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Cobertura de necessidades de liquidez urgentes justificaram forte aumento da procura de crédito com garantia pública

A procura de empréstimos com garantia pública registou fortes aumentos no primeiro semestre de 2020, em Portugal e na área do euro, e novamente no segundo semestre de 2020 em Portugal. Pelo contrário, a procura por crédito não garantido reduziu-se em ambos os semestres em Portugal.
  • Cristina Bernardo
19 Janeiro 2021, 14h56

A pandemia levou a uma deterioração da situação de liquidez das empresas. Com vista a apoiar a tesouraria das empresas, foram lançadas linhas de crédito com garantia pública em vários países da área do euro e Portugal não foi exceção.

Em Portugal, estas linhas de crédito estabelecem, entre outras condições, limites máximos aos spreads que podem ser praticados e oferecem prazos mais alargados.

No Inquérito aos Bancos sobre o Mercado de Crédito, relativo a janeiro de 2021, o Banco de Portugal aborda a procura e a oferta de crédito às empresas com e sem garantia pública durante a pandemia Covid-19.

“Com o objetivo de perceber melhor o papel destas garantias no crédito às empresas, o inquérito inclui uma pergunta que desagrega a evolução da oferta e da procura de empréstimos com e sem garantia”, explica o BdP.

Segundo o inquérito levado a cabo, no primeiro semestre de 2020, os bancos em Portugal, assim como na área do euro, aplicaram critérios de concessão de crédito menos restritivos em empréstimos com garantia pública do que em empréstimos sem garantia pública concedidos no segundo semestre de 2019. O que não surpreende tendo em conta que nalgumas linhas a garantia do Estado cobria o risco de crédito a 80%.

Pelo contrário, segundo o inquérito, os critérios de concessão de crédito em empréstimos sem garantia pública tornaram-se mais restritivos.

No segundo semestre de 2020, “voltou a observar-se esta diferenciação na política de concessão de crédito, com os bancos a reduzirem novamente a restritividade dos critérios no crédito garantido e a mantê-los praticamente inalterados nos empréstimos sem garantia do Estado”, refere o BdP.

Segundo as respostas ao inquérito, o comportamento da procura por parte das empresas também foi diferente para empréstimos com e sem garantia estatal. A procura de empréstimos com garantia pública registou fortes aumentos no primeiro semestre de 2020, em Portugal e na área do euro, e novamente no segundo semestre de 2020 em Portugal. Pelo contrário, a procura por empréstimos não garantidos reduziu-se em ambos os semestres em Portugal e, na área do euro, diminuiu ligeiramente no primeiro semestre e permaneceu praticamente inalterada no segundo, detalha o regulador bancário.

A redução da procura por empréstimos não garantidos foi mais acentuada no caso das PME, tanto em Portugal como na área do euro, para o que poderá ter contribuído o maior acesso a linhas de crédito garantidas por parte destas empresas, é outra das conclusões do inquérito.

Tanto em Portugal como na área do euro, a cobertura de necessidades de liquidez urgentes e a constituição de uma reserva de liquidez por precaução foram os principais fatores indicados pelos bancos para o forte aumento da procura de crédito com garantia pública em 2020 por parte das empresas.

“O financiamento do investimento fixo e a substituição de empréstimos existentes deram em geral um contributo muito reduzido e em geral negativo para a procura de empréstimos garantidos”, lê-se n documento.

Nas perguntas principais do inquérito, que se referem à totalidade dos empréstimos (não desagregados em garantidos e não garantidos), os bancos em Portugal e na área do euro reportaram um aumento na restritividade da oferta de crédito nos três últimos trimestres de 2020.

No caso da procura, os bancos reportaram um forte aumento no segundo trimestre, determinado essencialmente pelo financiamento de existências e necessidades de fundo de maneio. Nos dois trimestres seguintes a procura registou reduções ligeiras, devido a menores necessidades de financiamento do investimento e de fusões/aquisições e reestruturação empresarial.

Os dados apresentados “confirmam que o aumento da restritividade da oferta de crédito reportada pelos bancos refletiu os empréstimos não garantidos pelo Estado. Por sua vez, o aumento da procura verificado no segundo trimestre resultou dos empréstimos garantidos e a redução nos trimestres seguintes terá sido determinada pelos empréstimos não garantidos”, explica o BdP.

Sendo que em Portugal, as linhas de crédito com garantia pública associada à Covid-19 são acessíveis apenas por microempresas, PME e Small Mid Caps e Mid Cap

Dados do inquérito às empresas sobre os empréstimos ou linhas de crédito com garantia pública associada à pandemia

No primeiro semestre de 2020, os critérios e os termos e condições foram menos restritivos do que em empréstimos sem qualquer garantia pública no segundo semestre de 2019.

Já no segundo semestre de 2020, quer os critérios, quer os termos e condições foram menos restritivos do que no semestre anterior.

Para os próximos seis meses os bancos esperam critérios ligeiramente menos restritivos na concessão de crédito e termos e condições praticamente inalterados face ao segundo semestre de 2020.

Já do lado da procura de linhas de crédito protocolado, e face aos seis meses anteriores, houve um aumento muito forte no primeiro semestre de 2020 (em comparação com a procura de empréstimos sem qualquer garantia pública); um aumento forte no segundo semestre de 2020 e a banca espera apenas um ligeiro aumento nos próximos seis meses. Tudo porque causa da cobertura de necessidades de liquidez urgentes por parte das empresas que foram afectadas pelo lockdown. Isto deu um contributo para aumentar a procura de forma acentuada no primeiro e segundo semestres de 2020 e, dará, ainda que de forma ligeira, nos próximos seis meses.

Outro factor que justifica a evolução da procura de crédito protocolado com a garantia mútua, é a reserva de liquidez por precaução das empresas e que deu um contributo para aumentar a procura no primeiro e segundo semestres de 2020.

Já a substituição de empréstimos existentes deu um ligeiro contributo para diminuir a procura de empréstimos no segundo semestre de 2020.

Empréstimos ou linhas de crédito sem a garantia pública associada à Covid-19

No primeiro semestre de 2020, em termos de política de concessão de crédito, os critérios e termos e condições foram mais restritivos.

Mas no segundo semestre de 2020 esses critérios e os termos e condições ficaram praticamente sem alterações.

Para os próximos seis meses os bancos esperam aplicar critérios ligeiramente mais restritivos, no crédito a PME.

No que se refere à procura de crédito, o inquérito revela que face aos seis meses anteriores, houve uma redução no primeiro semestre de 2020; uma ligeira redução no segundo semestre de 2020 e não são praticamente esperadas alterações para os próximos seis meses.

A redução da procura no primeiro e segundo semestres de 2020 foi ligeiramente mais acentuada no caso das PME.

O questionário referente ao presente exercício foi enviado aos bancos no dia 3 de dezembro de 2020 e o envio das respostas ocorreu até ao dia 23 de dezembro.

Recorde-se que, de acordo com o último relatório de estabilidade financeira do Banco de Portugal, as linhas de crédito com garantia pública expandiram a oferta de crédito, contribuindo para que, entre março e setembro de 2020, o fluxo bruto de novos empréstimos bancários a empresas aumentasse cerca de 15% em termos homólogos (de 18,7 mil milhões de euros, em 2019, para 21,5 mil milhões de euros em 2020), beneficiando de taxas de juro menores e prazos alongados.

De acordo com informação da Central de Responsabilidades de Crédito (CRC), entre março e setembro de 2020, cerca de 40% do montante de novos empréstimos contratados por sociedades não financeiras (empresas) encontrava-se ao abrigo destas linhas de crédito (nos empréstimos com maturidade original superior a um ano, este peso ascende a cerca de 50%).

O Banco de Portugal revelou ainda no REF que, em termos agregados, 59% do montante de novos empréstimos concedidos aos setores mais afetados pela pandemia teve uma garantia pública associada. O que ficou sobretudo concentrado em empresas dos setores do alojamento e restauração, comércio, transportes e armazenagem, atividades artísticas, de espetáculos e recreativas e, em menor medida, da indústria transformadora.

As linhas de crédito com garantia pública foram desenhadas para suprir as necessidades de liquidez das empresas de menor dimensão que, por norma, estão mais dependentes do crédito bancário. Assim, o recurso a linhas de crédito com garantia pública foi mais significativo nas pequenas e médias empresas (PME), 44% do total dos novos empréstimos, do que nas grandes empresas, apenas 17%.

Os critérios de concessão de crédito com garantia restringiam o acesso apenas a empresas sem incidentes não regularizados junto dos bancos e do Sistema de Garantia Mútua, à data da emissão de contratação. Segundo o REF, parte das empresas em setores mais afetados tinham uma boa qualidade creditícia pré-pandemia. Assim, as empresas que tinham um menor risco de crédito, avaliado com base no Sistema Interno de Avaliação de Crédito do Banco de Portugal (SIAC), recorreram relativamente mais às linhas de crédito com garantia pública (46% dos novos empréstimos) do que as empresas com maior risco (30%).

“As condições das linhas de crédito com garantia pública, mais favoráveis do que as prevalecentes no mercado, contribuíram para o aumento da maturidade média e para a redução do custo de financiamento das empresas, reduzindo assim o seu risco de refinanciamento. A taxa de juro média dos empréstimos com garantia pública concedidos entre março e setembro foi de 1,2%, face a 2,4% nos empréstimos sem garantia”, lê-se no REF divulgado em dezembro.

A maturidade também foi significativamente mais longa, atingindo muito frequentemente seis anos. Alguns dos empréstimos contemplam também períodos de carência, de até 18 meses.

 

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