Da rentrée política do PS, além do excêntrico episódio do comboio, sobrou uma proposta para o próximo OE que pretende fazer regressar ao país “os jovens e não jovens, qualificados e não qualificados”, que emigraram para o estrangeiro entre 2010 e 2015.

A ideia de base é meritória, tudo é resto é, no mínimo, duvidoso. Porque assenta numa borla fiscal (dedução integral das despesas de reinstalação e metade do IRS durante cinco anos) limitada a uma franja de emigrantes. Porque parte do pressuposto que os impostos foram uma razão para a emigração. Porque não reduz e muito menos resolve o problema da precariedade e dos baixos salários. Vamos por partes.

Ao contrário das expectativas de António Costa, a medida anunciada não está a ser bem acolhida junto da comunidade de portugueses no estrangeiro. A título de exemplo, o diretor do jornal das comunidades “Lusojornal” considera-a “discriminatória”. E vai mais longe: “Anunciar medidas deste género, em oposição aos ‘convites’ para emigrar, faz todo o sentido, fica bem nas capas dos jornais e reforça a convicção dos militantes”.

Este programa de benefícios fiscais, para além de criar discriminação entre emigrantes (uns são ajudados, outros não), potencia-a entre todos os portugueses (uns pagam todos os impostos, outros pagam apenas metade). Refira-se que o Programa VEM, criado pelo anterior governo em 2014 para incentivar o regresso de emigrantes ao país, foi abandonado por António Costa imediatamente após a sua tomada de posse, em 2015, por revelar fragilidades e ser pouco abrangente.

Qual é então a razão para tratar de forma diferenciada quem vive em Portugal e quem pondera regressar a Portugal?

Os portugueses que emigraram, fizeram-no por manifesta falta de emprego e de salário suficiente. Foram procurar melhores oportunidades profissionais, rendimentos mais elevados, posições menos precárias. Não emigraram por causa do IRS ou de outros impostos, o que significa que também não serão eles razões suficientes para regressar.

E a verdade é que muitos problemas que existiam antes desse êxodo, continuam ou agravaram-se. Por exemplo, a precariedade. Portugal é o terceiro país da União Europeia com maior taxa de precariedade. A percentagem de empregados que têm vínculos temporários em Portugal tem oscilado entre os 20% e os 22% na última década, segundo dados divulgados pelo Eurostat. O valor registado em 2017, 21,4%, é muito superior à média da UE, 13,4%, e da zona euro, 14,9%, e com países como a Alemanha a não ultrapassar os 11%.

Se estes problemas não se resolverem – o Governo até teve uma boa oportunidade com a revisão no mês passado do Código de Trabalho – não haverá medidas eficazes para fazer regressar os emigrantes ao nosso país. O que nos faz concluir que esta solução encontrada pelo Governo serve outros propósitos bem menos dignos, como sejam os interesses do secretário-geral do PS de não só não gastar muito dinheiro, mas também por questões eleitoralistas, o manter o tema do resgate e da troika no debate público em 2019. O que convenhamos, com eleições à porta, dá um certo jeito.

Se António Costa e o partido que governa, quiserem fazer alguma coisa de facto pelos nossos emigrantes (e também, já agora, pelos que cá resistiram e ficaram), haverá muito para fazer, mas não é este o caminho, seguramente.