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Be Water quer 200 milhões por resgate de concessão em Paredes

Câmara de Paredes decidiu resgatar a concessão de água argumentando com falta de investimento. A Be Water admite avançar para tribunal. Autarquia diz que paga 22,5 milhões de euros.
27 Outubro 2020, 13h00

A Be Water diz que ficou surpreendida com a decisão da Câmara de Paredes, no distrito do Porto, avançar para o resgate da concessão de água. A empresa avança que pode vir a pedir uma indemnização de 200 milhões de euros, admitindo avançar para tribunal. A autarquia argumenta que quis evitar aumentos de preços e a falta de investimentos na rede e prevê pagar 22,5 milhões de euros.

“Fomos apanhados de surpresa. Estávamos em negociações com a câmara há três anos. Estava-se a trabalhar para assinar um aditamento. Houve a decisão unilateral de avançar para o resgate. Só que os contratos existem: podem ter direito ao resgate, mas tem de se cumprir determinados pressupostos”, afirma ao Jornal Económico (JE) Alberto Carvalho Neto, administrador da empresa detida pelos chineses da Beijing Entreprises Water Group (BEWG).

“O município já tinha uma dívida grande connosco. Desde 2015 até agora, [as tarifas] nunca foram ajustadas à inflação e subiram os preços da energia e do custo de água em alta comprada às Águas de Portugal. O presidente da câmara, para poder diluir isso, pediu-nos um plano de redução de investimentos no sul do concelho, para poder haver uma acentuação menor em termos de aumento de preços. Mas isso foi pedido por ele, não fomos nós”, destaca o gestor.

“O presidente da câmara fala em 22,5 milhões, mas se assinámos contrato em 2001 e se ele nunca cumpriu o aditamento [datado de 2008], por que razão é que nos vamos focar no aditamento? Porque é que não nos focamos no contrato inicial? Se nos focarmos no contrato inicial, o valor da indemnização total ronda os 200 milhões de euros”, segundo o administrador.

Este aditamento previa que vários subsistemas de água do concelho – geridos por cooperativas e juntas de freguesia – passassem a ser geridas pela Be Water, mas a transferência nunca aconteceu, com o gestor a considerar que existiu “falta de vontade política” da autarquia porque se trata do “ganha-pão” de várias freguesias.

A Be Water diz que continua a “fazer cálculos” e que o valor da indemnização “vai ser tratado a nível judicial. Teremos de discutir em tribunal esses montantes”. “Os nossos cálculos estão a ser feitos com aquilo que achamos que é justo e equilibrado. Estamos a falar em lucros cessantes, temos os danos emergentes”. Alberto Carvalho Neto acusa a autarquia de “fazer um jogo político”. E defende: “É preciso deixar de pensar na água em função dos ciclos eleitorais”.

O gestor defende a importância de “boa gestão, quer dos recursos, quer da eficiência” no setor das águas em Portugal e denuncia que “está a haver um ataque ao tecido empresarial do setor”.

“Se olharmos com verdade para o setor, existe descontentamento também a nível de gestão municipal e intermunicipal. Ou seja, locais operados por redes municipais onde os munícipes e as respetivas oposições se queixam do preço da água, e intermunicipais acabadas de criar e já com dificuldade de sobreviver se não atualizarem tarifas”, disse Alberto Neto.

“Portanto, o erro está no ideal enraizado na população e do tabu do sector da água. Devemos sim foca-nos na eficiência do setor e redução de perdas. Coisas concretas e funcionais em vez de andarmos a deriva em atos eleitorais e apenas sensacionalistas”, afirma o administrador da Be Water.

Esta é a segunda vez que a Be Water está envolvida num resgate de concessão. Em 2019, o município de Mafra decidiu resgatar a concessão depois de ter recusado o pedido da Be Water para ser compensada entre 12 a 19 milhões de euros devido a consumos inferiores ao contratualizado, ou aumentos de 30% em média nas tarifas, segundo avançou a agência Lusa.

Inicialmente, a câmara propôs pagar uma indemnização de 3,7 milhões de euros à Be Water, ou então que a empresa pagasse dois milhões de euros para sair da concessão, explica Alberto Neto. Mas a concessionária rejeitou esse valor e o processo seguiu para tribunal.

Com o arrastar judicial do processo, a câmara acabou por subir os valores da indemnização para um número entre os 16 e os 22 milhões de euros, mas a Be Water defendeu o pagamento de 54 milhões de euros. Por fim, em tribunal arbitral foi fixado um valor global de indemnização a rondar os 25 milhões de euro pela autarquia de Mafra à Be Water.

Por sua vez, a autarquia de Paredes (PS) diz que a Be Water não fez os investimentos que tinham sido acordados. “Em 2008 foi feito o aditamento ao contrato que estabelecia uma série de aumentos de 70% da água e saneamento para reequilibrar o sistema; foram feitos aumentos de 45%. Houve o compromisso da Be Water de fazer 35 milhões de euros de investimento para se estender a cobertura do saneamento a 100% do concelho, mas só fizeram 3,7 milhões”, disse Alexandre Almeida ao JE.

O autarca diz que quando o seu executivo assumiu funções em 2017, foi “confrontando com a Be Water para fazer novo aditamento”, o que passava por ficar somente com as freguesias do norte do concelho. “Não chegámos a acordo porque a Be Water queria mais aumentos, se não houvesse só faziam 5,2 milhões de euros de investimentos nos próximos 15 anos, o que era praticamente manter a rede, sem mais investimentos. Não houve forma de chegar a acordo”.

“Estudámos o modelo económico da concessão, e os valores da compensação a pagar pelo resgate, e chegámos à conclusão de que estavam reunidas as conclusões para o resgate”, afirma Alexandre Almeida, acrescentando que “o que está em causa é o interesse publico, existe uma cobertura deficitária” do concelho.

O autarca diz que está agora à espera do parecer da Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Saneamento (ERSAR), que emitiu um parecer positivo ao resgate da concessão de Mafra, e que depois a decisão vai ser avaliada em assembleia municipal, o que deverá acontecer até ao final do ano. A autarquia prevê ter em operação uma empresa municipal no espaço de um ano para gerir a água e o saneamento.

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