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Bancos portugueses em contra-relógio para cumprir DMIF II

Bancos de investimento em Portugal estão a adaptar-se, mas começaram tarde e as regras apertadas poderão criar dificuldades ao setor.
7 Fevereiro 2018, 06h45

As normas mais apertadas da nova regulamentação europeia dos mercados financeiros, que entrou em vigor no início do ano, está a levar os bancos de investimento que operam em Portugal a trabalhar de forma acelerada para estarem prontos quando a transposição para o país for terminada.

Com o objetivo de aumentar a transparência no setor, a revisão da Diretiva dos Mercados Financeiros (DMIF II) está a obrigar os bancos a reconfigurarem operações. O foco está nas equipas de research, área que será mais afetada.

“Havendo objetivos nobres na enunciação dos princípios gerais da transparência e conhecimento aprofundado dos mercados, há que ter em atenção alguns fatores concretos que podem ser contraproducentes”, explicou Manuel Puerta da Costa, economista, analista financeiro e presidente Associação Portuguesa de Analistas Financeiros (APAF). “No domínio do research, vão-se a criar dificuldades para os países com mercados mais pequenos, elevando os custos de acesso ao mercado de capitais por parte de algumas empresas”.

Com a entrada em vigor da regulamentação, todo o research passa a ser remunerado separadamente por gestores de ativos, deixando o acesso de poder ser gratuito ou incluído num pacote de serviços, como até ao ano passado. “Na prática, irá limitar a quantidade de research disponível (para todos e não só para alguns), na medida em que os custos/benefícios associados à sua produção podem não ser suficientes para a continuidade no caso de empresas com nivéis de liquidez e de capitalização bolsista mais baixa, como é o caso de muitas empresas portuguesas”, afirmou Puerta da Costa.

Nuno Carvalho, responsável pelo departamento de compliance do Haitong, aponta para o research como o maior desafio para o banco de investimento, que implementou mais de 150 atividades para se adaptar ao regulamento europeu. “Transition reporting foi o setor que implicou maior consumo de recursos”, disse, lembrando que o Haitong distribui research para milhões de destinatórios em Portugal, Espanha e Polónia. “Tivemos de fazer uma seleção e passar a enviar apenas para clientes que assinaram um contrato”, afirmou Nuno Carvalho.

O Haitong começou a adaptação em junho, “o que é tarde em comparação com bancos estrangeiros, que começaram há dois anos”. O responsável pelo compliance acrescentou que todo o setor está “ainda num período transitório, que só vai acabar quando a legislação for totalmente transposta” e que ainda é cedo para avaliar o impacto financeiro das mudanças. No entanto, “para o modelo de negócio, a distribuição foi o campo em que houve maior diferenças”, disse. “Vamos ver se o modelo é sustentável, mas a expetativa é que o número de clientes se mantenha”.

A preocupação em antecipar a transposição da diretiva para a lei nacional é generalizada, com os bancos de investimento a ganharem obrigações, a começar por todos os colaboradores terem de ter, até final de 2019, qualificações específicas. Cada interveniente passa a ter um novo código alfanumérico (código LEI) que lhes dá uma única entidade para realizarem qualquer transação financeira. Há também mudanças nas terminologias, para clarificar processos e passa a ser obrigatório avaliar a adequação de produtos financeiros complexos ao investidor, através de uma avaliação mais rigorosa.

No BiG – Banco de Investimento Global, “existe um conjunto de requisitos que já entraram em vigor, nomeadamente os decorrentes dos regulamentos de aplicação direta, e outros que ainda carecem de esclarecimento ou clarificação por parte dos reguladores”, segundo fonte oficial do banco.

Explica que todos os serviços de investimento e serviços auxiliares tiveram de adequar-se ao novo enquadramento, com “destaque para as alterações em matéria de product governance, transversais a todos os produtos e serviços, mas também para os requisitos de formação introduzidas para a prestação de determinados serviços”.

Quanto ao impacto das mudanças, preferem focar-se na parte positiva e apontam para uma expetativa de “maior transparência, uniformização de práticas e requisitos e existência de um level playing field ao nível europeu”.

Da mesma forma, o BPI não espera “impactos significativos” para o negócio, frisando como maior diferença a “formalização e clareza das regras de relacionamento com os clientes”, bem como a generalização em condições idênticas a todo o setor, não apenas em Portugal, mas na Europa.

“O Banco BPI já se adaptou às novas regras, nomeadamente no que respeita à formação dos seus colaboradores e ao cumprimento das principais obrigações impostas pela regulamentação que está em vigor”, referiu. O Caixa Banco de Investimento (BI) está também a apostar na formação, tendo já formado 4.807 colaboradores, que estão certificados, sendo que 50% tiveram a nota máxima.

Já o Bankinter Portugal acredita que as mudanças vão ter “um impacto positivo na qualidade do serviço prestado aos clientes e na clareza da informação de suporte às decisões de investimento, em todo o mercado”. O banco de origem espanhola, que apostou recentemente na banca de investimento em Portugal, refere que já observava “uma parte muito significativa” do novo quadro, mas aproveitou para “introduzir algumas alterações no modelo de prestação de serviços de investimento, convergindo com a prática do Bankinter em Espanha”. O alinhamento permitiu “alcançar um grau acrescido de proteção ao investidor, tornando os processos-chave ainda mais simples e robustos”, segundo fonte oficial do banco espanhol.

Se, por um lado, os bancos de investimento portugueses estão a acelerar para se adaptarem às novas regras e terão de adaptar os modelos de negócios aos novos desafios, por outro, poderão beneficiar de regras harmonizadas entre concorrentes europeus.

“A DMIF II tem como objetivo principal contribuir para um melhor e mais transparente funcionamento dos mercados financeiros num contexto europeu, em que investidores, gestores e distribuidores tenham claras responsabilidades e necessidades de prestação de informação para uma mais correta e mais informada tomada de decisão por parte de quem investe e de quem vende produtos financeiros”, lembrou Puerta da Costa, da APAF. “É essencial que todas as informações que sejam prestadas sejam calculadas e verificadas sob formatos semelhantes de país para país de maneira a criar um saudável aumento da concorrência Europeia”.

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão

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