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Eletricidade continua a ganhar terreno aos combustíveis fósseis

A eletricidade depara-se com três tendências: competitividade das renováveis, paradigma da produção distribuída e massificação dos veículos elétricos.
  • Jose Manuel Ribeiro/Reuters(Arquivo)
19 Janeiro 2018, 05h15

No plano global, e atendendo às tendências atuais, o setor da energia vive um período de conquista de uma maior preponderância da eletricidade face às restantes fontes de energia, no que toca ao consumo final.

Nuno Carmona, membro do EnerXXI – Think Thank de Energia (grupo que promove a discussão de temas relacionados com a energia), as estatísticas revelam que a grande transformação no mix de consumo final de energia, nos últimos 40 anos, incidiu sobre a eletricidade, que conquistou quota aos combustíveis fósseis (com exceção do gás natural). O recente processo de industrialização asiático e sua correspondente eletrificação foram os principais responsáveis por esta dinâmica.

Particularmente sobre o segmento eletricidade, deparamos com três tendências disruptivas face ao passado recente. Primeiro, o aumento da competitividade das fontes renováveis. “Depois de uma fase inicial, na qual as fontes renováveis de geração de eletricidade cresceram à custa da subsidiação de fundos europeus e dos consumidores de eletricidade, em consequência das economias de escala e da aposta da China na alteração do seu mix energético, registou-se uma aceleração no processo de convergência entre os custos unitários das fontes renováveis e as não renováveis (mais competitivas)”, explica.

Outra tendência prende-se com o paradigma da produção distribuída – neste novo paradigma, o utilizador das redes deixa de estar no final da cadeia de valor e passa para o centro, numa nova lógica do tipo radial. Esta nova forma de encarar a indústria, a massificar-se, implicará, também, toda uma nova forma de encarar a gestão de redes e o mix de fontes de produção, o que poderá tornar o sistema elétrico quase irreconhecível face à realidade atual. “A médio prazo não parece que seja possível que a produção descentralizada consiga bater os custos unitários das grandes unidades de produção (grandes grupos produtores e parques eólicos e solares) que dominam o panorama atual”, defende Nuno Carmona.

Uma terceira tendência diz respeito à massificação dos veículos elétricos.Carmona diz que, neste momento, “parece desenhar-se um cenário em que o automóvel elétrico poderá vir a conquistar fatias significativas de quota de mercado. Ultrapassada a grande barreira competitiva que é a densidade energética das baterias, tempo de carga e disponibilidade de redes de carga, o veículo virá a revelar-se económica e tecnicamente superior ao veículo convencional”. Nesse cenário, a quota de energia no setor dos transportes, dominado pelos derivados do petróleo desde a segunda metade do século XX, “passará a ser seriamente disputada pela eletricidade. Mesmo ao nível do transporte rodoviário de mercadorias e aviação já surgem projetos de tecnologia híbrida que, numa próxima geração, poderão vir a impor-se”, remata.

Com base nesta análise global, o EnerXXI, não deixa de evidenciar que a soma destas três tendências, por vezes com resultados opostos, “é muito difícil de fazer, uma vez que têm muita incerteza associada. E a primeira incerteza é quanto ao mix tecnológico de produção”. Se, por um lado, um cenário de massificação dos veículos elétricos apresentar-se-ia como uma oportunidade para as tecnologias de ‘base de diagrama’ (carvão e nuclear), devido ao enorme aumento da procura de eletricidade, o crescimento de renovável seria, nesta perspetiva travado em termos relativos. “A não vingar o cenário de massificação do veículo elétrico, será de esperar a continuação da tendência atual de desclassificação das centrais a carvão, fuel e nucleares por todo o mundo, ficando apenas o gás natural por ser o que tem as melhores condições de assegurar a garantia de abastecimento de eletricidade num contexto predominantemente renovável”, diz.

Gás natural: a energia de transição

“O gás natural é hoje reconhecido como a energia de transição, que garantirá alguma redução de emissões, enquanto a tecnologia não permitir uma massificação das soluções renováveis”. Quem o afirma é Diogo Almeida, membro do EnerXXI, que acrescenta que, tendo em conta este potencial, é uma “excelente notícia” que Portugal tenha conseguido, em 2016, fornecer o sistema elétrico nacional durante quatro dias (em 365) apenas com recurso a fontes renováveis, ainda que também permita ter uma noção da distância a que ainda estamos de um objetivo de eliminação de emissões na produção elétrica.

Com o advento do Gás Natural Liquefeito, transportado por navio para qualquer parte do mundo com acesso marítimo, o mercado de gás globalizou-se, ficando mais parecido com o de petróleo bruto. “Será por isso mais difícil à Rússia, por exemplo, usar a dependência europeia como ferramenta geoestratégica de pressão. Prevê-se um excedente de gás até ao início da próxima década, em consequência dos muitos projetos em curso, o que deverá conter o seu preço e assegurar a sua competitividade com o carvão”, reforça. Importa ainda salientar que, para lá do fator económico, os níveis de poluição atmosférica na China, em especial nos grandes centros urbanos, levaram também as autoridades a limitar a utilização de carvão, promovendo o gás e as fontes renováveis.

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