[weglot_switcher]

Entre a pressão política e a tradição do setor, dividendos vão estar em foco na AG da EDP

Os acionistas da EDP votam hoje uma proposta para distribuir 695 milhões de euros em dividendos (dos quais quase 150 milhões para a CTG). As cotadas estão a ser pressionadas para cortar a remuneração acionista devido à Covid-19 mas, apesar das duras críticas de Catarina Martins, a tradição deve reinar: o dividendo é para pagar.
  • Cristina Bernardo
16 Abril 2020, 08h10

Será provavelmente difícil superar o drama do ano passado, quando a Assembleia Geral (AG) da EDP Energias de Portugal decidia (e acabaria por ‘matar’) a oferta da China Three Gorges (CTG) para comprar o que não detinha da energética portuguesa.

A reunião magna desta quinta-feira não vai ser, no entanto, despida de interesse, com um tema a centrar as atenções: o pagamento de dividendos numa altura em que muitas empresas estão a cancelar, cortar ou adiar essa remuneração acionista devido ao esperado impacto negativo da pandemia do novo coranavírus na economia global.

O ponto dois (num total de oito) da agenda da reunião, que começa às 15 horas e decorrerá por meios telemáticos, é fiel à estratégia anunciada em Londres em março de 2019: pagar um dividendo de pelo menos 0,19 cêntimos por ação por ano até 2022. No caso do exercício de 2019, o Conselho de Administração Executivo propõe um pagamento precisamente nesse valor mínimo, para perfazer um pagamento total de 694,74 milhões de euros em dividendos.

Na apresentação dos resultados de 2019, a 20 de fevereiro, a empresa liderada por António Mexia assinalava que a 0,19 euros por ação o dividend payout, ou seja, o rácio do total dos dividendos pago face ao resultado total seria de 81%, mas essa indicação era sobre o lucro recorrente, que não inclui provisões e imparidades. Face ao resultado líquido incluindo esses one-offs, de 512 milhões de euros, o dividend payout sobe, contudo, para perto de 136%.

Catarina, a crítica

À semelhança do que está a acontecer à volta do mundo, várias empresas portuguesas alteraram os planos ou as tendências relativas aos dividendos como medida de precaução perante as perspetivas económicas sombrias para este ano, mas também devido à pressão das autoridades. O BPI tornou-se esta semana o último banco em Portugal a anunciar o cancelamento do dividendo, seguindo as pisadas do Millennium bcp e do Santander Portugal, e após recomendações vindas do Banco Central Europeu e do Banco de Portugal.

Noutros setores, a Novabase, os CTT, a Sonae Capital e a Merlin Properties retiraram os planos para pagar dividendos, enquanto a Semapa e a subsidiária Navigator reduziram de forma drástica os valores que vão pagar face aos do ano passado.

A pressão para cortar os dividendos também tem sido exercida pelos atores políticos. O Presidente da República, Marcelo de Rebelo de Sousa, e o líder do PSD, Rui Rio, apelaram aos gestores para não pagarem dividendos este ano.

Sobre o setor da energia, o Bloco de Esquerda tem sido a voz mais crítica. A coordenadora do partido, Catarina Martins, defendeu na segunda-feira que o Governo deve utilizar a participação que detém na Galp, de 7,48%, para pressionar a petrolífera para não distribuir dividendos.

Após o partido ter criticado no site esquerda.net a proposta do board da EDP de dividendos num valor superior ao do lucro de 2019, Catarina Martins sublinhou esta quarta-feira que os quase 700 milhões de euros a distribuir aos acionistas equivale a dez anos de tarifa social energética disponibilizada pela empresa. “Não faz sentido continuarmos a distribuição de dividendos milionários nas grandes empresas e impedirmos apoios sociais às famílias que perderam rendimentos”, disse.

Se a proposta do board liderado por António Mexia for aprovada na AG, a estatal chinesa CTG, mesmo após ter reduzido a participação na EDP depois do fracasso da OPA para os atuais 21,47%, deverá receber dividendos num total de 149 milhões de euros.

Setor mais relutante

As utilities são consideradas como dividend plays, com os investidores escolherem esses títulos pois dão retorno regular num modelo de negócio com bastante previsibilidade. Nessa perspetiva, os analistas dizem que as empresas do setor poderão ser das mais relutantes em tocar nos dividendos. A espanhola Iberdrola, por exemplo, referiu a 3 de abril que vai distribuir um dividendo de 0,40 euros por ação, apesar da Covid-19, e anunciou ainda esperar que o lucro de 2020 seja superior ao do ano passado e que o dividendo irá crescer “na mesma linha”.

No Grupo EDP, a história desta ‘época’ de dividendos apresenta, no entanto, dois exemplos distintos. Os acionistas da EDP Renováveis a 26 de março aprovaram a proposta do pagamento de um dividendo de 8 cêntimos por ação relativo a 2019.  Dias antes, no entanto, o Conselho de Administração da EDP Energias do Brasil, na qual a EDP Energias de Portugal tem 51%, anunciara que “tendo em vista o atual cenário de disseminação da Covid-19 e dos impactos esperados para os negócios”  decidira propor à assembleia geral distribuir dividendos de 353,5 milhões de reais (perto de 64 milhões de euros), abaixo dos 604,8 milhões de reais (109 milhões de euros) anunciados antes.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.