Está em discussão pública, até 15 de Junho de 2018, a proposta de alteração do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT).

Apesar de o lance ter passado praticamente despercebido na praça pública, o momento é crucial. Ou melhor, pela importância do que está em causa, devia ser crucial: o PNPOT é, nada menos, que o instrumento que, sob a forma de lei da Assembleia da República, concretiza as opções tomadas nos instrumentos estratégicos de âmbito nacional e define o modelo de organização espacial para todo o território nacional.

Estranhamente, e ainda menos do que na versão do PNPOT de 2007 em vigor, a proposta em discussão pouco ou nada diz sobre o que devia dizer. Estamos perante um documento perdido numa tecnicidade cheia de “coesão”, “inovação”, “valorização”, “incrementos” de coisas boas e “reduções” de coisas más, que evita calcular meios, quantificar/datar metas e oferecer soluções concretas para os problemas (bem) diagnosticados. Enfim, propõe-se ao país um programa praticamente vazio. Veja-se três de muitos exemplos:

(i) A remissão genérica para uma concretização ao “nível político” e ao Programa Nacional de Investimentos 2030, fugindo-se àquilo que deve ser o próprio PNPOT;

(ii) A omissão sobre os objectivos que o Estado quer assumir sobre a localização dos grandes investimentos públicos, de onde ressalta a eliminação das referências ao novo aeroporto de Lisboa e ao TGV que estavam (estão) no PNPOT de 2007 (adivinha-se porquê, mas uma justificação, curta que fosse, era o mínimo);

(iii) As saídas para a trágica perda demográfica que enfrentamos são reduzidas ao “aumento da atratividade residencial, económica, ambiental, cultural e de lazer das áreas rurais e dos territórios de baixa densidade”, sem que se enunciem quaisquer mecanismos ou metas palpáveis.

Em cima disso, há umas “directrizes de conteúdo” para os planos de nível inferior (sobretudo para Programas Regionais e PDM), mais ou menos razoáveis, mas sem uma articulação explicada com o diagnóstico feito ou com as ditas medidas que se propõem.

Este enorme vazio é sintomático de um tempo em que poucos ousam atravessar-se. Em que as forças políticas e administrativas não se atrevem a superar o imediatismo da nossa vida colectiva e de contrariar a obsessão com gestões mediáticas e com a trama de supostos combates políticos (que, na maior parte dos casos, nem passam de confrontos estéreis de egos).

O resultado é uma proposta de Programa sem rasgo, que se resume à sistematização do diagnóstico dos problemas territoriais e à compilação de medidas ultra abstractas que eventualmente podem um dia produzir efeito. Talvez, se calhar, não se sabe bem quando ou como. Mas se é assim, para quê manter um PNPOT no nosso sistema de gestão territorial? Ou sequer rever o que está em vigor? Talvez valha a pena participar, nem que seja só para perguntar isto mesmo.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.