Depois da América do Sul e do Médio Oriente, parece que desta vez é África. Donald Trump, que apesar de tudo ainda é o presidente dos Estados Unidos, disse qualquer coisa com que queria dizer que não quer mais imigrantes africanos no seu país. O que ele queria dizer tem de ser inferido, dado que o presidente utilizou linguagem que aqui não pode reproduzir-se. De repente, uma série de países africanos e apropria União Africana tiveram de se queixar não apenas dos palavrões – bom, não eram muito inaudíveis, também não vamos exagerar – mas também do facto histórico.

Ora bem, o facto histórico é que os Estados Unidos enriqueceram à custa do trabalho escravo. Ponto. Se não fosse o trabalho escravo, os Estados Unidos nunca poderiam ter liderado a segunda revolução industrial, nem nunca teriam deitado mão ao comércio internacional, nem nunca teriam acalentado sonhos expansionistas pela América do Sul adiante. É certo que aquilo acabou – felizmente que a Primeira Grande Guerra estava mesmo à porta e a coisa lá se foi compondo, mais ou menos como aconteceria com a II Guerra, que serviu para acabar de vez com os estrondos da Grande Depressão – mas que aconteceu, aconteceu.

A deriva de Donald Trump pelo mundo que fica logo ali à saída das Trump Towers, quer à direita quer à esquerda, está a tornar-se um caso sério de estorvo. Desde logo em casa: a acreditar no livro “Fogo e Fúria” – e, convenhamos, por mera lógica, não há como não acreditar – quando se candidatou à presidência do país, Trump só queria perder. Se isto não é chamar estúpido a todo o povo norte-americano de uma só vez… Mas ganhou.

Na frente externa, é o que se tem visto. Trump parece estar convencido que, antes dele, o mundo não existia. Existia, há sobejas provas disso, mas Trump não sabe nada, absolutamente nada do que se passou até ter tomado consciência dele próprio – a acreditar que tem uma, o que carece de prova. Age, por isso, como se não houvesse mundo, numa tentativa espúria de fazer crer que compreende tudo. Não é ele, afinal, um génio, segundo disse ele próprio de si?

Os analistas mais esclarecidos sobre este assunto pouco claro dos Estados Unidos, vêm afirmando há já quase um ano que há uma tríade de conselheiros, esses sim esclarecidos – a saber: James Mattis, secretário de Estado da Defesa; K. T. MacMaster, conselheiro de segurança nacional; e o General John Kelly – que não deixa Donald Trump tomar decisões demasiado estúpidas em termos diplomáticos e de política externa.

Está a ver-se: só a questão de Jerusalém já era suficiente para que o resto do mundo encontrasse uma ilha de Santa Helena qualquer para onde o mandassem, sem direito a regressar.

Desta vez, pelos vistos, são os africanos que vão andar umas semanas em bolandas. Pena é que não haja por lá uma potência nuclear qualquer – ao contrário do que se passa no Irão e na Coreia do Norte – para Trump agir da forma que aparentemente mais o excita: à bruta. Com ameaças, linguarejar macarrónico e a melena a esvoaçar como se fosse uma bandeira.

E a gente lá vai aguentando. Como dizia há uns dias o antigo embaixador Francisco Seixas da Costa, “se não morrermos todos, esta presidência ficará para a história”.