Estarmos em sintonia com os outros está longe de ser tarefa fácil. Aliás, é difícil, e, por vezes, é mesmo muito difícil, independentemente da vontade que nos anime. É que somos demasiado complexos, somos feitos de camadas diferentes, trazemos uma bagagem imensa de histórias que, por sua vez, dão azo a expectativas, e fazer com que tudo se alinhe de certa forma, como nos astros, para um final feliz, é complicado. E somos assim mesmo quando parecemos lineares ou unidimensionais, sem densidade. Daqueles que dizemos, “ele é mesmo assim”. O mais certo, porém, é ser um “sim, mas…”.

Por isso, esse alinhamento necessita, amiúde, de uma ajuda de fora, um estímulo externo que funciona como diapasão e nos coloca ou ajuda a colocar no comprimento de onda correto. E todos conhecemos e participámos neste tipo de situações, de certeza absoluta. É isto que acontece, por vezes, numa sala de cinema, quando somos absorvidos pelo que se passa na tela, de tal modo que quase fazemos parte da história; mas só quase, por nós estamos deste lado e não temos como interagir com quem está do outro. Também se passa num qualquer evento desportivo, quando a tensão segue em crescendo, à medida que o tempo passa e a ansiedade se acumula; principalmente naquelas situações em que os jogadores se equivalem ou as equipas vivem uma rivalidade pacientemente alimentada; ou quando o resultado do jogo, seja ele qual for, é mesmo uma incógnita e quem a ele assiste rói as unhas até ao sabugo ou mesmo até aos cotovelos a cada episódio.

Mas, mesmo assim, não há uma sintonia completa, nem entre os que assistem, porque torcem por atletas ou cores diferentes, nem entre quem está no jogo e nós, os espetadores; porque, verdadeiramente, não participamos, assistimos a um espetáculo que se desenrola.

Tudo isto é verdade, menos quando falamos de música. Aí sim, a sintonia consegue ser perfeita, entre quem toca e canta e quem assiste e também canta e entre todos os que assistem, porque têm em comum aquela música, que, mesmo representando vivências diferentes, se torna num ponto de união.

Há pouco tempo, senti isso mesmo no concerto dos Queen, em Lisboa. Houve uma ligação real entre todos, porque estávamos juntos naquele momento, numa união completa ditada pelos acordes, a cantar a plenos pulmões; nós na assistência, nós no palco, porque não percebíamos onde acabava uma coisa e começava a outra, nem queríamos saber quem eram exatamente os artistas e quem eram os espetadores. Dizem que, nesses dias, os Queen também lá estiveram; não que tivéssemos notado, entretidos que estávamos a cantar.