É sintomático, porque analisar os vários números da petrolífera estatal angolana ao longo dos anos causa, no mínimo, confusão frequente.

O caso mais gritante ocorreu em 2012, quando o FMI alertou que havia uma discrepância de 32 mil milhões de dólares(!) nas contas públicas do país, relacionado com as operações “quasi-fiscais” da empresa. De forma mais regular, o relatório de contas anual fornecia dados agregados, sendo difícil avaliar as atividades da empresa. Nas conferências de imprensa, muitas perguntas sobre números acabavam por não ser respondidas. Um exercício de opacidade criticado por instituições internacionais e ONG.

A última dessas conferências, no final de fevereiro, resultou num conflito que envolve números, mas que é tudo menos opaco. O novo CEO, Carlos Saturnino, acusou a antecessora, Isabel dos Santos, de ter cometido várias irregularidades, antes e mesmo depois de ter sido exonerada em novembro de 2017. Desde gastos com consultores, passando por salários dos administradores até transferências após o despedimento.

Em resposta, a empresária chamou Saturnino de “mentiroso” e emitiu um comunicado a detalhar a defesa.

É impossível, para já, saber quem tem razão nesta guerra de acusações. No entanto, há alguns pontos que são claros. Primeiro, Isabel dos Santos tem razão quando diz que a campanha que está a ser feita contra ela é politizada. Dado o tamanho e importância da empresa, tudo o que é relacionado com a Sonangol é uma questão política, especialmente agora, numa altura de transição de poder.

Segundo, quando a empresária diz que as acusações são “revisionismo” e um regresso à “antiga escola” da Sonangol pode até ter razão, mas não ajuda à força da sua defesa. Sim, Saturnino já tinha estado à frente da empresa no passado. Mas agora foi nomeado por João Lourenço, que foi escolhido como candidato à presidência do país por José Eduardo dos Santos. E foi o antigo presidente que nomeou todos os CEO da “velha escola” da Sonangol.

Terceiro, Isabel dos Santos não pode esquecer que ela própria foi nomeada pelo pai. Pode ter sido uma decisão para renovar a Sonangol, mas foi uma escolha de risco e altamente criticada. Dado o papel que a empresária tem no mundo do negócios em Angola, e a forma como beneficiou de decisões políticas no passado, usar o histórico da gestão da maior empresa do país como defesa não é uma estratégia convincente. Não é por acaso que muito angolanos a apelidavam de ‘princesa’ do regime.