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Conselho das Finanças Públicas estima redução da carga fiscal para 34,2% em 2020

Presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP) revela estimativa de uma redução da carga fiscal, em 2020, em cerca de cinco décimas face a 2019, de 34,7% para 34,2% do PIB. Diminuição deve-se se a medidas fiscais para compensar efeitos da crise Covid-19 como a suspensão dos pagamentos por conta no IRC e ao facto de a própria receita fiscal poder estar já a “sobre-reagir” ao novo momento do ciclo económico.
  • Presidente do Conselho de Finanças Públicas, Nazaré Costa Cabral
7 Outubro 2020, 08h10

O Conselho das Finanças Públicas (CFP) estima, neste uma redução da carga fiscal, em 2020, em cerca de cinco décimas face a 2019, de 34,7% para 34,2% do PIB. A presidente do CFP diz que a diminuição deve-se a medidas de política fiscal adotadas para compensar efeitos da crise Covid-19 como por exemplo a decisão, já no segundo semestre do ano, de suspensão dos pagamentos por conta no IRC.

Só aqui, a perda de receita prevista é na ordem dos 1.150 milhões de euros, num total de quebra prevista na receita fiscal de 5.600 milhões de euros, menos 10,7% face a 2019. E também ao facto de a própria receita fiscal poder estar já a “sobre-reagir ao novo momento do ciclo económico”.

“O CFP estima, neste seu exercício, uma redução da carga fiscal, em 2020, em cerca de cinco décimas face a 2019, para se fixar em 34,2% do PIB”, revelou Nazaré da Costa Cabral nesta terça-feira, 6 de outubro, na abertura da apresentação do “Estudo sobre a carga Fiscal em Portugal”, realizado pela EY Portugal e pela Sérvulo & Associados para a CIP – Confederação Empresarial de Portugal que concluiu que são cobradas em Portugal mais de 4.300 taxas, das quais 2900 destinam-se a empresas públicas.

Para a presidente do CFP, a razão pela qual esta carga fiscal não diminui de forma ainda mais significativa está justamente na forte queda do PIB nominal, a qual, diz, “por si só explica e acompanha a queda da receita”.

“Ainda assim, essa redução da carga fiscal é de facto esperada, a qual pode ficar a dever-se não apenas às tais medidas de política fiscal adotadas, mas também ao facto de a própria receita fiscal poder estar já a sobre-reagir ao novo momento do ciclo económico”, realça Nazaré Cabral.

Por outro lado, para esta responsável é ainda pouco claro – tudo dependendo de fatores incertos como por exemplo o número de falências, evolução da taxa de desemprego, etc. – se, no próximo ano, “a cobrança de receita fiscal acompanhará pari passu a evolução económica – que já será de crescimento”. Ou se, pelo contrário, haverá aqui um “efeito retardador” de manutenção de quebra de receita, ou de menor crescimento desta,” aquém portanto daquilo que a nova dinâmica económica, esperada para 2021, pressupostamente ditará”.

Nazaré Cabral recorda que o CFP atualizou recentemente os seus cenários macroeconómico e orçamental, projetando para 2020 uma taxa de recessão da economia portuguesa, em termos reais, de 9,5%; uma variação negativa do PIB nominal de 7,6%; e um défice orçamental, de 7,2% do PIB.

“Este agravamento da situação orçamental fica a dever-se ao aumento significativo da despesa pública, especialmente da despesa primária (com um aumento estimado face a 2019, de 9,8%), mas fica também a dever-se a uma forte diminuição da receita pública e, em especial, da receita fiscal”, explica.

Em 2020, a quebra prevista na receita fiscal é de cerca de 5.600 milhões de euros, ou seja, uma redução na ordem dos 10,7% em relação a 2019. Se olharmos para os diferentes impostos, a quebra será particularmente significativa no caso do IVA, cuja receita diminuirá quase 10,7% e, sobretudo no caso do IRC, onde se estima uma redução na ordem dos 36%. “Concorre para a diminuição da receita cobrada, neste último imposto, não apenas o impacto da recessão económica no rendimento das empresas, mas também o efeito do conjunto de medidas discricionárias de política fiscal, como por exemplo a decisão, já no segundo semestre do ano, de suspensão dos pagamentos por conta no IRC. Só aqui, a perda de receita prevista é na ordem dos 1.150 milhões”, concluiu.

A crise está a revelar duas realidades “perturbadoras”

Na sua intervenção, a presidente do CFP defendeu ainda que a crise está a revelar duas realidades, em Portugal como de resto em diversos países do mundo, realidades que sendo à partida justificadas, diz “não deixam de ser perturbadoras”.

“Em primeiro lugar, estamos a assistir a uma forte pressão sobre o Estado, quer pelo lado da receita, quer pelo lado da despesa. Na verdade, grande parte dos apoios às empresas e famílias têm passado, desde que a epidemia se iniciou, pelo envolvimento do Estado. Portugal não é exceção neste panorama global”, acrescenta.

Segundo os cálculos mais recentes do CFP, só o valor dos custos mais diretamente relacionados com a pandemia (as medidas discricionárias de apoio), corresponderá em 2020 a cerca de 4.600 milhões de euros, ou seja, o equivalente a 2,2% do PIB português.

Para Nazaré Cabral, a questão” é tanto mais perturbadora quanto não sabemos se haverá condições para reverter todas estas medidas de apoio económico e social, se sim, quando é que tal será possível e se, por conseguinte, não teremos no final da pandemia, a herança de um Estado sobredimensionado, a necessitar de mais e mais recursos, quiçá absorvendo-os de forma exorbitante, muito para lá daquilo que é usual encontrar, mesmo num Estado social presente e robusto”.

A segunda realidade sinalizada pela presidente do CFP que considera “ainda mais perturbadora”, prende-se com a questão de saber como serão financiados os custos da pandemia.

Nazaré Cabral diz que na maior parte dos países, a opção não tem passado pelo aumento dos impostos existentes, nem pela criação de novos. “Empresas e famílias não teriam, neste quadro de quebra económica subida e profunda, condições para suportar qualquer tipo de novo agravamento fiscal”, explica, acrescentando que mesmo soluções de impostos ‘one-shot’, temporários e excecionais, inspirados nos antigos impostos de guerra, não foram sequer, pelo menos até ao momento, politicamente defendidos.

“Compreende-se que assim tenha sido: ainda que tais impostos pudessem ter em seu favor, além da sua natureza temporária, a incidência sobre bases porventura menos atingidas pela crise – por exemplo, certo tipo de ativos -, arriscar-se-iam não só a não produzir coleta suficiente face à magnitude dos custos, mas também a ter um efeito económico contraproducente, perante uma crise que por um lado é transversal, atingindo à generalidade dos sectores e, por outro, é uma crise simultânea, atingindo os dois lados do mercado, uma crise de procura e de oferta”, defende.

No caso particular da União Europeia, a presidente do CFP sinaliza que se encontra, pelo menos em alguns dos países membros, uma dificuldade acrescida (para esta eventual solução fiscal de financiamento dos custos da pandemia), que genericamente pode reconduzir à ideia de falta de espaço orçamental.

“Esta falta de espaço orçamental está aqui relacionada com fenómenos de exaustão fiscal associados nomeadamente àquela ideia, a que antes me referia, a da saturação no uso das bases de incidência tributária. Quando estas bases de incidência se encontram saturadas, já não há muito mais por onde tributar. Ora, estou convencida de que Portugal se encontra justamente neste grupo de países”, explica.

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