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Recuperação da economia portuguesa “continuará sólida” na segunda metade do ano apesar da Delta, prevê Oxford Economics

Economista da Oxford Economics assinala que “a procura interna será o motor da recuperação em 2021 e 2022”, mas assinala que apesar do turismo português ter recuperado durante a primavera, o aumento do número de casos de Covid e as medidas de restrições impostas por mercados importantes a voos provenientes de Portugal “foram bastante negativos e mostram que a recuperação nesta área será apenas gradual”.
  • Fotografia cedida
7 Julho 2021, 08h05

Ricardo Amaro, economista sénior da consultora de projeções económicas e análise quantitativa Oxford Economics, estima que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 4,3% este ano e 5,4% no próximo ano. Ao Jornal Económico, em antecipação ao webinar “Portugal: o virar de página ou o horizonte continua nublado”, que ocorre esta quinta-feira de manhã, explica que a variante Delta “trouxe novos desafios para Portugal”, mas continua a assumir que a economia portuguesa irá regressar ao nível pré-crise no segundo trimestre do próximo ano.

Quais são as projeções da Oxford Economics para o crescimento da economia portuguesa este ano e para o próximo ano?

Esperamos que o PIB cresça 4,3% em 2021 e 5,4% em 2022. O agravamento da pandemia e consequente queda severa do PIB no primeiro trimestre de 2021 irá pesar na taxa de crescimento anual em 2021. Mas os dados disponíveis para o segundo trimestre são de forma geral bastante encorajadores. Os indicadores de confiança, do Instituto Nacional de Estatística (INE) e principalmente os da Comissão Europeia, apresentaram um aumento generalizado em abril e maio, e os dados de comércio a retalho apontam para uma forte recuperação do consumo privado nesse trimestre, talvez na ordem dos 7/8% em cadeia. Claro que a variante Delta trouxe novos desafios para Portugal, mas subjacente o controlo da pandemia, a nossa projeção assume que a recuperação continuará sólida na segunda metade de 2021 e em 2022, com o nível pré-crise alcançado no segundo trimestre de 2022.

Quais os fatores que sustentam esta recuperação?

A procura interna será o motor da recuperação em 2021 e 2022. Os dados avançados para o segundo trimestre, assim como a experiência do terceiro trimestre do ano passado, são bastante encorajadores relativamente à capacidade de recuperação do consumo privado assim que as medidas de contenção começam a ser levantadas. E assumindo que não há um retrocesso mais geral das restrições de saúde pública, o consumo continuará a ser impulsionado pela poupança acumulada pelas famílias durante a pandemia. Estimamos que entre o ano passado e o inicio de 2021, houve um excesso de poupança da ordem dos 10 mil milhões de euros – equivalente a quase 5% do produto anual português-, que será em parte usada à medida que as barreiras ao consumo  diminuírem. O investimento tem-se mostrado resiliente durante esta crise, e este componente continuará a beneficiar de um contributo positivo da construção e no próximo ano receberá também um contributo importante por via do Plano de Recuperação e Resiliência. Em termos de comércio externo, tanto as importações e exportações irão recuperar de uma forma bastante expressiva, mas esperamos um efeito líquido no PIB modesto, dado que a taxa de crescimento das exportações será pouco diferente do das importações.

Qual é a taxa de desemprego estimada para este ano e para 2022?

A reação do emprego e da taxa de desemprego foi na crise atual atenuada pelas medidas de apoio, nomeadamente o layoff parcial, bem como pela existência de alguns problemas técnicos relacionados com a forma como alguns respondentes foram classificados como inactivos em vez de desempregados. Dessa forma, a medida que melhor retrata o impacto da pandemia no mercado de trabalho é o número de horas trabalhadas que caiu cerca de 9% em 2020. Isto compara com uma subida relativamente modesta na taxa de desemprego de 6,7% em 2019 para 7,1% em 2020. Portanto de certa forma, há neste momento uma desconexão entre a taxa de desemprego e medidas que mais diretamente retratam o impacto da pandemia na atividade económica. Isso explica em parte porque esperamos que a taxa de desemprego suba novamente em 2021 e 2022, ainda que modestamente, numa altura em que uma recuperação sólida é projetada para outras áreas da economia.

A nova vaga de casos que está a surgir em Portugal e que está a levar a novas medidas de restrição poderá pôr em causa o crescimento projetado para este ano?

A evolução no número de casos é preocupante e uma nova imposição generalizada de medidas de contenção seria um desenvolvimento bastante negativo. A queda severa do PIB do primeiro trimestre que deixou Portugal novamente na cauda da Europa, mostra que a economia portuguesa é especialmente vulnerável a confinamentos. E nesta altura do ano acrescentaria-se o problema que medidas de essa ordem iriam agravar ainda mais a situação no sector de turismo e hospitalidade, que são dos sectores mais importantes da economia portuguesa e que foram dos mais afectados pela crise. Muitas empresas necessitam de um verão forte para melhorar a sua realidade financeira, tornando a situação ainda mais delicada. Há claramente uma responsabilidade geral de garantir que a pandemia é controlada novamente antes que sejam necessárias medidas mais gravosas. A boa notícia é que até certo ponto, isso depende essencialmente de nós, e se conseguirmos assegurar isso, julgo que o balanço de riscos no curto-prazo até estará enviesado pela positiva, no sentido em que a recuperação poderá novamente mostrar-se mais robusta do que esperado.

A aceleração do processo de vacinação levou a um maior otimismo que o pior da crise estivesse a ficar para trás, mas continuam a existir riscos para a recuperação. Quais?

Apesar dos atrasos iniciais, tanto a nível europeu como em Portugal, a vacinação está a surpreender pela positiva, o que certamente contribuiu para uma melhoria das perspetivas de curto e médio-prazo. Mas como refere, continuam a existir riscos para a recuperação. No curto-prazo julgo que os riscos descendentes continuam maioritariamente associados com a evolução da pandemia e impacto que isso possa vir a ter na atividade económica e liquidez de muitas empresas. Uma onda de insolvências seria bastante prejudicial para a economia por força dos impactos diretos no mercado de trabalho, e também pelos efeitos indiretos ao nível do crédito malparado. A experiência recente mostra que esse cenário traria também riscos para as finanças públicas, que se encontram numa posição vulnerável fruto do elevado nível de endividamento e possível necessidade de novas intervenções tanto na TAP como noutras entidades do sector público e financeiro.

Na anterior crise, as exportações tiveram um papel importante na recuperação, nomeadamente com o boom do turismo. O caminho para a recuperação de Portugal desta crise será diferente?

As exportações de serviços, e turismo em particular, colapsaram no ano passado, o que resultou numa queda das exportações totais sem precedentes no nosso passado recente. A nossa análise na área do turismo mostra que Portugal foi dos países onde o turismo mais recuperou durante a primavera. Mas os desenvolvimentos mais recentes, tanto a nível de saúde pública em Portugal, como a nível de restrições impostas por mercados importantes a voos provenientes de Portugal, foram bastante negativos e mostram que a recuperação nesta área será apenas gradual. As nossas projeções assumem que o turismo apenas regressa no fim de 2023 aos níveis de 2019, o que limita a capacidade do comércio internacional para impulsionar a economia portuguesa nos próximos anos. A boa noticia é que a procura interna encontra-se numa posição mais sólida que no último episódio de recuperação, fruto dos apoios dados durante a crise, da menor duração desta crise e também de desenvolvimentos mais saudáveis tanto a nível de endividamento público como privado no período que antecedeu a crise.

Qual vai ser o impacto do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a economia portuguesa?

O impacto será muito importante, estamos a falar de mais de 16 mil milhões de euros – equivalente a cerca de 7,5% do PIB anual de 2019- para serem usados em pouco mais de cinco anos. O plano português, embora talvez não tão ambicioso como outros no Sul da Europa, como por exemplo o italiano ou grego, engloba um conjunto de medidas e investimentos em áreas importantes para o futuro do país, como tecnologia e educação, modernização da administração pública e transição energética. Porém, é muito importante realçar que o PRR representa apenas um quarto do bolo total de fundos europeus que Portugal terá ao seu dispor nos próximos anos – mais de 10 mil milhões do Quadro Plurianual de 2014-20, mais de 33 mil milhões do novo Quadro Plurianual de 2021-27 e também um montante mais modesto do React EU. Era importante criar uma visãoe estratégia global, que não fosse apenas centrada no PRR, de forma a garantir que Portugal consegue de facto absorver todos esses fundos e que os recursos são usados eficientemente de forma a melhorar as perspetivas de crescimento de longo-prazo, que se mantêm bastante modestas por força das pressões demográficas que iremos enfrentar e do recorrente baixo nível de investimento.

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