zonas especiais” de experimentação onde os serviços clínicos e regulatórios percebem a “mecânica” particular associada à criação de produtos e serviços para a área da saúde, em particular na área do IoB.

Estas “zonas especiais” de experimentação teriam um impacto considerável nas empresas – em particular nas pequenas, que não têm recursos suficientes para entender toda a cadeia de inovação; e poderiam abrir caminho à validação de novos produtos e serviços; e a novas abordagens tecnológicas, não bloqueando, à partida, conceitos disruptivos, e moldando a legislação para que a sociedade possa, a prazo, beneficiar com segurança destes avanços tecnológicos.