[weglot_switcher]

‘Book in Loop’: projeto português de reutilização de manuais escolares arrancou para Espanha

“O primeiro passo foi perceber como se organiza o mercado espanhol em termos de adoção dos manuais escolares e que projetos existiam nesse âmbito”, afirma Ricardo Morgado, um dos fundadores do projeto, em entrevista ao Jornal Económico.
  • Ricardo Morgado, The Loop Co.
22 Julho 2020, 18h25

A empresa The Loop Co. decidiu apostar no mercado espanhol da reutilização de manuais escolares, permitindo uma maior poupança às famílias espanholas, como tem feito com as portuguesas, através da Book in Loop, cujo projeto arrancou em 2016 no território nacional.

Em entrevista ao Jornal Económico, Ricardo Morgado, cofundador da The Loop Co., explicou o porquê de arriscar uma internacionalização para o ‘país-vizinho’, a poupança que oferecem às famílias e os potenciais parceiros, sendo um deles a Correos, que irá funcionar como centro de distribuição.

Ricardo Morgado falou ainda sobre o balanço do negócio em Portugal, e como já geraram uma poupança de 2,5 milhões de euros às famílias portuguesas, bem como o interesse em criar o primeiro centro de logística inversa e economia circular no distrito da Guarda.

Como aconteceu a migração do serviço de reutilização de manuais escolares para Espanha?

A internacionalização foi um passo que sempre quisemos dar. Na verdade, desde que desenvolvemos e estabilizámos o processo de reutilização dos manuais escolares que percebemos que o modelo era escalável, quer em termos de setores – e a prova é a plataforma BabyLoop que lançámos no início de 2019 – quer em termos de mercados.

Espanha beneficia pela questão de proximidade geográfica e porque cedo percebemos que a problemática dos manuais escolares era idêntica nos dois países: os manuais escolares são caros, são trocados com alguma frequência e as opções de reutilização são limitadas localmente, ou seja, não existia uma plataforma com a abrangência de todo o território, como a Book in Lopp.

Foi fácil entrar no mercado? 

Pelas semelhanças entre os dois mercados, não foi difícil. Talvez o mais difícil tenha sido preparar uma operação noutro país sem estar lá. Devido à pandemia, tudo foi preparado e está a ser executado a partir de Portugal. A capacidade de adaptação da equipa foi fantástica e a verdade é que já estamos online.

O primeiro passo foi perceber como se organiza o mercado espanhol em termos de adoção dos manuais escolares e que projetos existiam nesse âmbito. Contamos desde o início com a ajuda precisa da AICEP, que nos abriu portas e nos auxiliou em todos os processos. Por outro lado, sabíamos que a operação precisaria sempre de parceiros – em Portugal, por exemplo, o Continente tem sido nosso parceiro desde 2016 – e, por isso, o passo seguinte foi perceber que empresa poderia apoiar a nossa chegada a Espanha. Estamos muito contentes por estarmos a trabalhar com a Correos neste mercado.

Os espanhóis são mais predispostos à reutilização de manuais do que os portugueses?

Não diria que são mais dispostos a reutilizar, talvez tenhamos uma noção mais clara no final da operação. A verdade é que em Portugal os manuais são agora oferecido pelo Estado e, naturalmente, a proposta de valor da reutilização perde atratividade. Para quê poupar em comprar usado, se tenho novo de forma gratuita? Ainda assim, no ano passado, apesar da gratuitidade dos manuais escolares para todos os alunos do ensino público, houve cinco mil famílias a optar pela reutilização, através da Book in Loop.

Quanto às famílias espanholas, estamos muito confiantes. Na primeira semana no mercado, tivemos mais de 17 mil visitas, mais de 850 vendas e 700 reservas criadas. Ainda é cedo, mas são números fantásticos que parecem mostrar, para já, que os consumidores em Espanha entendem e gostam da nossa proposta de valor.

De facto, os últimos dados divulgados pela Comissão Europeia mostram uma preocupação crescente, em Espanha, com temas como o aquecimento global: 86% dos inquiridos classificam as alterações climáticas como um problema “muito grave”. Este tipo de sinais são a prova de que existe uma consciência comum de que é preciso encontrar soluções para um consumo mais consciente e responsável.

Claro que ainda há um caminho a percorrer, mas a sociedade está cada vez mais alerta para a necessidade de reutilizar e de promover um consumo consciente. Acredito também que esta crise venha acelerar este processo, dado que, mesmo depois da pandemia, e tendo em conta os seus efeitos económicos, os consumidores pensarão duas vezes antes de fazer um investimento, pelo que a economia circular pode ganhar um novo fôlego com projetos a surgirem em diversas áreas.

Quantas famílias poderá abranger o projeto no território espanhol?

A plataforma está disponível em todo o país e contamos com os Correos como parceiro com mais de duas mil lojas onde é possível entregar os livros para serem reutilizados. O primeiro ano é sempre incerto para qualquer marca, ainda para mais com todas as dúvidas levantadas pela situação de crise global, mas gostávamos de atingir a meta dos 50 mil livros trocados, que se traduzirá numa poupança de cerca de 600 a 750 mil euros para as famílias.

Como funciona a Book in Loop?

A Book in Loop é uma plataforma de reutilização de manuais escolares, onde as famílias podem comprar ou vender livros em segunda-mão. No final do processo, e caso optem pelas duas abordagens. podem poupar até 75% do valor que gastariam.

Qualquer pessoa pode inscrever-se na nossa plataforma para vender ou comprar manuais. Para vender, basta registar o livro com o ISBN (Internacional Standard Book Number) e depois entregá-lo num dos pontos de recolha – em Espanha, os postos da Correos. Podem também requisitar uma recolha ao domicílio. Todos os manuais passam por um processo de controlo de qualidade, certificado pela Universidade de Aveiro, que atesta as suas condições para ser utilizado por outro aluno. Uma vez findo este processo, o manual aparece disponível na aplicação para que outro utilizador possa adquiri-li. Para quem compra, o processo é idêntico: as pessoas inscrevem-se na plataforma. escolhem os manuais de que precisam e, assim que estejam disponíveis, são entregues ao domicílio ou num ponto de entrega. Todo o processo de pagamento, faturação e resgate de saldo é também feito através da aplicação.

Este é o primeiro passo para a internacionalização. Quais são os planos de internacionalização para o futuro?

A próxima prioridade é alargar o espectro da oferta da The Loop Co. em Espanha e levar a BabyLoop também para esse mercado. Este produto de economia circular dedicado a produtos de puericulturas tem tido uma enorme recetividade em Portugal, e gostávamos de o lançar em Espanha antes do Natal deste ano.

Apostaram sozinhos em Espanha ou existe alguma parceria?

A chegada da The Loop Co., através do projeto Book in Loop, a Espanha é totalmente independente. No entanto, contamos com a rede Correos como parceiro logístico que nos apoia na operacionalização das recolhas e entregas dos manuais. Contamos agora criar novas parcerias, sobretudo com marcas que vejam na economia circular uma oportunidade para crescerem e para fidelizarem os seus clientes.

Qual o balanço da operação, ao fim de quatro anos, em Portugal?

É um balanço muito positivo. Nos últimos quatro anos, a Book in Loop deu uma nova vida a mais de 300 mil manuais escolares, em Portugal. Feitas as contas, este número simboliza uma poupança de mais de 2,5 milhões de euros para as famílias.

O que estimam para Espanha? Quanto é que as famílias poderão poupar?

Em Espanha, as famílias gastam em média 250 euros em manuais escolares por aluno. A nossa proposta de valor permite recuperar até 25% do preço de venda ao público numa venda, e comprar manuais reutilizados com 50% de desconto. Ou seja, se uma família fizer os dois processos pode poupar até 75%, o que num caso médio pode representar uma poupança de cerca de 180 euros.

Quais os planos para o futuro próximo para Portugal?

No início do ano, definimos duas grandes prioridades para 2020: em primeiro lugar concluir com sucesso a nossa primeira internacionalização de produtos próprio – que já alcançámos – e, em segundo lugar, continuar a atrair e reter talento, que nos permita continuar a inovar a este ritmo, tanto nos nossos produtos como nos projetos para os nossos parceiros.

O que significa a criação de um centro de logística inversa e economia circular?

O conceito de logística inversa refere-se à gestão dos processos necessários para movimentar produtos desde o consumidor até a um entreposto, com o objetivo de recuperar o seu valor, seja através da revenda, reparação, reaproveitamento ou reciclagem. A criação deste centro de logística inversa e economia circular é um passo estratégico neste processo de internacionalização que estamos a estudar, através do qual conseguiremos servir as necessidades de recuperação de produto e a sua revenda nos canais de comércio eletrónico, não só do território nacional, mas de todo o espaço ibérico.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.