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A interrelação de Angela Merkel com três primeiros-ministros portugueses

Do apoio ao PEC IV de Sócrates até à nomeação de Centeno como presidente do Eurogrupo, passando pelos elogios a Passos Coelho que “conduziu Portugal por um período bastante conturbado”. Como Merkel lidou com três primeiros-ministros em 13 anos.
30 Outubro 2018, 09h15

Angela Merkel assumiu pela primeira vez o cargo chanceler da Alemanha em novembro de 2005, apenas oito meses depois de José Sócrates ter tomado posse como primeiro-ministro de Portugal. A relação institucional entre ambos teve um ponto alto em 2007, quando Portugal exerceu a presidência rotativa do Conselho da União Europeia (sucedendo à Alemanha), mandato que seria marcado pela assinatura do Tratado de Lisboa, no dia 13 de dezembro, que reformou o funcionamento da União Europeia (UE).

Nessa altura, Merkel considerou que “foi muito estreita e pautada por grande confiança mútua” a cooperação entre as presidências alemã e portuguesa do Conselho da UE, não deixando de enaltecer a atuação de Sócrates. “Tive sempre uma intensa troca de impressões com o primeiro-ministro português, José Sócrates, sobre todos os dossiês europeus importantes nos últimos meses”, declarou a chanceler alemã, no dia 21 de dezembro de 2007.

À medida que as contas públicas de Portugal se degradaram, a relação entre Merkel e Sócrates tornou-se mais tensa. Entre setembro de 2010 e março de 2011 sucederam-se as novas versões do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), quatro no total, com medidas de austeridade visando a redução do défice orçamental. Apesar da tensão, Sócrates manteve linhas de diálogo e cooperação com Merkel, ao ponto de ser acusado pela oposição em Portugal de subserviência em relação à Alemanha. E quando a reprovação do PEC IV no Parlamento resultou na queda do Governo de Sócrates, em março de 2011, Merkel fez questão de elogiar o homólogo português. “Estou grata a Sócrates por tomar a responsabilidade das contas públicas do seus país”, declarou na altura.

Poucos se recordarão, mas a interrelação entre Merkel e Pedro Passos Coelho (sucessor de Sócrates no cargo de primeiro-ministro de Portugal, em 2011) não começou da melhor maneira, tendo a chanceler lamentado o chumbo do PEC IV no Parlamento. Em março de 2011, durante uma cimeira do Partido Popular Europeu (PPE), Passos Coelho conversou com Merkel e manifestou a sua discordância. “Não é a nossa opinião [do PSD] e não é a minha opinião. De resto, tive oportunidade de falar com a senhora Merkel e de lhe transmitir justamente esse ponto de vista”, revelou então Passos Coelho aos jornalistas.

Não obstante essa crítica inicial, coube a Passos Coelho executar o programa de resgate da troika e a cooperação com o Governo de Merkel foi tão intensa que o primeiro-ministro português (tal como Sócrates) foi acusado de subserviência em relação à Alemanha. Mais recentemente, em novembro de 2016, Passos Coelho enalteceu o “apoio” e a “ajuda” de Merkel a Portugal. “Devemos à Alemanha muito apoio e muita ajuda, numa altura em que precisávamos. O engenheiro Sócrates foi lá, quando era primeiro-ministro, à procura desse apoio e teve-o. Era socialista e a senhora Merkel, democrata-cristã, apoiou-o para ver se a situação política nacional trazia uma melhoria da situação económica e financeira. Também me ajudou muito e ajudou muito o país. Um dia escreverei sobre isso, como deve ser”, afirmou Passos Coelho, em entrevista.

Seguiu-se António Costa no cargo de primeiro-ministro. Em fevereiro de 2016, no final de uma reunião entre Costa e Merkel em Berlim, a chanceler alemã reconheceu que Portugal viveu “tempos difíceis” nos últimos anos, mas sublinhou que foram conquistados importantes progressos durante o processo de ajustamento e elogiou Passos Coelho. “O antecessor de António Costa conduziu Portugal por um período bastante conturbado, não foi fácil, mas na verdade foram conseguidas coisas impressionantes e deve-se fazer tudo para continuar este caminho bem-sucedido”, declarou.

Tal como fizera em relação a Sócrates, Merkel demonstrou a sua lealdade para com o antecessor no cargo de primeiro-ministro de Portugal, começando a interrelação com o sucessor de forma cautelosa. Mas a trajetória de reequilíbrio das contas públicas portuguesas acabou por neutralizar essa desconfiança inicial. Ao ponto de a Alemanha ter apoiado a nomeação de Mário Centeno, ministro das Finanças de Portugal, para a presidência do Eurogrupo.

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