No passado fim de semana o primeiro-ministro, António Costa, recebeu em Lisboa os líderes dos restantes seis países do sul da europa comunitária – Espanha, França, Itália, Grécia, Chipre e Malta – naquela que foi a primeira cimeira destes Estados da União que contou com todas estas presenças. A cimeira esteve longe de concitar a atenção dos media que a sua importância requeria. E também por isso se justifica um breve comentário e uma anotação quer à sua realização quer ao seu conteúdo.

Desde logo sobre a sua realização. Numa União Europeia a 28 tenderá a ser normal que alguns dos seus Estados-membros aprofundem os seus laços em função da partilha de determinados aspetos comuns que tornem as suas relações mais próximas e mais estreitas. No início do projeto comunitário, na pequena Europa dos seis Estados fundadores, não seria suposto que tal acontecesse. À medida, porém, que o pelotão dos Estados-membros foi engrossando e aumentando para 9, para 10, para 12, para 15, para 25, para 27 e para 28 Estados, a formação desses pequenos subgrupos tornou-se incontornável e, de certa forma, até desejável.

O exemplo mais conseguido dessa prática é-nos dado pelo chamado “Grupo de Visegrado” (V4) que integra a Polónia, a Hungria, a República Checa e a Eslováquia – criado na cimeira que reuniu Vaclav Havel (Checoslováquia), Lech Walesa (Polónia) e József Antall (Hungria) em 15 de fevereiro de 1991 e que, de certa forma, constitui mais do que uma organização internacional informal mas menos do que uma “pequena organização” dentro da União Europeia, possuindo regras próprias de funcionamento, presidências anuais rotativas, página eletrónica própria, etc.

Ora, quem estiver atento ao que tem sido a evolução comunitária nos últimos anos, facilmente se apercebe da influência, da importância e do peso específico que este pequeno grupo de países tem desempenhado na marcha do projeto europeu, não raro sob a liderança e a agenda de Viktor Órban, o polémico e controverso primeiro-ministro húngaro. Em fases de desnorte do projeto de integração europeia, o V4 tem conseguido protagonizar os seus próprios desígnios e surgir-nos como os que sabem o que querem e para onde querem ir, dentro deste projeto europeu frequentemente erróneo e ziguezagueante.

Parece indiscutível que, mau grado as suas enormes diferenças aos mais variados níveis (dimensão, população, riqueza, situação económico-social, etc.) os sete países do sul da Europa que António Costa convocou para o Centro Cultural de Belém no passado fim de semana com facilidade encontrarão uma agenda comum, aspetos de interesse comum tanto no plano político quanto nos planos económico, financeiro e social, que lhes permitam a busca de soluções comuns a reclamarem das instituições europeias de uma forma concertada, articulada e convergente. Seguramente não será difícil a listagem desses pontos onde a convergência se afigura mais fácil e daqueles que reclamam um debate mais aprofundado em vista de uma concertação mais exigente.

Indo já longe os tempos em que a um único país era conferido o estatuto de locomotiva da União Europeia – e essa “função” era, por regra, atribuída ou à França ou à Alemanha, consoante a situação no momento de cada um destes Estados fundadores – numa União alargada a 28 (ou 27, ou 27 + 1 se se concretizar o pedida adesão da Sérvia) parece mais realista e mais sensato concluir que a locomotiva da União, doravante, acabará por ser constituída não tanto por Estados individualmente considerados mas por subgrupos regionais de Estados, constituídos e articulados no quadro da União em vista de uma mais proveitosa defesa dos seus próprios interesses. Aliás, quanto mais debilitado estiver o poder das instituições europeias, máxime da Comissão Europeia, mais expectável será que os Estados reforcem o seu poder e o seu peso relativo no quadro institucional único e, no âmbito do Conselho, comecem a organizar-se e a articular-se da melhor forma possível para fazerem prevalecer os seus interesses.

Já quanto à matéria discutida na Cimeira, fazendo fé no seu comunicado final, destaca-se naturalmente a reivindicação do acabamento da união económica, nomeadamente o fortalecimento do euro e da zona euro. É a matéria mais sensível que a EU tem pela frente, posto ser a união que mais acabada ficou dos tempos da sua própria constituição. E essa incompletude tem vindo a ser gradualmente superada mas com os preços que se conhecem e os custos económicos, políticos e sociais que também estão aí à vista de todos. Insistir neste aspeto ou dar-lhe prioridade no quadro dos temas tratados, releva do simples bom-senso e é uma decorrência normal da própria situação económico-financeira da generalidade dos países do sul. Recorde-se que destes sete que participaram na cimeira de Lisboa, Grécia, Portugal, Chipre e Espanha acabaram por ser intervencionados e a Itália terá escapado talvez por ser a Itália.

Em suma, o Governo português está de parabéns pela iniciativa; espera-se que a mesma tenha sequência e não engrosse a lista das realizações de sucesso que acabam por não ter sequência nem continuidade. Porque essa lista é longa e o tempo que, desta feita, temos pela frente, cada vez mais escasso.