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Banco de Portugal deixa cair regra que lhe dava poder para determinar venda de uma participação qualificada na banca

O novo código vem, em alternativa, estender os instrumentos de inibição que hoje se aplicam a órgãos sociais, a detentores de participações sociais, ou seja, a acionistas.
  • Cristina Bernardo
16 Abril 2021, 13h51

O Banco de Portugal (BdP) propôs, no anteprojeto de CAB, a criação de um regime que possibilitasse ao supervisor determinar a venda de uma participação qualificada.

Mas na consulta pública, “em face do volume e pertinência dos comentários recebidos”  e “ponderando a eficácia da medida tal como apresentada, o Banco de Portugal promoveu a reavaliação dos argumentos expendidos a este respeito, propondo que o anteprojeto de CAB deixe de prever a proposta de um regime de determinação de venda de participação qualificada”.

Em vez disso, consagra-se que a verificação de que a influência de um participante qualificado possa prejudicar a gestão sã e prudente tenha como efeito não só a inibição do exercício dos direitos de voto (tal como está previsto no RGICSF), mas também a suspensão do exercício de todos os demais direitos sociais (e que se explicitarão em maior pormenor).

Na sequência da reponderação efetuada em resultado dos contributos recebidos durante a consulta pública, o Banco de Portugal propõe um conjunto de alterações ao regime de inibição de direitos de voto (existente no RGICSF) e de inibição provisória de direitos de voto (previsto no CAB).

Assim, o Banco de Portugal propõe substituir a referência a “inibição” por uma referência a “suspensão”, de forma a alinhar com a CRD IV e com outros regimes similares previstos no anteprojeto de CAB, explica o relatório publicado no site do regulador bancário.

É ainda proposta alargar a capacidade de intervenção do Banco de Portugal a todos os direitos sociais (o direito a receber dividendos, o direito a participar em aumentos de capital ou o direito à informação), e não apenas aos direitos de voto, existindo discricionariedade sobre quais os direitos sociais, em concreto, a suspender, dependendo da situação concreta.

O BdP propõe estabelecer que o regime de suspensão provisória de direitos sociais assente numa presunção de urgência, em moldes similares a outras presunções de urgência já previstas, sendo também aperfeiçoados os seus pressupostos.

O Banco de Portugal considera que, não se consagrando o regime de determinação de venda de uma participação qualificada  “importa reforçar a capacidade de intervenção do supervisor junto do participante qualificado cuja influência possa prejudicar a gestão sã e prudente, de modo a limitar de forma ainda mais relevante a sua potencial influência”.

Por outro lado, tendo em conta o potencial impacto muito negativo deste participante na confiança de terceiros e no regular funcionamento da instituição, visa-se, com a revisão deste regime, impedir o participante de beneficiar da manutenção da sua posição enquanto acionista.

A instituição liderada por Mário Centeno defende que um participante qualificado cuja influência possa prejudicar a gestão sã e prudente representa, necessariamente, um risco para a respetiva instituição de crédito. Por esse motivo, o supervisor “deve dispor de instrumentos jurídicos que permitam contribuir para a prevenção ou, se necessário, mitigação substancial desses riscos, potencialmente atentatórios da confiança na instituição e do seu regular funcionamento”.

Na versão inicial, que agora foi alterada, houve quem interpretasse como uma forma de forçar a Associação Mutualista Montepio Geral a vender o Banco Montepio, ou quem encontrasse neste dispositivo legal uma forma de forçar a acionista Isabel dos Santos a vender a participação no EuroBic.

No relatório da consulta pública o Banco de Portugal vem agora referir que “o regime relativo à inibição provisória do exercício de direitos de voto, agora alterado para regime de suspensão provisória do exercício dos direitos sociais, suscitou um conjunto variado de questões que importa esclarecer”.

“Atente-se, desde logo, que o Banco de Portugal já pode, ao abrigo do artigo 89.º do CPA, adotar medidas cautelares no contexto de um procedimento de inibição do exercício de direitos de voto. O regime proposto serve para consagrar uma norma especial, especificamente vocacionada para a suspensão do exercício dos direitos sociais”, frisa o supervisor.

O Banco de Portugal incluiu agora uma norma “aplicando uma presunção de urgência para os procedimentos de suspensão provisória dos direitos sociais. Ainda que o Banco de Portugal possa ouvir os interessados – na medida em que considere que não existe, em concreto, risco de comprometer a urgência da medida – trata-se assim de um regime mais favorável do que o regime geral previsto no CPA”, reconhece.

Na prática o novo código pretende estender os instrumentos de inibição que hoje se aplicam a órgãos sociais, a detentores de participações sociais, ou seja, a acionistas.

“Existe já no RGICSF [Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras], há vários anos, um regime de suspensão provisória de funções para os membros dos órgãos de administração e fiscalização. Esse regime serviu de inspiração ao regime de suspensão provisória do exercício dos direitos sociais proposto, o qual tem uma vocação similar, dado o risco de participantes qualificados nessas circunstâncias prejudicarem a gestão sã e prudente das entidades reguladas”, explica o BdP.

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