Enquanto o mundo enfrenta uma grave crise energética com consequências potencialmente gravosas para a recuperação da economia mundial, em Portugal discute-se o englobamento dos rendimentos de capitais. Este tema gera sempre muita popularidade junto dos governos, uma vez que se trata de taxar os ricos, e é muito útil para distrair face ao que realmente interessa, a subida do preço da energia.

De tempos a tempos, a ideia do englobamento de rendimentos no IRS é ressuscitada. A discussão começa sempre pelas rendas ou mais-valias do imobiliário, passa pelos juros de depósitos a prazo e termina invariavelmente em taxas e especuladores do mercado de capitais.

Neste artigo irei focar-me apenas no englobamento dos rendimentos de capitais.

Temos primeiro de perceber porque é fácil desistir de taxar os depósitos. A taxa de juro média dos depósitos a prazo desceu de 3,36% em 2011 para 0,11% em 2020, segundo dados do PORDATA. No mesmo período, a remuneração dos depósitos à ordem desceu de 0,11% para 0,01%. Resumindo, os mais de 160 mil milhões de euros que os particulares têm nos bancos praticamente já não apresentam rentabilidade, pelo que taxar 100% de zero tem o mesmo efeito prático que os actuais 28%.

Agora vamos ao mercado de capitais.

Partindo do pressuposto que quem investe nos mercados, ou tem capital disponível, resulta da acumulação de actividades do trabalho, então o rendimento já foi taxado, e no caso dos escalões mais elevados a 50%. Até os rendimentos provenientes do jogo, e para prémios mais elevados, têm uma taxa de imposto de selo de apenas 20%, sendo que para rendimentos inferiores a 5.000 euros nem existe lugar a qualquer taxa.

Percebe-se o incentivo para gastar hoje, uma vez que a receita fiscal associada é imediata, enquanto que os impostos sobre investimentos podem demorar anos até ser cobrados.

O englobamento obrigatório é penalizador para o investimento, vai contra todas as recomendações da OCDE e das orientações dadas pelo próprio Ministério das Finanças na aposta que tinha para revitalizar o mercado de capitais e fomentar a entrada de empresas em bolsa.

Temos ainda uma discriminação negativa dos portugueses relativamente aos estrangeiros, uma vez que por via do estatuto de Residente Não Habitual, os rendimentos obtidos fora de Portugal, mesmo em mercados, estão isentos. No fundo, esta medida, a avançar, não é mais do que um incentivo aos portugueses com algum capital, para emigrarem, obterem residência fiscal noutro país, e regressarem uns anos mais tarde beneficiando das mesmas isenções que os estrangeiros têm.

Apesar de mais de metade dos portugueses não pagarem IRS, propostas populistas como o englobamento são destruidoras da confiança e do investimento em Portugal. Um país que apenas vive de serviços externos, não fomentando a poupança nacional, está condenado, como se vê pela recuperação económica tardia de Portugal.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.