O Presidente americano resolveu ameaçar a União Europeia com uma guerra comercial. A União, que seria a primeira potência económica pelas estatísticas, enfrenta a clássica dificuldade de dar uma resposta coordenada. Como a união faz a força, a resposta é fraca. Confesso que não me preocupa não beber uísque americano; também sou incapaz de apreciar conduzir uma Harley; mas não gosto da ideia de ter de prescindir das Levy’s.

A Europa está ferida desde antes do Brexit, e ainda mais depois das eleições italianas – o populismo renasceu em força, continuando a deriva do continente. Até aqui, os riscos mais sérios estavam contidos, pois foi em países do outro lado da cortina de ferro que as coisas se estavam a concentrar. Apesar da situação em Espanha, foi na Polónia, na República Checa, na Eslováquia, na Hungria, na Bulgária e na Roménia que vimos os casos mais complexos, incluindo ataques à independência dos tribunais, à liberdade do ensino superior e à liberdade de imprensa, apesar dos avisos da Comissão Europeia e até da ameaça de sanções (à Polónia). Nestes países os sentimentos nacionalistas e populistas são marcados, o que não ajuda o processo de construção europeia e mina uma preocupação que era comum às políticas comunitárias – a coesão.

Acrescem a este quadro as tentativas de desestabilização do espaço europeu de que são exemplo as queixas de Theresa May sobre o papel da Rússia no referendo de 2016. As eleições italianas complicaram este cenário, pois revelam uma Itália – um dos países fundadores da União – onde a primeira força política é um partido populista que, na campanha eleitoral, prometeu repatriar refugiados, um rendimento universal de 780 euros, reduzir os impostos, revogar 400 leis num ano e melhorar as relações com a Rússia.

Se os progressos dos populistas foram travados em França graças a Macron, com o pior a ter sido evitado na Holanda e na Alemanha (onde a AfD é agora o maior partido de oposição), a Itália abriu a porta aos populistas no núcleo histórico da União. É difícil imaginar, com a Rússia empenhada em dificultar-nos a vida, como conseguiremos conciliar as agendas dos países da Europa de Leste membros da União e duma Itália di Maio-Grillo com a França de Macron e uma Alemanha mais europeista. Só faltava uma guerra comercial!

O “tio Donald” começou por um muro. Quando passou à política fiscal, os riscos de subida da taxa de juro tornaram-se relevantes para a Europa. Agora, com uma guerra comercial em perspetiva, aproxima-se o fim da ordem internacional velha de décadas a que nos habituámos. Com uma União Europeia órfã e desunida, numa próxima reunião do G8 só falta ouvirmos Putin perguntar-nos quantas divisões tem a União.