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Eleições no Sporting. Frederico Varandas: “Não há necessidade de entrada de investidores”

Presenciou o ataque à academia de Alcochete e após sete anos como médico do clube, sente-se preparado para assumir a presidência do Sporting.
  • Cristina Bernardo
8 Setembro 2018, 14h00

Aos 39 anos, o antigo diretor clínico do clube viveu de perto os meses de turbulência que levaram às eleições. Foi o primeiro a assumir e a formalizar a candidatura e promete um perfil de liderança diferente de Bruno de Carvalho. Em entrevista ao Jornal Económico, Frederico Varandas dispensa a entrada de investidores e coloca o foco em duas vertentes: recompra das VMOC e reestruturação do passivo. No seu entender, garantir a maioria da SAD é a melhor maneira de assegurar os interesses do Sporting.

Que motivos o levam a candidatar-se a presidente do Sporting?

Por não me rever mais no rumo que o clube escolheu tomar. Cresci a ser Sporting, conheço muito bem os seus valores e senti que no último ano houve um desvio daquela que é a nossa identidade e ADN. Não podia continuar a fazer parte daquela estrutura. Mesmo sendo apenas um funcionário, tive que assumir a responsabilidade de ser a pessoa mais capaz, pelo conhecimento que tenho. Neste espírito de missão, acredito que posso pôr o Sporting no patamar que merece, quer no ponto de vista desportivo, quer de valores e dignidade. Estes últimos três meses foram horríveis para quem ama e sente o clube. Não sou mais que qualquer outro sócio. Sou apenas um sócio no momento e com o conhecimento certo, com a força, paixão e competência necessária para pôr o Sporting a vencer.

Sente que a experiência como diretor clínico do clube lhe dá alguma vantagem?

Totalmente. Em novembro de 2007, quando entrei no Vitória de Setúbal, passei a perceber o que é o futebol. Não tenho dúvida nenhuma que todos os candidatos gostam de futebol, mas gostar é diferente de perceber. Estou há 11 anos na ‘casa das máquinas’, sete dos quais no Sporting. Perceber de futebol é perceber o que faz um team manager, um diretor desportivo, um secretário técnico, qual o perfil ideal para um treinador, que competências deve ter. Qual a simbiose entre a equipa técnica e o departamento de scouting, e como deve ser montado esse departamento. Durante sete anos conheci esta ‘casa das máquinas’ como a minha mão. E houve três treinadores (Marco Silva, Leonardo Jardim e Jorge Jesus) que passaram pelo clube e quiseram levar-me com eles e não é apenas por eu ser um bom médico. É de como vivo e percebo o futebol, e aqui há uma grande diferença para os outros candidatos, porque aquele que ganhar vai chegar ao clube e vai ter que ter uma curva de aprendizagem e o Sporting não tem tempo para isso, porque tem um peso de 16 anos sem vencer títulos no futebol sénior. Quero um clube que continue a vencer nas modalidades, mas passe a ganhar no futebol.

Quando é que percebeu que Bruno de Carvalho estava a ser mais prejudicial do que benéfico para o Sporting?

Nos últimos meses. O último ano de mandato, para mim, foi quando o ex-presidente se desviou do que tinha sido o mandato inicial. Bruno de Carvalho foi-se afastando dos valores e da forma como geriu os profissionais do futebol com os adeptos, futebol versus modalidades, a relação entre os próprios adeptos… criou uma gestão de dividir para reinar e quando se faz esse tipo de gestão, o reinado destrói-se completamente.

Aprendeu algumas lições sobre o que não deve fazer?

A formação que tive foi moldando a minha forma de liderar, que é pelo exemplo. Não lidero pelo medo, pela imposição, e aí tenho um perfil de liderança totalmente diferente de Bruno de Carvalho.

De que forma podemos hierarquizar algumas metas que tenha estabelecido para o Sporting?

Primeiro, a união não se diz. Efetiva-se! Não só comigo ou com o corpo diretivo, mas com os sócios. Têm de ser eles a querer essa união. Não tenho ilusões, só vai haver união com resultados. Vejo muitas pessoas preocupadas com o futebol e a área financeira, mas há uma área que me preocupa muito que é o negócio. É óbvio que num clube desportivo o mais importante é a sua performance desportiva no futebol e modalidades. Essa é a âncora que vai determinar o sucesso da nossa organização, mas acoplada a essa âncora está todo um ‘ecossistema’ que irá potenciar a criação de valor do Sporting Clube de Portugal. Ou seja, uma gestão cuidada e profissional desse ‘ecossistema’ vai valorizar a experiência do sócio no mesmo e o clube beneficia dessa experiência, do ponto de vista financeiro. O nosso modelo de gestão é de dentro para fora, é no sócio, nos seus interesses, o que gosta de ver, o que gostava de ter, e adaptar um ‘ecossistema’, dividido em três vertentes: física (estádio, pavilhão, loja verde, núcleos), digital (site, aplicação móvel, redes sociais) e emocional (paixão). O segredo está na interligação destas três vertentes. Em 2015, o Atlético de Madrid tinha o antigo estádio esgotado com gameboxes e filas de espera para a aquisição de bilhetes de época. Faturou em merchandising 57 milhões de euros. Em dois anos, cresceu de 57 milhões para 79 milhões de euros, só com uma gestão de marketing dirigida para os sócios. No Sporting, o último relatório de contas mostrou que tínhamos ao nível de receitas da SAD no merchandising 3,9 milhões de euros, e vemos o Futebol Clube do Porto com menos sócios e adeptos a faturar 5,4 milhões. Enquanto clube, o Sporting, da forma como ganha nas modalidades, tem na junção do merchandising a possibilidade de garantir mais patrocínios, um valor que não chega aos 400 mil euros/ano.

De que forma pensa melhorar essa área?

Com recursos humanos válidos, com experiência transversal a toda a área comercial do Sporting. Isto é uma das minhas prioridades. Tenho uma equipa forte do ponto vista técnico e financeiro, com Francisco Salgado Zenha, e na área comercial com Pedro Lencastre e Miguel Cal.

Porque escolheu Rogério Alves para presidente da MAG, quando se falou numa possível candidatura do próprio à liderança do clube?

É uma pessoa muito querida pelo ‘universo’ sportinguista e reconhecido pela sua competência e idoneidade profissional. Vai garantir a soberania e os últimos meses demonstraram a importância que é ter um bom presidente da mesa da assembleia geral e Rogério Alves dá essa garantia. Foi muito fácil, convidei-o, ele viu o meu projeto assente em pessoas, na competência, no mérito, e aceitou.

Como é que vai gerir a manutenção da maioria da SAD pelo clube?

Um dos pilares da nossa candidatura, e esse é inegociável, é que o Sporting continue a ter a maioria do capital da SAD. Não há necessidade da entrada de investidores, queremos é assegurar duas coisas: recompra das VMOC e uma reestruturação do passivo bancário. Este é um momento oportuno e possível para tal, onde conseguimos passar a respirar melhor. 

Acredita que vai encontrar recetividade para que isso seja conseguido?

Em abril, o anterior conselho diretivo já tinha apalavrada uma reestruturação financeira e a compra das VMOC, com as entidades bancárias. Confiamos nesse acordo.

Vai ser presidente da SAD?

Sim, exatamente por ser essa a forma de poder garantir que a maioria da SAD se mantém no clube. Muitas vezes as pessoas não percebem o porquê do presidente do clube ser também da SAD. Para mim é muito simples, é a melhor maneira de conseguir garantir os interesses do Sporting na SAD.

Vai ser remunerado?

Sim, é a forma mais transparente e deixa tranquilo qualquer presidente e sócio do clube. Na minha vida fui sempre subindo a pulso e vou deixar o meu trabalho para me dedicar a 100% ao Sporting e ter a remuneração que já estava atribuída, não vou mexer em nada.

Em relação aos jogadores que rescindiram contrato como é que defende que o Sporting atue,

em relação àqueles que já assinaram por outros clubes?

Sou o candidato com mais proximidade do futebol, não só de jogadores mas de treinadores, agentes, clube. Desses jogadores que rescindiram, três já voltaram.

Teve algum tipo de influência nesses regressos?

Tenho feito sempre tudo o que posso pelo Sporting.

E compreende a posição daqueles que não voltaram?

Não vou fazer juízos de valor. Vivi tudo o que se passou, em todos os momentos estive lá. Outros gostariam de ter estado e não estavam, outros disseram que se estivessem… eu sempre estive lá. Os jogadores conhecem-me muito bem e respeitam-me por duas coisas: o meu profissionalismo e amor pelo Sporting. Sempre exigi e dei o melhor de mim em sete anos que estive lá, e ao fazer isso exigi que todos dessem o seu melhor. Os jogadores sabem que a partir do momento em que rescindem contrato com o Sporting, irei defender os interesses do clube a 100%, não me interessa se eles acham que têm muita ou pouca razão. Não misturo o Sporting com amigos, jogadores e familiares. Todos os casos onde não exista uma compensação financeira séria e justa pelo valor do jogador, ao Sporting só resta recorrer aos tribunais, FIFA, e exigir esse valor. Não tenho a menor dúvida que esse é o caminho que iremos tomar.

Até 8 de setembro, ainda haverá situações pendentes para resolver?

Penso que sim. Jogadores como o [Daniel] Podence, o Rui Patrício, não sei como é que está a situação negocial entre os clubes. Se não houver um pagamento justo desses clubes por quem os jogadores assinaram, então depois dessa data continuarei esta batalha judicial, sem dúvida nenhuma.

Como é que tem visto o trabalho da Comissão de gestão?

Acredito que estejam a fazer o melhor possível, não quero interferir com nada. Fiquei contente com o regresso desportivo destes três jogadores [Bruno Fernandes, Bas Dost e Rodrigo Battaglia], espero que consigam ainda mais.

Em relação ao modelo de gestão da SAD haverá alguém mais ligado ao futebol?

Vamos ter três administradores: eu, Francisco Salgado Zenha e Miguel Cal. A parte do futebol vai ser assumida por mim. Vou supervisionar tudo o que se passa no futebol, na formação, contratação de jogadores, que têm de ser feitas com muito critério, não cair em tentações ou sonhos. Jogadores que, no momento da sua contratação, consigamos saber todo o seu histórico profissional, social, de lesões (faz toda a diferença). Para isso tem que se criar uma estrutura para errar menos no futebol.

O gabinete de scouting precisa de ser reformulado?

Totalmente. Não quero ter um departamento de scouting que faz negócios com os empresários. Este departamento analisa e observa jogadores. Quero profissionais no terreno com mercados que tenham potencialidade para o Sporting.

Já tem alguém para liderar esse departamento?

Tenho toda a estrutura fechada já há muito tempo. Com todo o respeito e humildade digo que a minha equipa não dá hipótese a nenhuma outra candidatura. Não vou querer ganhar as eleições e depois ir procurar as pessoas para os determinados lugares. Sei qual o team manager, o diretor de scouting, como quero montar esse sistema e o processo de contratação dos jogadores, que vai ser definido entre o diretor de scouting, treinador, team manager, mas comigo a observar tudo.

É reforçar o nível de exigência?

Sim, mas este nível de exigência só existe com conhecimento e é preciso ter estado lá e passado pelo que passei, porque há sete anos atrás também não sabia o que sei hoje. Sempre gostei de futebol, mas não o percebia, e isso é o que me diferencia dos outros candidatos.

Esses nomes para diretor desportivo e da academia podem ser antigos jogadores do clube?

Não vou ter um diretor desportivo, mas sim um team manager. Vou ser eu a decidir o perfil do treinador. O team manager será um ex-atleta, bicampeão e formado no Sporting. O head scouting será um profissional que percebe muito de futebol e cujo nome irá ser revelado em breve.

Esteve sete anos no banco de suplentes como médico. Vai adotar essa postura se for presidente?Nem como médico, nem no banco. Serei presidente na tribuna. Aprendi nestes 11 anos a respeitar o espaço físico para o presidente, órgãos sociais, jogadores e, quando for preciso, descer cá abaixo e falar com eles.

Nota de redação: Artigo originalmente publicado no dia 10 de agosto, na edição impressa nº1949 do JE.

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