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Governo do PS assume o todo: Bloco e PCP reivindicam as suas “marcas”

A caminho das eleições de 2019, os partidos procuram garantir dividendos políticos. BE e PCP reclamam autoria de medidas e tencionam manter pressão sobre o PS na fase da especialidade.
17 Outubro 2018, 11h00

A confirmar-se o défice de -0,2% do PIB no próximo ano, ao mesmo tempo que aumenta as pensões e os salários da Administração Pública, ou reduz o défice tarifário e as propinas no Ensino Superior, o Orçamento do Estado para 2019 (OE2019) dificilmente poderá não ser interpretado como uma vitória política do Governo liderado por António Costa. Por um lado, assegura a consolidação orçamental – “o melhor défice em 40 anos”, como enalteceu ontem o ministro das Finanças, Mário Centeno. Por outro lado apresenta “boas notícias”, isto é, medidas populares, em ano de eleições europeias, regionais e legislativas.

A oposição critica o “eleitoralismo” do OE2019, mas o Governo acena com um défice quase nulo. Mais problemáticos são os números do investimento público, da carga fiscal e da dívida pública, conferindo uma maior margem de manobra aos argumentos da oposição, mas Centeno aponta para o retrato geral que é positivo (e ontem manifestou “perplexidade” ao ser questionado sobre matérias específicas). Está assim lançada a campanha eleitoral de 2019: o retrato geral do Governo do PS contra os detalhes esmiuçados pela oposição. Ao que acresce a questão da “credibilidade”, também invocada por Centeno, em contraposição aos tempos “em que Portugal não cumpria as metas” e os governos apresentavam sucessivos orçamentos retificativos.

Medidas como a criação do passe social único em Lisboa e Porto, a diminuição do valor máximo das propinas e a redução da fatura da eletricidade, entre outras, são bastante populares e deverão ajudar o PS a alcançar os seus objetivos eleitorais. No entanto, a autoria das medidas positivas também é disputada pelos partidos que apoiam o Governo no Parlamento. Desde logo, o PCP que já sinalizou várias “marcas” da sua influência na estruturação do OE2019: aumento mínimo de 10 euros nas pensões de reforma; manuais escolares gratuitos até ao 12º ano; fim da penalização do fator de sustentabilidade; eliminação do regime de coleta mínima obrigatória do PEC (Pagamento Especial por conta); redução do custo da energia; e aumento do abono de família entre os três e os seis anos de idade.

Por seu lado, o BE também reivindica várias medidas: teto máximo das propinas reduzido em 212 euros; fim do corte de sustentabilidade em 2019 para todas as pessoas com 40 anos de desconto aos 60 de idade; redução do IVA dos espetáculos para 6% (excluindo tauromaquia); corte nos custos da energia em 5% em 2019 e 2020; e alargamento do subsídio social de desemprego.

A redução da fatura da eletricidade é reivindicada pelo BE e pelo PCP, mas neste caso os bloquistas deverão obter mais dividendos eleitorais, na medida em que se trata de uma das matérias prioritárias da sua agenda política em toda a legislatura. Aliás, o alargamento da Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE) aos produtores de energias renováveis com “regimes de remuneração garantida” equivale, na prática, a uma versão da “taxa sobre as renováveis” que o BE tentou aprovar várias vezes no Parlamento. Ainda que se trate de uma versão minimal, prevendo-se uma receita diminuta, inferior a 30 milhões de euros, para os bloquistas não deixa de ser uma importante vitória.

Estratégia dualista

Os ganhos políticos terão que ser repartidos entre o PS, o BE e o PCP, até porque disputam eleitorado que pode flutuar entre os três partidos. Enquanto o PS tenta conquistar uma maioria absoluta nas legislativas do próximo ano, o BE e o PCP procuram evitar essa maioria absoluta e manter a respetiva influência nas políticas governamentais. E na medida em que não integram o Governo, cingindo-se ao cumprimento de acordos bilaterais de incidência parlamentar, os bloquistas e os comunistas desenvolvem uma estratégia dualista: apoiam o Governo no que conseguem fazer aprovar; criticam o Governo no resto.

A posição oficial do PCP em relação à proposta de OE2019 é, nesse sentido, paradigmática. Os comunistas salientaram “duas observações gerais” sobre o documento: “a primeira, para assinalar que esta proposta incorpora um conjunto de medidas de sentido positivo que correspondem a novos avanços e progressos na reposição e conquista de direitos, em resultado da contribuição e intervenção do PCP no exame comum e da luta dos trabalhadores; a segunda, para sublinhar que a proposta de Lei do Orçamento do Estado é moldada por opções estruturantes da responsabilidade do Governo do PS que limitam, e em diversos planos impedem, a resposta plena a questões centrais indispensáveis para assegurar o desenvolvimento económico e social do país”.

Da parte do BE, falou ontem a deputada Mariana Mortágua. “Se este Orçamento reflete tudo aquilo que o BE queria? Não reflete”, vincou. “O BE irá reunir a Mesa Nacional, no próximo sábado, para decidir o voto sobre o Orçamento do Estado. Portanto, é apenas justo que vos diga que têm de esperar por essa reunião, mas também vos digo com toda a clareza que, para quem batalhou tanto para negociar este documento na generalidade, ver incluídas medidas tão importantes como a redução de propinas, a redução do IVA para o setor dos espetáculos ou o aumento das pensões, é apenas natural que queiramos continuar essa luta na especialidade e batalhar por novas e melhores medidas”, explicou a bloquista.

Ou seja, a luta continua na especialidade. Onde poderão ressurgir questões como o investimento público ou o aumento dos salários da Administração Pública. Sobre o investimento público, Centeno disse ontem que se trata de um “investimento invisível”, diferente do que se verificou nas últimas décadas. “Não é um investimento em obras públicas. Ocorre em muitos hospitais, centros de saúde e escolas. É deste investimento que o país precisa. A caracterização do investimento público já não é aquela a que estávamos habituados”, explicou. Quanto aos aumentos salariais da função pública, salientou que representa “um esforço enorme”, com um valor de 50 milhões de euros. “O Orçamento do Estado prevê para a Administração Pública um aumento do salário médio superior a 3%. É o maior incremento salarial na Administração Pública portuguesa na última década. É um esforço enorme do Orçamento”, declarou.

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