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A tributação internacional como fator de atração de investimento estrangeiro

Os investidores almejam estabilidade. Talvez mais do que taxas de imposto reduzidas, os investidores precisam de conseguir planear e projetar os investimentos no médio-longo prazo.
25 Julho 2020, 20h00

Nesta altura de grande incerteza, provocada pela pandemia da Covid-19, muitos são os setores em Portugal que urge recuperar com celeridade. O investimento estrangeiro será, com certeza, um fator muito relevante para essa recuperação tão necessária e desejável.

Desde logo, um investidor almeja estabilidade. Talvez mais do que taxas de imposto reduzidas, os investidores precisam de conseguir planear e projetar os investimentos no médio-longo prazo, sendo imprescindível um regime fiscal o mais transparente possível e a estabilidade temporal do mesmo.

Quanto às taxas de imposto, em particular do IRC, há pelo menos dois fatores relevantes que devem ser de reequacionar: (i) a Derrama Estadual, que visava ser uma medida temporária e já lá vão 10 anos, e que pode atingir uma taxa incremental de 9%, representando assim um peso muito significativo para as grandes empresas, e (ii) a tributação autónoma sobre determinados encargos (com viaturas, despesas de representação, ajudas de custo e km’s, etc.), que torna difícil explicar a um investidor estrangeiro que, mesmo durante o período de investimento em que os lucros são inexistentes ou reduzidos, a empresa tenha de pagar um imposto sobre despesas, distorcendo completamente a métrica da taxa de tributação efetiva, muito analisada por Grupos de cariz multinacional.

Portugal tem à disposição dos investidores uma panóplia de incentivos ao investimento produtivo, à investigação e desenvolvimento, um “patent box” atualmente também abrangendo programas de computador, mas também tem uma legislação fiscal complexa, o que veio a ser incrementado pelos desenvolvimentos mais recentes a nível de tributação internacional, como sejam:

• A implementação do Multilateral Instrument da OCDE que vem alterar várias Convenções sobre dupla tributação (“CDT”);
• A transposição das Anti-Tax Avoidance Directives da União Europeia que reforçam normas anti-abuso, algumas das quais com elevada complexidade técnica, como é o caso das relativas às assimetrias híbridas recentemente introduzidas no Código do IRC;
• O Mandatory Disclosure Regime que será implementado brevemente.

Mas a questão da tributação do investimento estrangeiro não passa apenas pelos impostos pagos sobre o lucro realizado em Portugal, mas em grande medida sobre a retenção na fonte incidente sobre os pagamentos para o estrangeiro. Nesta matéria, Portugal é um país onde a tributação das transações “cross-border” – v.g., pagamentos de juros, royalties, serviços e dividendos – é efetuada a taxas elevadas, regra geral, de 25% em sede de IRC (mas, nalguns casos, podendo atingir os 35%). É verdade que existem mecanismos que permitem eliminar ou reduzir substancialmente essa carga tributária, nomeadamente através de Diretivas da União Europeia (no caso de juros, royalties e dividendos) e de CDT (no caso de juros, royalties, serviços e dividendos).

Contudo, há várias situações em que as Diretivas da União Europeia não ajudam, designadamente no caso de juros e royalties, devido ao restrito âmbito de aplicação entre empresas associadas, razão pela qual vários Estados-Membros da União Europeia têm adotado isenções de retenção na fonte – em particular, no caso dos juros – quando a entidade beneficiária (mutuante) é residente na União Europeia, reconhecendo que o financiamento é imprescindível ao investimento e a existência de retenção na fonte acaba por resultar num maior custo de financiamento para as empresas. Aliás, Portugal, no caso dos dividendos, também foi além da Diretiva Europeia no sentido de permitir uma isenção de retenção na fonte de IRC sobre dividendos pagos a entidades residentes em país com o qual se encontre em vigor uma CDT, desde que verificados determinados requisitos e condições, o que permitirá a continuidade na repatriação de lucros sem uma dupla tributação económica, por exemplo, para sociedades inglesas mesmo após o Brexit. A ver vamos se o mesmo será exequível para os juros e royalties, à semelhança do que hoje é aplicável à Suíça.

De referir que, em 2015, foi dado um passo importante na dinamização de investimento estrangeiro com a alteração ao regime fiscal consagrado para o Organismos de Investimento Coletivo (“OIC”), que tem como premissa base a não tributação “à entrada” na esfera do OIC e, consequentemente, uma tributação “à saída”, pelo menos no que se refere aos OIC imobiliários, na esfera dos participantes / investidores, em linha com os regimes comparáveis de outras praças europeias.

É, ainda, importante referir o regime dos residentes não habituais que se encontra em vigor desde 2009 e que tem seguramente colocado Portugal no horizonte de muitas pessoas com elevada capacidade financeira e empreendedora. Em paralelo, o regime dos “Golden Visas” também tem sido um motor muito relevante para a dinamização, em particular, do setor imobiliário. Assim, há que acarinhar estes regimes e limar algumas arestas que ainda existem para que se tornem suficientemente interessantes e competitivos face ao expetável crescimento de incentivos e regimes que visam estimular o investimento e a atratividade de outras jurisdições europeias na senda da recuperação económica.

Mas conforme referido, a competitividade deve ser vista como uma interseção entre as taxas de imposto, aos vários níveis, e a estabilidade do próprio regime fiscal, pelo que é importante estruturar um regime fiscal que seja competitivo e sustentável no médio-longo prazo, simplificando ao máximo a teia de legislação existente e o cumprimento do leque de obrigações fiscais existentes.

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