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Da sala de aula para o e-learning num país desigual

Universidade e politécnicos estão em transição para o ensino a distância. O processo flui, mas a ritmos diferentes. Uns garantiram 100% das aulas online em três dias, outros procuram assegurar computadores para os alunos.
5 Abril 2020, 08h00

A secretária de Luísa Peixoto de Magalhães está cheia. Num lado, um computador permite-lhe ter controlo sobre a turma, acompanhar individualmente o trabalho de cada aluno. No outro, está o computador principal em que professora e alunos interagem. É, por estes dias, a sala de aula. Entre os dois PC, o telemóvel com o grupo WhatsApp… há sempre quem queira tirar uma dúvida.

A professora e a turma de Ciências da Comunicação da Universidade Católica, em Braga, mudaram-se para o e-learning a 16 de março, após o encerramento das aulas presenciais devido à pandemia de Covid-19. “Todos os cursos, professores e alunos da Católica Braga estão assim. Tudo em andamento, o que, confesso, é impressionante!”, diz Luísa Peixoto de Magalhães ao Jornal Económico (JE). “Estamos a cumprir o horário rigorosamente, a entrar e a sair à hora devida, com intervalos e tudo. Até registo um índice de faltas menor entre os alunos”.

Esta realidade estende-se a todo o universo da Universidade Católica Portuguesa, instituição com quatro pólos – além de Braga, Lisboa, Porto e Viseu – 18. 920 alunos e 1.243 docentes, adianta Luís Gustavo Martins, vice-Reitor para a Investigação e Inovação da UCP.

De Braga para Setúbal, a distância não se mede apenas em quilómetros. No Politécnico desta cidade, a principal preocupação chama-se equidade. Nem todos os alunos dispunham de computadores que lhes permitissem enfrentar com normalidade o dia seguinte no mundo virtual. “Estão identificados cerca de 70 estudantes que necessitam de um computador e um número semelhante de acesso à Internet”, revela Pedro Dominguinhos, presidente da instituição, ao JE, adiantando que, neste momento, o Politécnico já preparou cerca de 80 computadores e a Associação Académica assumiu os custos do acesso à Internet. “Conseguimos garantir, em articulação com os Serviços de Ação Social, que suportam o apoio aos estudantes, através dos auxílios de emergência previstos na legislação, que todos os identificados possam usufruir do ensino a distância”.

Estamos agora na capital. Uma semana foi quanto bastou ao Instituto Superior Técnico para operar a transformação. Raquel Aires de Barros, presidente do conselho pedagógico da maior escola de engenharia do país, adianta ao JE que as cerca de 500 unidades curriculares do segundo semestre do ano letivo 2019/2020, que agora decorre, estão a funcionar à distância, a maior parte por videoconferência, usando o Zoom/Colibri. Estão envolvidos cerca de 9.500 estudantes e 700 docentes e colaboradores de ensino. “Pelos testemunhos que nos têm chegado, quer de docentes quer de alunos, parece-nos que a adaptação decorreu sem problemas de maior”, diz.

Idêntico é o eco que nos chega do ISCTE-IUL. A instituição dispunha das ferramentas, infraestruturas e processos de ensino a distância que eram utilizados em casos específicos. A generalização do uso foi antecedida por ações de formação, presenciais e online.

Mais a norte, Sandra Soares, pró-reitora da Universidade de Aveiro, frisa ao JE que se trata de “um processo complexo”, mas considerando as circunstâncias excecionais, “temos de ser capazes de fazer a melhor transição possível”. A UA tem mais de 15.000 estudantes e 1.000 docentes. À semelhança de Setúbal, o momento é de contagem de espingardas. “Para assegurar as condições tecnológicas essenciais, estamos a proceder ao levantamento das necessidades e a procurar resolver todas as situações de dificuldade de acesso a equipamento informático e ou internet”.

Universidades e politécnicos, em geral, têm optado pelo Moodle (sistema de e-learning), Colibri/Zoom e Microsoft Teams. Dados fornecidos pela Fundação para a Ciência e Tecnologia ao Jornal Económico mostram que o Colibri está em exponencial. Só no dia 27 de março, por exemplo, foram realizadas 9.171 aulas e reuniões, envolvendo um total de 173.320 participantes. Em 2019, a média diária cifrou-se em 124 reuniões e 827 utilizadores diários.

A Universidade do Minho foi uma das primeiras a encerrar portas depois de ter sido detetado um caso de Covid-19 num aluno. Fernando Azevedo, professor do Instituto de Educação, instituição da UMinho, com 1.200 alunos e 85 docentes, está no grupo dos primeiros professores portugueses a transferir a sala de aula para o e-learning. “Está a ser um processo relativamente tranquilo”, sublinha ao JE. E justifica: “A Universidade do Minho tem uma plataforma de ensino a distância há uma série de anos, a Blackboard Collaborator, que utilizamos seja para as aulas de licenciatura, pós-graduação, nomeadamente mestrados, e particularmente para os programas de doutoramento, uma vez que temos alunos espalhados pelo mundo”.

Fernando Azevedo e Luísa Peixoto Magalhães, com quem falei em simultâneo numa videoconferência a três, garantem: “Se há alguma coisa que vai parar neste país não são as escolas”.

Artigo publicado no Jornal Económico de 03-04-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor

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