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Bruxelas defende que o aumento do malparado compromete o crescimento do PIB

A Comissão Europeia publicou um estudo onde refere que a acumulação de elevados rácios de NPL reduz o crescimento do PIB em 1,5 pontos percentuais por ano, pelo menos nos próximos seis anos.
  • Alessandro Bianchi/Reuters
28 Maio 2020, 08h19

A Comissão Europeia, num artigo escrito por Anil Ari (Economista, Fundo Monetário Internacional, Departamento Europeu), Sophia Chen (Economista, Fundo Monetário Internacional, Departamento de Pesquisa) e Lev Ratnovski (Economista Líder, Banco Central Europeu, Direção Geral de Pesquisa, Divisão de Pesquisa Financeira), analisa o impacto da crise no aumento do crédito malparado.

Os autores usam uma base de dados que cobre os crédito malparado (NPLs) em 88 crises bancárias desde 1990 para extrapolar o que pode acontecer com a crise do Covid-19.

Os dados mostram que lidar com os rácios de NPLs é fundamental para a recuperação económica, dizem os economistas citados por Bruxelas.

Em comparação com a crise de 2008, alguns fatores são favoráveis a resolver o problemas dos NPL nesta crise: os bancos têm rácios de capital mais robustos, as normas contabilísticas de IFRS 9 podem ajudar ao reconhecimento atempado de NPL, e a crise do Covid-19 não foi precedida de um boom de crédito. No entanto, outros fatores podem tornar o problema do aumento do crédito malparado ainda mais desafiador: a dívida do Governo é substancialmente mais alta, os bancos são menos rentáveis e os balanços das empresas no geral são fracos, dizem os economistas.

Como resultado da pandemia do coronavírus (ovid-19), a economia parou repentinamente. É provável que isso traga elevados níveis de créditos em incumprimento (NPLs) ¬ – ou seja, os créditos que são incobráveis ou perto de o serem . Elevados níveis de malparado são problemáticos porque prejudicam os balanços dos bancos, diminuem o crescimento do crédito e atrasam a recuperação económica.

Há que o dizer, a persistência de elevados rácios de crédito malparado no balanço dos bancos, foram uma preocupação em muitos dos países europeus depois da crise 2008-2012, e a crise da pandemia Covid-19 pode provocar o renascimento de um problema de malparado na banca.

Os economistas citados pela Comissão dizem que a maioria das crises bancárias leva a elevados níveis de malparado.  Durante as crises, os NPLs (non-performing loans) geralmente seguem um padrão em forma de U. Começam em níveis modestos, aumentam rapidamente no início da crise e atingem o pico alguns anos depois, antes de estabilizarem e decaírem. “Observando todas as crises, vemos que os níveis de incumprimento atingem em média cerca de 20% do total dos créditos, mas a variação é grande: em países em desenvolvimento o malparado pode exceder os 50% do total de empréstimos. Apenas menos de um quinto das crises bancárias evitam elevados níveis de NPL – que definimos como excedendo 7% do total de empréstimos”, refere a Comissão Europeia.

Antecipar futuros rácios de NPLs é essencial para a formulação de estratégias de resolução do malparado. “É tentador usar os rácios de NPL pré-crise para ancorar essas previsões. No entanto, os rácios de NPL pré-crise não são um bom indicador dos problemas de incumprimento de crédito pós-crise. Após uma crise, os incumprimentos aumentam para três vezes os seus valores pré-crise em média, e mais de dez vezes em casos extremos”, diz Bruxelas.

A Comissão Europeia refere ainda que “os países podem facilitar a resolução de elevados rácios de NPLs usando uma combinação de medidas políticas, tais como: avaliações à qualidade dos ativos, para identificar empréstimos que não são produtivos e que precisam de reestruturação; uma separação de ativos bons e de ativos maus no balanço dos bancos. Isso torna os balanços dos “bons bancos” mais transparentes, estabiliza o acesso ao mercado e permite que se concentrem na concessão de novos créditos à economia.

“No nosso trabalho, usamos o método das “projeções locais” para avaliar a relação entre a resolução dos NPL e a dinâmica da saída pós-crise, ao mesmo tempo que controlamos a sua co-dependência”, lê-se no comunicado da Comissão. Os resultados mostram que solucionar o problema dos NPL é crítico para a recuperação económica.

Elevados rácios de NPLs altos estão associados a recessões mais profundas e a recuperações mais lentas.

Seis anos após o início de uma crise bancária, o crescimento do PIB nos países com elevados rácios de crédito malparado  é 6,5 pontos percentuais é inferior. Nos países que possuem elevados níveis de malparado, a produção é mais de 10 pontos percentuais inferior aos que têm rácios de malparado menores. Isso significa que a acumulação de de elevados rácios de NPL (malparado) reduz o crescimento do PIB em 1,5 pontos percentuais por ano, pelo menos nos próximos seis anos.

“Usámos uma abordagem de seleção de modelo para avaliar quais os indicadores pré-crise servem para prever a dinâmica dos NPLs nas crises bancárias. Concluímos que os picos de malparado são maiores nos países com menor PIB per capita, após um boom de crédito, num contexto de taxas de câmbio fixas, em bancos menos rentáveis ​​e com balanços mais frágeis. A resolução do problema dos NPL é mais prolongada em circunstâncias semelhantes e em países com elevada dívida pública e com um sistema bancário mais sofisticado”, diz a análise.

Esses resultados lançam uma luz sobre os fatores que estão por detrás dos elevados e persistentes elevados rácios de incumprimentos de crédito em alguns países europeus após a crise de 2008-2012. “No nosso ‘paper’, comparámos a dinâmica real dos NPL em sete países europeus (Grécia, Irlanda, Itália, Portugal, Espanha, Hungria e Eslovénia) com o que poderia ter sido antecipado com base em padrões históricos. Acontece que os elevados rácios de malparado Europa na década de 2010 eram difíceis de prever: a crise foi extraordinariamente severa para as economias avançadas. Por outro lado, a demorada resolução dos elevados rácios de NPL está alinhada com os padrões históricos: são comuns as crises após um boom de crédito. De fato, os impactos de longo prazo dos booms de crédito estão relacionados com as dificuldades em resolver a dívida de empresas não viáveis e de famílias sem rendimentos suficientes ​para cumprir os seus créditos hipotecários, concluem os economistas.

Os autores da análise publicada pela Comissão, referem que apesar do artigo estudar os NPLs no contexto das crises bancárias e, como tal, não possa ser perfeitamente adaptado aos eventos do Covid-19, fornece informações valiosas sobre os desafios iminentes ao nível do crescimento dos NPL no balanço dos bancos.

“Algumas forças são propícias à resolução da NPL. Por exemplo, a pandemia do COVID-19 não é uma crise induzida pelo boom de crédito. Se a crise económica se revelar temporária, muitos dos créditos em incumprimento podem, após a crise da Covid-19, estarem relacionados com empresas ilíquidas viáveis, em vez de empresas ‘zombies’ inviáveis”, dizem os autores.

Os bancos europeus entraram na pandemia do Covid-19 com rácios médios de capital mais altos em comparação com a crise de 2008. As recém introduzidas novas regras contabilísticas IFRS 9 podem induzir um reconhecimento mais rápido dos NPL e, consequentemente da sua resolução, graças à sua natureza prospectiva (embora o reconhecimento do risco de incumprimento seja muito rápido, também pode restringir os empréstimos bancários durante as crises).

Outras forças apontam para desafios na solução do problema do aumentos dos NPL. Em comparação com 2008, a maioria dos países europeus possui dívida pública substancialmente mais alta, bancos menos rentáveis ​​e, em muitos casos, condições mais fracas do setor empresarial – fatores que, historicamente, complicam a redução do crédito malparado. Além disso, se a recuperação económica da pandemia for lenta e prolongada, as perdas de crédito causadas por problemas nas empresas aumentarão e poderão sobrecarregar os bancos, complicando ainda mais a resolução do problema dos NPL.

Dada a importância da redução do peso do malparado na recuperação económica e as dificuldades históricas de muitos países em implementar medidas efetivas relacionadas com a redução do rácio de NPL, projetar políticas efetivas de redução do rácio de NPL no mundo pós-Covid-19 é uma questão chave da política financeira da Europa hoje.

 

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