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Dirk Lehmann: “Têm uma ideia de negócio? Esqueçam-na!”

Dirk Lehmann, coach at Lehmann&Partners defende que as ideias são apenas o motor de arranque para juntar a equipa. Depois, devem ser esquecidas para não matar o negócio.
5 Agosto 2018, 18h00

Já esteve do lado do aluno. Agora é mentor. Dirk Lehmann, coach at Lehmann&Partners defende que as ideias são apenas o motor de arranque para juntar a equipa. Depois, devem ser esquecidas para não matar o negócio. A chave que abrirá a porta do sucesso de uma StartUp é criar algo que resolva um problema.

Trabalhou cinco anos na Mercedes Benz. Saiu. Queria ser empreendedor! Inscreveu-se no programa da Academia Europeia de Inovação (EIA). Já esteve no lugar destes alunos?

É verdade. Em 2014, fui participante (risos). A nossa equipa fez todos os erros que vêm nos manuais. Alguns mentores já não queriam reunir connosco – não aceitávamos feedback. A equipa esteve sem falar três dias. Inclusive, rejeitámos dinheiro de um investidor.

 

A sério?

Verdade. Fizemos mesmo tudo errado (risos).

 

Qual era a ideia?

Era ajudar um grupo de amigos a saber o que haveria para fazer na área circundante, quando saíssem. Não era algo de que o mercado necessitasse. A nossa ideia não seguiu em frente. Mas no final, todos os membros da equipa tiveram resultados surpreendentes nas atividades que abraçaram.

 

Com esta experiência percebeu que não queria ser empreendedor?

Percebi que sou melhor na área da criação de comunidades; na vertente da educação e na relação com os empreendedores. Através de um mentor da EIA fui para os Estados Unidos frequentar o TechStars, um dos maiores programas de aceleração de StarUp, do mundo. Devido à experiência adquirida na Mercedes Benz comecei a trabalhar lá. Mais tarde fui para o Dubai. Como tenho facilidade em comunicar, comecei a ajudar as StartUp nessa vertente. Dei formação de como deveriam fazer os seus pitch – uma apresentação breve que dê a ideia do negócio. E assim comecei nesta área.

 

Ainda pensa lançar uma StartUp?

Não excluo essa possibilidade – se encontrar a equipa certa. Mas pelo menos, nos próximos cinco anos, não deverá acontecer (risos).
 

A aventura do empreendedorismo é dura.

É a coisa mais difícil que se fará na vida. No início, parece fácil mas as coisas vão complicar-se. Estas três semanas poderão ser muito importantes para estes estudantes. Podem testar se querem ou não este estilo de vida. Porque vão mesmo sentir o que é lançar um negócio.

 

Só a experiência já vale a pena.

A Academia é mais uma plataforma de lançamento. De networking para o futuro. Trocam-se contactos de todo o mundo. De várias áreas do conhecimento. Os mentores também estão sempre conectados. É fantástico.

 

Mas porque falham tantas StarUp?

A maioria falha o mercado, não a ideia. Criam algo de que as pessoas não precisam.

 

Mas como saber o que os clientes querem?

Muitas vezes os empreendedores olham para a perspetiva errada. Assumem que existe um problema. Que pode nem existir. A primeira coisa a fazer é certificar-se quais são as reais dificuldades dos consumidores. Conversar sobre o passado e perceber como estes ultrapassaram os seus obstáculos pode ajudar a decifrar este enigma.

 

Disse que quando se tem uma grande ideia, o melhor é esquecê-la. Bem, é duro.. Estes estudantes estarão aqui três semanas à volta da sua ideia.

Eu sei (risos). O que defendo é que a ideia serve apenas para juntar a equipa e conseguir os primeiros apoios. Não é mais do que isso. Depois, o importante é abandoná-la e tentar resolver um problema. As pessoas são simpáticas, pelo que se lhes perguntar: Gosta da minha ideia? Todas dirão que sim. Porque não vão ter de lidar com ela.

 

Não terão de a comprar?

Exato. Mas se o empreendedor avançar, pode passar meses, anos a desenvolvê-la. Gasta rios de dinheiro e, no final, criará algo que irá para o mercado mas ninguém comprará ou usará. Mas mais importante do que o dinheiro – que claro que o é – é o tempo perdido. O esforço em vão que poderia ter sido utilizado em melhores ideias, projetos e soluções.

 

Da sua experiência como mentor após irem para a rua, as equipas mudam a ideia?

Sim, 67% fazem-no. Porque verificaram que o cliente não precisava daquele produto ou daquela solução. O teste de validação da ideia junto do consumidor é muito importante.

 

Qual o segredo para encontrar o consumidor certo para um produto?

Primeiro deve distinguir-se quem usa o produto de quem o compra. Diferenciar usuário de consumidor. Por vezes, quem o utiliza também é o comprador mas no markteplace de diferentes serviços nem sempre é assim. Veja-se o exemplo do facebook. Todos o usamos mas quem o paga são as companhias anunciantes. Então, os empreendedores das StartUp têm de perceber de onde vem o dinheiro. Quem está a pagar aquele serviço? Finalmente, terão de tentar encontrar quem esteja disposto a pagar pelo seu produto ou serviço. E focar-se. Se quiser vender algo a estudantes não vão contactar todos os universitários portugueses, senão tentarão encontrar alguém e não encontrarão ninguém.

 

Mas deve fazer-se um perfil do potencial cliente?

Sim e tentar entender quais os seus gostos e comportamentos. Os seus hobbies.  Se é casado, solteiro ou se tem filhos. De que música gosta? Se é ativo no desporto? Antigamente, para classificar os clientes utilizavam-se os dados estatísticos da população mas já não resulta. Alguém da mesma idade e que more na mesma cidade pode ser completamente diferente. É preciso ir mais fundo. Entender quais são as suas frustrações, os seus objetivos e como interagem com o mundo à sua volta. Feita esta pesquisa deve desenhar-se um mapa com as características do potencial cliente. O passo seguinte é tentar encontrar esse tipo de pessoas e certificar-se de que acertou no alvo. Posto isto, o empreendedor deveria ser capaz de ir na rua e identificar de imediato o seu consumidor. Até dizer-lhe: Sei que tem este problema. Eu tenho a solução.

 

Isso criaria uma situação incrível.

Decerto a pessoa entraria em choque (risos) mas seria como se o empreendedor conseguisse calçar os seus sapatos. Aí sim, teria um trunfo para conceber algo realmente importante para o consumidor.

 

Um dos exercícios que fez com os alunos foi colocá-los a tentar vender um shampoo de cão ao colega do lado

Esse trabalho serve para lhes mostrar que tentam logo começar a vender o produto sem tentarem saber quem é o cliente. Do que é que ele precisa.

 

Uma das estudantes argumentava que ela própria tinha experimentado o shampoo e que era óptimo.

(Risos). Sim, e outro aluno perguntou ao suposto dono se sabia como é que o cão dele se sentia com o shampoo concorrente.  Uma das participantes que não estava a conseguir convencer o comprador, resolveu dizer-lhe:

– “O seu cão está imundo.  Não acha que precisa de um banho?”  Tudo isto são ensinamentos muito importantes para mostrar que mais do que tentar vender o produto, é importante ouvir o que o cliente tem a dizer. Por isso, fazer uma entrevista é fundamental. Ouvir 80% do tempo é a melhor forma de entender quais as necessidades reais daquela pessoa. Que neste role play era o dono de um cão.

Quando é que se sabe que houve um final feliz numa entrevista a um cliente?

Quando pedimos um email para enviar algo mais concreto do nosso produto ou solução, e nos facultam essa informação. Ou quando dão referências nossas ou do nosso produto a outro potencial cliente. A cereja no topo do bolo, é conseguir um pré-venda assinada – mesmo que seja sem compromisso – da pessoa com quem se reuniu.

 

 

 

 

Nota: A jornalista participou no evento a convite do Santander

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