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Bernardo Trindade: “Alojamento Local veio enriquecer e qualificar todo o destino Madeira”

Em entrevista ao Económico Madeira, o ex-secretário de Estado do Turismo, Bernardo Trindade, fala sobre a realidade do alojamento local e como o setor tem contribuído para a economia madeirense.
11 Fevereiro 2018, 14h30

Na hotelaria, houve um aumento da oferta. Pelo que tem visto na sua análise, há espaço para mais investimento no setor, para novos hotéis, vontade do tecido empresarial hoteleiro a nível nacional de apostar ainda mais na Madeira, apesar dos problemas relacionados à formação no setor e na aviação?

Eu acho que a Madeira tem em função daquilo que está definido no plano de ordenamento turístico um número de camas definido que sustenta esta oferta. Há ainda espaço para crescer. Há hoje uma realidade hoteleira que é absolutamente incontornável, ela não é hoteleira do ponto de vista de ser considerado um empreendimento turístico, mas é uma importante oferta de alojamento, nomeadamente nos concelhos rurais, refiro-me ao alojamento local, que representa hoje já cerca de 9 mil camas e que em termos globais, de dormidas, cerca de 600 mil dormidas, é uma realidade com que se tem de contar.

Esse aspeto naturalmente veio de alguma forma enriquecer e qualificar todo o destino Madeira. Este investimento para além de, em alguns casos, reabilitar edifícios antigos e degradados, veio sobretudo trazer oferta em determinados sítios, em determinadas freguesias da Madeira, onde não havia pura e simplesmente nenhum tipo de oferta, portanto enriqueceu-a, para além do aspeto social, que é sempre relevante, que é de alguma forma permitir, não só a criação de emprego, como inclusivamente o aumento de rendimento de algumas famílias.

Estas realidades hoje são muitíssimo dinâmicas, não só as que se relacionam diretamente com o turismo e os empreendimentos turísticos, mas também o alojamento local, significando por isso que este ecossistema turismo, que representa hoje mais de 30% da riqueza gerada na Madeira, são mais de 400 milhões de euros de proveitos hoteleiros que a Madeira tem por ano. Significa por isso que todo o conjunto de atividades que estão dentro deste ecossistema devem ser obviamente acarinhadas, serem qualificadas, e sobretudo terem capacidade de resposta e serem sustentáveis. Como é evidente tudo isso se faz num equilíbrio harmonioso entre oferta e procura.

O alojamento local é um tema inevitável em todo o território nacional. Por um lado é positivo em termos da criação de riqueza, emprego, oferta, reabilitação, mas por outro também, há algumas consequências nomeadamente dentro do sector há pessoas que dizem que leva a uma desprofissionalização no setor porque não há formação de pessoas que entram nesse mercado. Há o problema do aumento dos preços dos arredondamentos nos residentes. Vê-se isso em Lisboa e no Funchal. E ainda há a questão da regulação. Qual é sua posição sobre estes assuntos?

Há aqui um aspeto quase de bom senso. Com estes crescimentos todos imagine se não houvesse alojamento local. Como é que eu hospedaria as pessoas? Não teria capacidade para fazê-lo. Concordo consigo relativamente à questão da regulação. E desse ponto de vista deixe-me fazer um testemunho público positivo, em relação à ação do Governo, e da atual secretária de estado do Turismo. Porque em duas matérias fundamentais quer seja por via tributária, em que se aproximou regimes. O regime de tributação do alojamento local é ainda hoje vantajoso relativamente aos restantes empreendimentos turísticos mas é menos vantajoso do que era anteriormente onde a diferença era brutal. E, por outro lado, outra questão que foi muito importante e que de alguma forma também nivelou por cima esta preocupação com a qualidade que foi a circunstância de ter falado com as plataformas tecnológicas, sejam elas a Airbnb, o Homeaway, o Booking, ou o Expedia, e no fundo convoca-las ao seguinte. Só podem ser vendidas, só podem ser feitas ofertas de alojamentos, desde que devidamente registadas.

Obviamente que esta relação com a economia formal leva a que os próprios promotores tenham que, por essa via, qualificar os próprios investimentos. Hoje não é tão indiferente, não é tão pouco habitual, o facto de encontrar neste segmento do alojamento local ofertas de alojamento de grande qualidade, e que qualificam os destinos. Qualificam Lisboa, qualificam o Funchal. E não é por acaso que nesta áreas do alojamento local, e dos Hostels, nomeadamente, que Portugal tem à escala global dos melhores empreendimentos. Significa que há também aqui uma preocupação. Eu diria o seguinte. Por um lado o alojamento local surgiu na altura para trazer para o circuito formal todo um conjunto vasto de alojamento que estava disperso, e não tributado, mas por outro lado exigindo uma adequada regulação. E desse ponto de vista quer ao nível da tributação, quer ao nível dos próprios registos, veio de alguma forma aproximar regimes, e isso do meu ponto de vista é positivo.

E continua a haver alguma indefinição mesmo no seu próprio partido, há uma posição do partido, aparentemente uma posição diferente do Governo, em relação às associações de condóminos, e o poder de autorização. Qual é a sua posição sobre isto?

Isso de alguma forma reflete o espírito plural do PS. Dois deputados propuseram uma iniciativa que era mais restritiva. Era absolutamente limitativa do alojamento local nomeadamente uma autorização unânime do condomínio relativamente à existência de alojamento local. E por outro lado o Governo legislou, aproximou regimes, no sentido de que com mais regulação podermos ter uma atividade de alojamento local mais consentânea um pouco com as expetativas de qualidade que o país tem. Eu vou muito mais por essa via. Sei que há um trabalho hoje que espero profícuo e esclarecedor da Assembleia da República. Um grupo de trabalho com diversas propostas de diversos partidos. E certamente que o Governo a seu tempo também se pronunciar-se-á sobre esta matéria. A minha perspetiva é, sob esse ponto de vista, otimista.

Voltando à Madeira. O turismo representa cerca 30% do PIB, 15% ou mais do total do emprego. Interessa-me um bocadinho a estratégia macro económica da Madeira. Naturalmente associamos a Madeira ao turismo por diversas razões. Qual é a receita ideal que pode ser seguida. É o aumento do peso do turismo, ou a aposta em outros setores?

A economia da Madeira é relativamente simples de explicar. Ela tem um grande peso do turismo. E quando falamos em turismo, é preciso pensar no ecossistema. A lavandaria que lava os lençóis dos hotéis pertence ao ecossistema turismo. Um eletricista que vem fazer uma reparação dentro do hotel faz parte do ecossistema do turismo. Uma empresa de construção que faz uma intervenção de reabilitação no quadro da atividade turística faz parte do ecossistema turismo. Esta minha apreciação é uma apreciação que faço para a Madeira como faço para o país. E a mim choca-me muito, em pleno séc. 21, que ainda estejamos a fazer um bocadinho apreciações em termos das atividades ditas tradicionais da nossa economia.

No caso da Madeira, é uma região que tem uma agricultura que é de subsistência, tem uma indústria relativamente escassa, e tem um peso que eu diria de algum significado, são cerca de 200 milhões de euros de contributo do Centro Internacional de Negócios da Madeira para a riqueza, nas suas diversas dimensões, seja a componente industrial, importante porque geradora de emprego, porque geradora de prestações sociais, porque geradora de impostos e depois tem a parte dos serviços financeiros, o Registo Internacional de Navios, tem essas nuances.

Acho que o tempo tratará de integrar no ecossistema turismo um conjunto ainda mais vasto de atividades. Acho A Madeira é a região turística mais antiga do país. Tem gerações e gerações de pessoas que singraram, e exerceram profissão neste setor, e espero sinceramente que do ponto de vista formativo tenhamos a capacidade para poder ter essas respostas e nessa medida, com esse equilíbrio, acho que a região poderá continuar a ser do ponto de vista económico uma referência.

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