Esta semana, o primeiro-ministro António Costa nomeou para a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos um camarada de partido, de seu nome Carlos Pereira, episódico líder do PS Madeira.

A reconhecida mesquinhez nacional logo sugeriu que tal se deveria a um prémio merecido pela sagacidade com que o referido deputado, feito relator, em tempos redigira as conclusões da chamada comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos, um trabalho de artífice de joalharia que até o insuspeito João Galamba, naturalmente por um incontrolável arrepio de espinha, ajudou a chumbar faltando à votação geral final. Relembro: entre a união dos da ‘geringonça’ e a oposição ‘dos outros’ a coisa ficou 7-7. Face ao regulamento, arquivou-se.

Para o tal Carlos Pereira imediatamente se gerou currículo mais do que garantido para outras missões. E eu concedo: quem olha para o pior período do banco do regime e não descortina por lá nada de mal feito, mesmo com um buraco que originou a necessidade de uma monumental  recapitalização, devida ao belíssimo trabalho de outros homens de saber, como Armando Vara (que depois transportou toda a sua experiência para o BCP e se revelou como um notável caso de estudo para o Ministério Público), com certeza que será pessoa, e político, de absoluta confiança, tanto dentro como fora do Parlamento. Só pode.

Entretidos e preocupados com a realidade do Brasil, alguns dos nossos mais eloquentes democratas – entre políticos que utilizam antigas tribunas do jornalismo, ex-jornalistas reciclados em operacionais de causas várias e de uma maneira geral muitos invertebrados dedicados à tarefa de simularem viver um dia a dia mais ou menos digno – não descortinaram nada de mal no assunto. Como os compreendo! Se António Costa garante que está “à vontade” com a referida nomeação, quem são eles para questionarem o regime que só encontra “competências” dentro de portas, mesmo para organismos que deveriam ser “independentes”?

A resposta parece-me evidente: não são ninguém. E, portanto, sendo tão dispensáveis por cá, fazem bem em continuarem preocupados com o mundo. Agora com Bolsonaro. Ainda com Trump. Sempre com qualquer político que na Europa, a reboque da insegurança e do desejo dos respetivos povos, resolva colocar-se contra o politicamente correto e na oposição a uma cartilha ideológica que o tempo não atualiza quase desde a revolução industrial.

Haja alguém que vigie os passos do fascismo internacional e não se perca em minudências caseiras, sejam elas as da ética contra a imoralidade, as dos princípios versus os interesses, ou até, no limite, as da apropriação do Estado por um partido.

Olhando para a anestesia geral e para a forma descontraída com que tudo isto se decide e passa a céu aberto, ontem à direita, hoje à esquerda, o caminho parece ser esperar que a paciência dos cidadãos se esgote e um dia, no futuro, cada vez menos longínquo, ‘isto’ desague num Bolsonaro ‘à portuguesa’. Já temos aí figuras a abrir caminho, como a sagaz comentarista da pistola ao pescoço, Manuela Moura Guedes, e o impagável André Ventura. O caminho faz-se andando.