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CPI ao Novo Banco: Centeno deve rever ‘período de nojo’ entre funções no BdP e banca ou auditoras

Versão preliminar do relatório da CPI ao Novo Banco identifica várias situações de alternância entre o exercício de funções no Banco de Portugal, na banca e auditoras, salientando que estas situações suscitam “constrangimentos” e são vistas como “um fator de descredibilização das instituições e dos seus profissionais”. E recomenda ao regulador financeiro, a revisão do denominado ‘período de nojo’ aplicável na transição entre funções de regulador para regulado e auditoras.
20 Julho 2021, 17h55

O Banco de Portugal (BdP) deve rever o denominado ‘período de nojo’ aplicável na transição entre funções de regulador para regulado, auditor ou até mesmo entidades não reguladas. Objetivo: não permitir que a contratação, embora de acordo com a lei, leve a potenciais  conflito de interesses como o caso de ex-responsáveis do BdP que supervisionaram os últimos dias de vida do BES e acabaram por ir trabalhar para auditora e consultora PwC que estava prestar serviços ao supervisor na avaliação do balanço inicial do Novo Banco.

Esta é uma das recomendações do relatório preliminar da Comissão de Inquérito ao Novo Banco, onde o relator socialista Fernando Anastácio conclui que foram identificadas várias situações de alternância entre o exercício de funções no regulador, na banca e auditoras, salientando que estas situações suscitam “constrangimentos” e são vistas como “um fator de descredibilização das instituições e dos seus profissionais”.

“Recomenda-se ao BdP, a revisão do denominado ‘período de nojo’ aplicável na transição entre funções de regulador para regulado, sem prejuízo do padrão que é seguido pelo Single Supervisory Mechanism – SSM, que se revela insuficiente”, assinala o relatório que foi apresentado nesta terça-feira, 20 de julho, aos deputados, depois de mais de três meses de audições que decorreram no parlamento.

No documento, o deputado relator recomenda ainda que seja considerada “a possibilidade de aplicação deste regime na transição entre regulador e entidades não reguladas ou para atividades não sujeitas à regulação prosseguidas, também, por entidades reguladas, por forma a não permitir que a contratação, embora de acordo com a lei, não evidencie o mesmo problema de potencial conflito de interesses”.

A versão preliminar do relatório da CPI ao Novo Banco dá conta de que vários depoentes registaram dificuldades resultantes da acumulação de funções no BdP e como participante no MUS (Mecanismo Único de Supervisão) ou na autoridade nacional de resolução. Neste ponto,  acrescenta, o Tribunal de Contas recomendou já a separação destas duas funções, tendo esta recomendação sido reforçada no contexto da auditoria que elaborou sobre o financiamento ao NB.

Em setembro do ano passado, foi aprovado um ‘período de nojo’ de três anos, mas em sentido inverso: para quem exerceu funções na banca comercial e quer transitar para o BdP, sendo que os políticos podem continuar a transitar diretamente para o regulador financeiro, tal como aconteceu com Mário Centeno.

O PAN, partido que em maio de 2020 desencadeou a revisão da legislação sobre a nomeação do governador e dos restantes administradores do BdP, propunha um ‘período de nojo’ de cinco anos para quem tenha desempenhado funções na banca comercial, em auditoras ou consultoras, mas também no Governo (primeiro-ministro, ministro das Finanças e secretários de Estado das Finanças).

‘Portas giratórias’ foram tema da CPI

As denominadas “portas giratórias” foram tema dos trabalhos da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução. Na mira dos deputados estiveram ex-responsáveis do BdP que supervisionaram os últimos dias de vida do BES – Pedro Machado e Luís Costa Ferreira – e que saíram do regulador em 2014 para trabalharem na auditora e consultora PwC que estava prestar serviços ao supervisor na avaliação do balanço inicial do Novo Banco.

“Sem que se possam qualificar, formalmente, como impedimentos foram identificadas várias situações de alternância entre o exercício de funções no regulador, no regulado, no auditor, ou em entidades não reguladas ou mesmo, em ramos de atividade não regulada nessas entidades”, lê-se no relatório, onde o deputado relator, Fernando Anastácio, destaca que “estas situações suscitam evidentes constrangimentos e são lidas pela opinião pública como um fator de descredibilização das instituições e dos seus profissionais, com particular incidência na área financeira”.

Recorde-se que foram chamados, em março, à CPI ao Novo Banco Luís Costa Ferreira, atual diretor de Supervisão Prudencial do BdP (cargo que voltou a assumir em 2017 depois de ter saído do regulador em novembro de 2014) e Pedro Machado, atual diretor do departamento de Serviços Jurídicos e antigo diretor-adjunto do departamento de Supervisão Prudencial, que renunciaram aos cargos desempenhados no supervisor, em outubro de 2014, para ingressarem na auditora e consultora PwC – que estava a trabalhar com o supervisor na avaliação do balanço inicial do Novo Banco.

Na altura, os deputados confrontaram Luís Costa Ferreira com a sua saída para PwC e regresso ao Banco de Portugal dois anos depois. O atual diretor do BdP defendeu a inexistência de qualquer conflito de interesses, e lembrou as apertadas regras do banco central.

O diretor e o diretor-adjunto do Departamento de Supervisão Prudencial (DSP) do Banco de Portugal, Luís Costa Ferreira e Pedro Machado, renunciaram aos cargos desempenhados no supervisor, em outubro de 2014. Os dois responsáveis foram trabalhar para a consultora PwC. Cerca de dois anos depois, Luís Costa Ferreira e Pedro Machado regressaram ao Banco de Portugal, em 2017, “a convite de Elisa Ferreira”, segundo disse, na sequência da saída de Carlos Albuquerque que à data saiu de diretor de supervisão do BdP para uma instituição financeira (CGD).

A CPI ao Novo Banco chamou em março deste ano o Head of Banking Supervision Department do Banco de Portugal, Luís Costa Ferreira, que passou a ser responsável pela supervisão direta do BES em julho de 2013.

Luís Costa Ferreira defendeu a atuação do Banco de Portugal na supervisão do BES, que foi criticada pelo relatório Costa Pinto. A supervisão do Banco de Portugal no BES foi “enérgica, assertiva e até intrusiva”. E frisou que em 2013 foi feita “uma análise particularmente exigente” dos principais grupos económicos devedores à banca (ETRICC 2), cuja realização foi aprovada pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal no dia 11 de setembro de 2013.

Na PwC, Costa Ferreira ficou responsável pela área de risco e regulação e trabalhou com vários bancos nacionais. “Foi para a generalidade dos bancos”. CGD, BCP, BPI (e filial angolana BFA), Montepio, Finantia e Novo Banco foram alguns daqueles para os quais trabalhou como consultor. Defende que estava limitado pelo dever de segredo, pelo que não podia passar informação sensível a que tivesse tido acesso no supervisor.

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