A França venceu bem o Mundial. Tem melhor equipa que a Croácia. Mais realista e eficaz. E a final mostrou como o “lado da morte” do quadro foi importante. Foi aí que se jogaram os jogos mais determinantes do torneio: o Brasil-Bélgica, primeiro; e o França-Bélgica, depois. Nesses jogos estiveram as três melhores equipas da prova, sem qualquer menosprezo pela boa campanha da equipa croata, liderada pela dupla Modric-Rakitic, que não ganhou qualquer jogo nos 90 minutos desde que começaram os oitavos-de-final. Ao contrário, nesse período, a França ganhou-os todos, para no final apresentar seis vitórias e um empate (0-0 com a Dinamarca na fase de grupos). A Bélgica, que mostrou a sua enorme qualidade na final de consolação, com a Inglaterra, fez seis vitórias e uma derrota (com a França).

A Croácia não estudou devidamente a final do último Europeu, ganho por Portugal. Preferiu a franqueza ao cinismo, a posse de bola em detrimento do prescindir da iniciativa (também porque não se sente tão à vontade na passagem defesa-ataque). Essa escolha, e os erros por ela influenciados, determinou a melhor opção de jogo para a França, equipa de jogadores experientes, contrastados e onde há Mbappé, o “fórmula 1” do futebol Mundial, um jovem com um potencial extraordinário que começou a ser lapidado por Leonardo Jardim, no Mónaco.

Não se pode dizer que a vitória da equipa de Deschamps – outro homem para a História do futebol com o seu estatuto de duplo campeão, como jogador e treinador – tenha sido particularmente brilhante ou para recordar, ao nível de outras no passado.

A França ganhou bem sendo eficaz e organizada. Tem um excelente guarda-redes, Lloris, que se permitiu assinar na final talvez o maior erro de um guarda-redes na prova, oferendo o 2-4 a Mandzukic; um defesa-direito, Pavard, que foi das maiores revelações do torneio; bons jogadores em todas as posições e os seus três mosqueteiros: Pogba (apesar de tudo o D’Artagnan desta história), mais Kanté, Griezmann e Mbappé. Até dá para ter um ponta-de-lança discreto (Giroud). Nesta final, Kanté sucumbiu ao cartão amarelo e ao desgaste físico do último mês – por isso foi substituído. A equipa não encanta, como a Bélgica, de De Bruyne e Eden Hazard, mas é coletivamente muito forte e organizada. Uma equipa difícil de vencer.

A Croácia foi demasiado romântica na abordagem ao jogo. Talvez por acreditar demasiado nas suas qualidades, por estes dias tão elogiadas globalmente, a equipa expôs-se a tomar conta do jogo, a competir e talvez a levar à letra as palavras finais da palestra que o treinador, Zlatko Dalic, anunciou publicamente: a de se divertirem. Não terá sido a melhor estratégia, até porque a retaguarda da equipa não é tão fiável como a francesa, como se viu.

Algumas notas sobre o Mundial:

1 – O VAR veio para ficar. É preciso, no entanto, uniformizar decisões, como no caso das faltas no princípio das jogadas de golo. Começou com a cotovelada de Diego Costa a Pepe e na final, na jogada do primeiro golo francês, também não pareceu existir uma falta, de Griezmann. No “penalty” de Perisic nada a dizer – foi! O grande erro do Mundial esteve no “penalty” evidente não assinalado contra a Rússia, que talvez tivesse permitido à Espanha um outro fôlego, nunca se sabe. Mas, por muito que alguns saudosistas da paróquia não gostem, o mundo não voltará para trás. E ainda bem. Hoje tudo é escrutinável e só há que acentuar esse caminho, melhorando tudo, sobretudo ao nível dos critérios dos árbitros.

2 – Modric é uma escolha aceitável para melhor jogador da prova, à frente de Eden Hazard e Griezmann . Menos polémica que a entrega do troféu a Messi, há quatro anos, no Brasil. Courtois é mesmo o melhor guarda-redes e Mbappé o melhor jovem – e até podia ter sido escolhido para mais do que isso…

3 – A prova, sempre que se fizerem os resumos históricos, lembrará a aceleração sobre-humana de Mbappé, no jogo com a Argentina; o maravilhoso contra-ataque da Bélgica, na parte final do jogo com a Inglaterra, bem defendido por Pickford; e, não é nacionalismo, a forma como Cristiano Ronaldo foi protagonista, com os seus três golos, no empate de Portugal com a Espanha.

4 – O Brasil tinha grandes argumentos e, na minha opinião, a equipa mais equilibrada. A falta de Casimiro foi muito sentida contra a Bélgica – mas esse era um dos jogos de tripla do Mundial. Nada a dizer, nem de Neymar, apesar das anedotas sobre as suas constantes quedas. A verdade é que é um jogador muito castigado mas isso faz parte de assumir sempre a posse da bola nas zonas mais proibidas.

5 – Finalmente, a Inglaterra apresentou uma equipa à altura. Muito jovem, tem espaço para crescer no panorama internacional nos próximos anos.

6 – O equilíbrio evidente tem a ver com a globalização e o conhecimento dos jogadores uns dos outros. A maior parte conhece-se de perto, frequenta as maiores Ligas da Europa e muitos integram, até, as mesmas equipas. Cada vez a competição parecerá ser mais aberta. Mas também continuará a ser definida nos pormenores e a favor das melhores equipas e dos seus grandes jogadores. Ou seja, se virmos bem, não houve tantas mudanças assim. A Bélgica fez de Holanda, a Croácia de Portugal, e no final ganhou uma das equipas do costume.