Durante este ano, o valor total de financiamento concretizado, suportado em blockchain e blockchain-adjacentes, através das Venture Capital nos Estados Unidos (de onde consegui informação), já superou os valores de todo o ano de 2017.

Mas, apesar de mais de 900 milhões de dólares de operações com fundos de capital de risco registados em 2017, e mais de 375 milhões conhecidos, levantados nos primeiros dois meses de 2018 nos EUA, as tradicionais rondas de capital de risco – notas conversíveis, angels, série A, série B, etc. – parecem ter um volume discreto em comparação com as ICO (Ofertas Iniciais de Moeda – Initial Coin Offering) em termos de volume.

O objetivo original da bitcoin e da maioria de seus muitos descendentes era acabar com um sistema monetário dependente de bancos centrais e entidades terceiras confiáveis. Não é de admirar que os entusiastas da criptografia tenham inventado uma maneira de contornar o antigo processo de levantar capital para financiar novos projetos, que tradicionalmente estão profundamente enraizados na cultura e na confiança dos bancos tradicionais. Temos, assim, iniciativas que pretendem prestar serviços aos seus clientes com suporte em moedas alternativas, que se financiam, também, em criptomoedas.

A rapidez com que as ICO estão a dominar o financiamento de startups nestas indústrias em alguns países, dá-nos uma ideia do potencial e escala que esse novo instrumento pode ter no financiamento global de uma economia.

ICOs: menor número de operações, mas negócios maiores que VC

Durante todo o ano de 2017 e nos dois primeiros meses de 2018, segundo a base de dados de suporte à Fortune 1000, foram realizadas 527 rondas de capital de risco e ICO levantadas nas categorias de bitcoin, ethereum, blockchain, cryptocurrency e moeda virtual. Do número total de negócios de financiamento inicial (early stage), 32% foram ICO.

De acordo com as estatísticas, o número de ICO levantadas é quase metade do das rondas de capital de risco anunciadas por empresas relacionadas com blockchain. Mas apesar do menor número de operações ICO, esses eventos de captação – em média – atraem muito mais capital do que o ticket médio de financiamento de capital de risco. Desta forma, as ICO representaram 78% do volume de operações, contra o restante feito pelas VCs (venture capital).

As blockchain e startups relacionadas levantaram, em 14 meses, quase 1,3 mil milhões de dólares em rondas tradicionais de capital de risco em todo o mundo. Mas as ICO, captadas pelas estatísticas, representaram quase 4,5 mil milhões de dólares no mesmo período.

As ICO parecem-se mais com financiamentos em estágio avançado e consolidação do que early stage

Com frequência, as startups de blockchain fazem as suas primeiras rodadas externas de financiamento como ICO, mas em termos de tamanho, esses eventos de financiamento parecem-se menos com financiamento de capital de risco e mais como super rondas de crescimento de tecnologia em estágio final. As cinco maiores operações deste tipo em mercado aberto e regulado, realizadas em 2017, variaram entre 105 e 257 milhões de dólares.

E, em 2018, sem dúvida que haverá ICO ainda maiores. Em maio, a Telegram (plataforma de blockchain, com 200 milhões de utilizadores, que quer alargar a sua app de messaging para serviços de pagamentos, armazenamento de dados, navegação sem censura e sistemas descentralizados para apps) cancelou a sua ICO, depois de ter conseguido financiar-se com 1,7 mil milhões de dólares junto de investidores privados. Conseguiu assim evitar o peso da regulação e o risco de ser incluída na investigação que a SEC está a realizar a diversas ICO. De realçar que a empresa conseguiu este financiamento com apenas 81 entidades financiadoras, invocando a necessidade de financiamento para desenvolver a plataforma. Para uma startup não está nada mal, pois supera os financiamentos no mesmo estágio de desenvolvimento obtidos por qualquer uma das (hoje) gigantes tecnológicas.

Falta de credibilidade, fanatismo e ilusão?

Embora o preço de mercado da bitcoin (BTC) e de outras criptomoedas tenha caído significativamente em relação a 2017, o mercado das ICO continua a explodir e a aumentar as expectativas enquanto financiamento alternativo.

Mas há alguns factos incómodos que o mercado tem de enfrentar. Foi publicada uma pesquisa que descobriu que, das 902 empresas que levantaram dinheiro em ICO, 142 falharam antes de fechar o financiamento e 276 falharam após a captação de recursos. Também revela que 113 projetos adicionais foram classificados como “semi-falhas”, depois das equipas de empreendedores deixarem de comunicar com o mercado e/ou porque, numa oportunidade onde o volume é essencial, a comunidade de utilizadores da criptomoeda é tão pequena que os projetos não têm possibilidade de vingar. A conclusão final é gritante: 59% dos crowdsales do ano passado ou são falhas confirmadas ou fracassos.

Embora seja provável que, daqui por algum tempo, haja empreendimentos sustentáveis ​​e bem-sucedidos financiados por essa nova forma de levantar dinheiro, empreendedores e investidores devem ter cuidado com a falta de transparência e de informação credível, com o fanatismo e a ilusão.