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Atento ao euro forte, Draghi quer calibrar o plano para 2018

A apreciação da moeda e a lentidão da inflação deverão levar o BCE a esboçar um plano suave e gradual para o fim dos estímulos à economia.
13 Setembro 2017, 07h25

Finalmente há uma data. Mario Draghi marcou o dia 26 de outubro no calendário da política monetária da zona euro. Depois da reunião do Conselho de Governadores, esta quinta-feira, o presidente do Banco Central Europeu (BCE) anunciou que as alterações aos atuais instrumentos de política monetária vão ser conhecidos no próximo mês.

“Este outono, vamos decidir a calibração dos instrumentos além do final deste ano, tendo em consideração o caminho esperado da inflação e as condições financeiras necessárias para um retorno sustentado das taxas de inflação para valores abaixo, mas próximos de 2%”, disse Draghi.

O BCE tem ainda trabalho a fazer antes qualquer anúncio, segundo o presidente da instituição. No entanto, deixou claro quais os parâmetros para que estará a olhar.
“A expansão económica, que acelerou mais que o esperado na primeira metade de 2017, continua sólida e abrangente aos vários países e setores. Ao mesmo tempo, a recente volatilidade nas taxas de câmbio representam uma fonte de incerteza, que requer monitorização devido às possíveis implicações no outlook para a estabilidade dos preços a médio prazo”, explicou Draghi.

O euro, que tem sido uma preocupação devido à valorização de 14% face ao dólar desde janeiro, disparou mais de 1,2% depois das declarações de Draghi e voltou a ultrapassar a ‘barreira psicológica’ dos 1,20 dólares. A apreciação da moeda única foi um tema central na reunião do BCE até pela pressão que coloca na inflação. A subida dos preços continua a falhar a meta do BCE, tendo ficado em agosto em 1,5%, e os governadores esperam agora que a taxa fique em 1,5% este ano, 1,2% no próximo e 1,5% em 2019.

Escassez ou não?
Ficaram em aberto os pormenores sobre como vão evoluir os instrumentos de política monetária do BCE no próximo ano. Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, não tem, no entanto, dúvidas que as medidas não convencionais se vão manter. A um ritmo atual de 60 mil milhões de euros por mês, o programa de compra de ativos está, neste momento, planeado até ao final de 2017.

Sobre a possibilidade de uma extensão além desse prazo, Garcia diz que “não há dúvidas que vai haver compra de obrigações em 2018”, acrescentando sobre o discurso desta quinta-feira que “a principal mensagem da reunião foi que não é agora, é em outubro”. No entanto, o programa vai ter, mais cedo ou mais tarde, de acabar, até mesmo por razões técnicas, explica.
“O BCE já tem neste momento dificuldades de implementação desse programa, ou seja, há dificuldade em encontrar obrigações que seriam necessárias para cumprir todas as regras do programa, nomeadamente a proporcionalidade das compras em relação ao que é a composição do capital do BCE”.

As regras do Quantitative Easing definidas no início do programa determinam que o montante de obrigações que pode adquirir tem de ser proporcional à percentagem de capital que cada banco central nacional tem no BCE. Essa proporcionalidade, conhecida por chave de capital, é uma medida que pretende prevenir o risco de “subsidiarização” ou de “privilégio a um país em detrimento de outro”, salienta Garcia.

“Para impedir que se misture política monetária e política orçamental, há um rácio de compra de obrigações de cada país que podem ser feitas”. Há ainda uma regra que limita o peso que o BCE pode ter em cada linha de emissão de dívida, de 33%. São estas regras que explicam a atividade do BCE.

Desde o início do programa, em março de 2015, o BCE adquiriu 29.076 milhões de euros de dívida de Portugal, país com uma chave de capital que obriga a que as compras não ultrapassem os 1,75% do total dos países. No caso de Espanha, a que correspondem 8,84%, ou da Alemanha, que ultrapassa os 18%, o total de dívida adquirida é bastante diferente: 206.189 milhões e 413.868 milhões de euros, respetivamente.

Questionado esta quinta-feira sobre as limitações que o BCE enfrenta, Draghi respondeu que “não há uma escassez de obrigações” e que o banco central tem conseguido lidar “de forma bastante apropriada” com as regras do programa, que já foram adaptadas desde o início.

Riscos incorporados
Apesar de reconhecer que “o fim do programa de estímulos está muito longe” e lembrar que o que está a ser discutido é a diminuição do valor mensal de aquisição a partir de janeiro, o economista sublinha que “a redução dos montantes também tem materialidade, não é indiferente e é evidente que tem impacto no preço das obrigações, mas não haverá uma interrupção abrupta desta atitude de compra do BCE”.

A instituição liderada por Draghi vai querer evitar um choque os mercados e deverá, por isso, adotar um plano de saída suave. No entanto, existem riscos, sendo o principal o agravamento dos custos de financiamento dos vários países da zona euro, com Portugal e Itália na linha da frente.

Garcia desdramatiza o cenário, dizendo que o impacto não será imediato. “O mercado antecipa estas coisas e se estivesse muito preocupado com isso já estaria a fazer subir os juros dessas economias e não o está a fazer”, refere. O caso dos juros da dívida portuguesa benchmark dá razão ao economista já que a tendência de diminuição mensal de aquisição de obrigações não tem sido acompanhada por um aumento das yields, até pelo contrário.

“A conclusão é óbvia é que se um dos principais compradores vai reduzir a sua compra, vai ter impacto no preço. É provável. Mas as obrigações a 10 anos de Portugal por alguma razão são a 10 anos. Quem as compra tem alguma noção que vai acontecer essa redução BCE e isso já está de alguma forma incorporado no preço”.

O caso poderá mudar de figura “se houver uma crise ou um momento de maior aversão ao risco”, diz o economista. “Não estando lá um interveniente grande como o BCE, pode trazer maior volatilidade aos títulos, mas neste momento, não me parece que esteja a ser uma grande preocupação”.

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão.

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