É estranho falar em deflação quando os números mais recentes e a imprensa nos mostram precisamente o contrário. Por exemplo, na quarta-feira passada ficou a saber-se que a inflação homóloga nos EUA chegou a 9,1% em junho, níveis que já não eram vistos desde 1981.

No entanto, são cada vez mais os analistas, nomeadamente aqueles que gostam de ver mais à frente, que começam a ficar preocupados com o que poderá acontecer a partir de 2023. Começa a haver vários sinais de que a inflação está a provocar uma retração na procura e, com ela, poderá vir a recessão e posteriormente uma baixa de preços.

Desagregando os últimos números da inflação nos EUA, percebe-se que há uma franja dos componentes dos cabazes de compras que já dão sinais de descida dos preços, aparentemente devido à sensibilidade da procura às variações de rendimento disponível. Os principais responsáveis pela alta de preços continuam a ser os preços dos combustíveis (e demais bens energéticos), alimentação, habitação e despesas com saúde.

Os mercados de commodities têm revelado fraqueza, num cenário muito diferente do que se registava no primeiro semestre, com destaque para as quedas nos metais industriais – que são um importantíssimo barómetro da confiança empresarial global – e também em alguns produtos agrícolas. Se os preços do petróleo continuarem a recuar, e já estão mais de 25% abaixo dos máximos, a pressão sobre a inflação irá diminuir.

Num cenário de recessão, que se vai tornando cada vez mais plausível ao observarmos, por exemplo, a inclinação negativa da curva de rendimentos nos EUA e o comportamento das bolsas, a procura agregada tenderá a contrair e, com ela, os preços. Claro que também se poderá continuar a falar de estagflação, mas a deflação poderá ser a surpresa de 2023.

De uma forma ou de outra, vai parecendo cada vez mais provável que a Fed estará a incorrer num erro de política monetária (policy mistake) ao subir as taxas em demasia e que, por outro lado, o BCE poderá vir a subir os juros muito menos do que se pensava há apenas um mês atrás.