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Falta um sistema comum de garantia de depósitos na União Bancária, realça Carlos Costa

Carlos Costa sustentou que falta à União Bancária a ‘criação’ de um terceiro pilar – o sistema comum de garantia de depósitos. O governador do Banco de Portugal alertou ainda para o esvaziamento das garantias democráticas nos processos de decisão no seio da União Europeia e apelou aos líderes europeus para clarificarem futuro do rumo europeu na próxima Cimeira do euro.
3 Dezembro 2018, 17h13

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, disse que o processo de integração da União Económica e Monetária (UEM) está incompleta porque falta um sistema comum de garantia de depósitos, no âmbito da União Bancária. “A sua ausência deixa a arquitetura da União Bancária desequilibrada, colocando riscos para a estabilidade financeira e contribuindo para perpeturar a ligação entre bancos e soberanos”, disse Carlos Costa, na sua intervenção de abertura do Seminário Jurídico do Banco de Portugal, que se realizou esta segunda-feira, em Lisboa.

Efetivamente, apesar de os dois primeiros pilares da União Bancária estarem implementados e operacionais – o Mecanismo Único de Supervisão, desde novembro de 2014, e o Mecanismo Único de Resolução, desde janeiro de 2016 – ainda falta o terceiro pilar: um sistema comum de garantia de depósitos.

Carlos Costa abordou ainda a existência de uma “assimetria” entre quem tem poder para decidir sobre as instituições bancárias (a UEM) e a quem incumbe zelar pela estabilidade financeira (os Estados membros). “As autoridades nacionais permanecem responsáveis pela estabilidade financeira, mas a sua atuação está condicionada pelas decisões em matéria de supervisão, de resolução e de aplicação das regras de concorrência que são tomadas no plano europeu, defendeu.

Sobre a promoção da estabilidade macroeconómica, Carlos Costa considerou que “falta um orçamento centralizado” que poderia ainda ajudar “a fazer face a choques económicos assimétricos e a flutuações cíclicas”.

Antes de abordar o tema da União Bancária, o governador do Banco de Portugal teceu considerações sobre “a falta de ajustamento do quadro institucional europeu” no âmbito do projeto de integração europeia da UEM, cuja falta de aprofundamento acarreta “riscos significativos”.

Tratado da União Europeia deveria assegurar responsabilização democrática e garantir tomadas de decisão mais transparentes

Carlos Costa abordou a tomada de decisões no quadro da UEM e elogiou o método comunitário, mas assinalou que este tem vindo a ser suplantado pela via da cooperação reforçada e pela via intergovernamental. Segundo o governador, o método comunitário que, sustenta, deve ser salvaguardado, “resulta em decisões que representam segurança jurídica para os agentes económicos e para os cidadãos em geral, quer pela atuação da Comissão [Europeia] enquanto guardiã do Tratado [da União Europeia], quer pelo papel do Tribunal de Justiça da União Europeia no escrutínio e garantia do respeito pelo direito europeu”.

No entanto, as tomadas de decisão pelas vias da cooperação reforçada e intergovernamental põem em causa as soluções do método comunitário. No primeiro caso, embora a via da cooperação reforçada permita “contornar posições de bloqueio”, o governador do Banco de Portugal sustentou que não permite institucionalizar “aquilo que não deveria ser institucionalizado”. Já sobre a via intergovernamental, Carlos Costa considerou que “resulta do facto de ainda não se ter enfrentado o problema de fundo que é a ncessidade de transpor para as sucessivas etapas do processo de integração o mesmo método de decisão utilizado à partida”.

No quadro do Conselho, por exemplo, esta necessidade de funcionar de forma diferente em estádios diferentes de integração traduziu-se na criação do Eurogrupo no final de 1997. O Eurogrupo foi criado, de forma ad hoc, para permitir que os ministros das finanças dos Estados-Membros da área do euro pudessem discutir entre si as questões decorrentes das responsabilidades partilhadas relacionadas com o euro. No entanto, o Eurogrupo – que tem natureza informal e funciona no contexto do ECOFIN como modo de legitimação – não resolve o problema de fundo, que é a governação da área do euro. Na mesma linha, assistimos – em 2008 – ao nascimento da chamada Cimeira do Euro, a nível de Chefes de Estado ou de Governo.

“Sendo as decisões tomadas em sede intergovernamental – sem o enquadramento institucional comunitário – o processo decisório é menos escrutinado e a implementação está sempre dependente da vontade dos Estados membros signatários, alertou o governador do Banco de Portugal.

Em face do exposto, Carlos Costa sustentou uma terceira via que conferisse ao Tratado da União Europeia “flexibilidade necessária para transpor as mesmas regras para os diferentes estágios [da integração europeia]e, por essa via, garantir que o proceso de decisão é transparente e a responsabilização democrática está assegurada.

Carlos Costa desafia Cimeira do euro a aprofundar a UEM para evitar crises futuras

No próximo dia 14 de dezembro, realizar-se-á a Cimeira do euro e o governador do Banco de Portugal apelou à capacidade de compromisso e vontade negocial dos líderes europeus para clarificarem o rumo do projeto europeu. “Caso contrário, a resolução dos problemas que entravam o funcionamento equilibrado da União Europeia continuará a ser adiada, tornando-a vulnerável a potenciais crises futuras”, alertou Carlos Costa.

A Europa é atualmente uma realidade mais complexa e heterogénea do que no início da construção da UEM, com um maior número de Estados-Membros e uma menor partilha do objetivo e do sentido dessa construção. Ao mesmo tempo, está dotada de um quadro institucional que não se ajustou ao evoluir do processo de integração. (…) Nos tempos de divisão que atravessamos e à luz da evolução das negociações de dossiers cruciais para a UEM – como seja o da conclusão da União Bancária – devo confessar o meu ceticismo quanto aos avanços concretos que poderão resultar da Cimeira.

 

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