A greve dos motoristas de matérias perigosas leva-nos para um tema propositadamente esquecido: a política de subsidiação das carreiras profissionais. O esquema começa por ser aliciante porque trabalhadores pagam menos IRS e menos 11% de Segurança Social (TSU), e as entidades patronais pagam menos 34,5% de TSU. Mas o reverso da medalha é simples de perceber.

No futuro, as reformas serão contabilizadas com base num ordenado base e os subsídios não contam. Além disso, em caso de baixa ou despedimento aparecem as dores de cabeça com as fracas compensações.

As acusações de ambos os lados são, contudo, escusadas. O culpado é sempre o contrato coletivo de trabalho, quer se trate dos motoristas, da banca ou dos serviços. Na banca, por exemplo, ainda há uma dezena de anos havia sete ou oito subsídios, desde turno, horário diferenciado, fim de semana ou subsídio de caixa, entre outros. Na recente quezília dos motoristas circulou profusamente o exemplo de uma folha de pagamento com um salário base acima dos 600 euros e mais 1.200 euros de subsídios!

Não será por isso de estranhar que, na Europa, Portugal seja o segundo país onde o salário médio mais se aproxima do salário mínimo. Isto significa pobreza e miséria entre a classe média. Por outras palavras, o segmento da população que cria dinâmica desapareceu porque não existe grande volume de salários elevados.

Globalmente, estes acordos que sempre agradaram a sindicatos e entidades patronais – rendimentos líquidos mensais mais elevados mesmo à conta da inclusão de subsídios que são uma “fuga” ao IRS e à TSU – são hoje, à luz do entendimento comum, criminosos. E são sistematicamente confundidos com pagamentos “por baixo da mesa”, mas isso não existe porque os subsídios são legais e assumidos pelo Estado como tal.

Por outro lado, este tema, que reaparece com o novo sindicato dos motoristas de matérias perigosas, já existia no tempo em que todos se agrupavam à volta de um sindicato da CGTP e nada foi dito. Aliás, ninguém se “ralava” com o tema porque aparentemente todos – menos o Estado – saiam beneficiados. Com o tempo os trabalhadores começaram a perceber o engodo em que tinham caído e as entidades patronais foram “encostadas às cordas” ao ajustarem o preço dos serviços de acordo com um custo que é fictício.

Ora, se houve pagamentos ilícitos e hoje o Fisco equipara a fuga fiscal à lavagem de dinheiro em termos de sanções, foram legalizados por acordos coletivos de trabalho. Mais. Se há culpados, são tanto os que pagaram como aqueles que receberam. E lembramos que a Segurança Social está deficitária, assim como o Estado que recebe menos IRS. O reverso será, possivelmente, o aumento dos custos dos fatores de produção, um valor líquido mensal menor para os trabalhadores e menos resultado líquido nas empresas.

Voltando ao tema de fundo: as conveniências de alguns prejudicam todos, e é preciso repor a equidade e a justiça social e não prejudicar a receita fiscal.