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Assunção Cristas: “Há um PS que se acomoda porque tem como única preocupação a manutenção do poder”

A presidente do CDS-PP diz, em entrevista ao Jornal Económico, que António Costa sacrificou “quatro anos relevantes, com a melhor conjuntura externa de sempre”, e que entre os socialistas têm cada vez mais peso aqueles que defendem as mesmas ideias que o Bloco de Esquerda. Um partido que, para Assunção Cristas, “vive alimentando a luta de classes e achando que quem cria empresas de maior dimensão e tem muitos funcionários está necessariamente a explorá-los”.
  • Cristina Bernardo
16 Setembro 2019, 07h49

Entre os partidos da presente maioria não falta quem defenda que a saúde e a educação devem ser tendencialmente públicas e gratuitas, à custa dos impostos, e há quem defenda a retoma do peso do setor empresarial do Estado mediante nacionalizações. Existe uma ideologia contrária à iniciativa privada a tomar conta de Portugal?
Penso que existe. Olhamos para as prioridades do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda – falo deles em conjunto porque hoje distinguem-se, mas amanhã estarão todos juntos, ou parcialmente juntos, se for necessário – e não vemos, ainda que com matizes diferentes qualquer benefício para Portugal. Aquilo que vemos é mais do mesmo: investimento público e medidas para o setor público, para a Administração Pública, com aumentos na função pública. É um caminho que não creio ser produtivo. Acredito que nós, portugueses, temos uma grande força. Vemo-la naqueles que vão para fora, trabalham bem e são elogiados. Porque é que nós aqui dentro não conseguimos fazer mais e melhor? Porque temos um Estado que nos asfixia, que nos cria obstáculos, que nos impõe regulações, que não nos liberta, que não desregula, que não nos deixa sonhar, voar, criar, ir mais longe. Esta força criadora e criativa das pessoas e das empresas tem de ser libertada. Não vejo os outros partidos a falarem disso. O CDS fala apaixonadamente.

Diria que neste Executivo convive um PS que defende estas políticas por estratégia de manutenção de poder e um PS que as defende por ser essa a ideologia que quer implantar?
Precisamente. Num partido como o PS há sensibilidades diferentes e há quem convictamente defenda as mesmas ideias que o Bloco de Esquerda. Têm peso no PS e até se adivinha que possam vir a ter mais, pois são pessoas mais jovens. E há outro PS que se acomoda porque tem como única preocupação a manutenção do poder. Penso que António Costa sacrificou quatro anos relevantes, com a melhor conjuntura externa de sempre para fazer transformações necessárias, sacrificou tudo isso à possibilidade de exercer o poder.

Há poucas semanas, após a morte de Alexandre Soares dos Santos, o Esquerda.net, site oficial do Bloco de Esquerda, republicou um texto acerca do antigo presidente da Jerónimo Martins em que este era descrito como alguém que prosperara à conta de salários baixos e fuga aos impostos. A seu ver, isto é uma crítica com mau timing ou já se trata de discurso de ódio?
É o Bloco de Esquerda naquilo que é o Bloco de Esquerda. Contra as empresas de grande dimensão, contra os empresários que as criam empresas e, portanto, explicando que para o Bloco de Esquerda só é possível ser empresário sendo pequenino. O Bloco de Esquerda vive alimentando a luta de classes e achando que quem cria empresas de maior dimensão e tem muitos funcionários está necessariamente a explorá-los. Acho que o país precisa de empresas de todas as dimensões e de empresas que cumpram todas as regras. Estou muito à vontade para falar porque estive no Governo numa altura em que foi preciso aprovar legislação para obrigar a grande distribuição a cumprir regras elementares de concorrência e limitação de práticas abusivas que esmagavam a pequena produção nacional. Se ao mesmo tempo lhes reconhecia um papel relevante na organização e sofisticação da produção agrícola e agroalimentar, também reconheço que muitas vezes tinham práticas abusivas. E foi aprovada legislação contra as chamadas PIRC (práticas individuais restritivas do comércio), que acabou, por exemplo, com os descontos retroativos nas promoções, e foi possível criar uma plataforma de entendimento em que juntámos, desde a produção até à transformação e à distribuição, todos os atores da cadeia agroalimentar, que conseguiram aprovar um código de boas práticas e estão a dar os primeiros passos na auto-regulação. Penso que é preciso dar condições para que as empresas cresçam, que todos cumpram a lei, é preciso regular e garantir que a legislação é cumprida por todas as empresas, da mais pequena à maior. O que o país precisa é de condições para que todas as empresas possam progredir e fazer o seu caminho.

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