Após ter derretido mais de 300 mil milhões de euros em nove anos, sofrer três intervenções financeiras e duas reestruturações com perdão de dívida privada, a Grécia termina, com sucesso, nas palavras de Mário Centeno, o seu programa de ajustamento. Se esta descrição dantesca equivale a um sucesso, então o programa de Portugal foi um exemplo para o mundo e o anterior governo deveria ter continuado a governar.

Nada disso se passou, o que nos leva à conclusão que, infelizmente, os interesses pessoais e partidários falaram mais alto. Desta vez parece ser a ambição de Mário Centeno em emigrar definitivamente para um cargo na Comissão Europeia. A mensagem ao povo grego durou uns penosos 69 segundos e poderia muito bem dirigir-se a nós, bastaria substituir a palavra Grécia por Portugal e este vídeo seria uma verdade em 2014, quando conseguimos uma saída limpa, muito criticada pelos actuais responsáveis.

Regressando à Grécia, verificamos que a dívida pública atinge os 280 mil milhões de euros, ou 180% do PIB. Considerando as taxas de juro reduzidas, serão precisos 42 anos para baixar para os 100%. Resta saber se, nesse período, não haverá uma única recessão e se o povo grego conseguirá trabalhar para pagar os erros do passado, principalmente se pensarmos que estas projecções só serão atingidas no caso de um superavit primário de 3,2% durante dez anos consecutivos, algo que nenhum país da zona euro conseguiu até hoje.

Ou seja, os responsáveis europeus acreditam em milagres. Após dez anos de subidas de mercado e de crescimento generalizado da economia mundial, pensar que teremos outra década de crescimento sem incertezas, sem crises, é brincar com a pouca credibilidade que a Europa ainda tem junto dos seus cidadãos. Basta pensar em Itália e nos problemas do seu sector financeiro, no proteccionismo ou na tempestade que assola os mercados emergentes para percebermos que é uma questão de tempo até a zona euro ser novamente colocada em causa.

No entanto, a Grécia foi um exemplo de coragem na forma como defendeu o seu sistema financeiro. Apesar de restrições à movimentação de capitais, nenhum banco grego faliu nem foi sujeito medidas de resolução, o que não deixa de ser impressionante, sobretudo com taxas de incumprimento na ordem dos 40%.

Os ministros das Finanças da zona euro gostariam de acreditar que desta vez é diferente. Na verdade, tentam apenas disfarçar a sua incapacidade de compreender os novos desenvolvimentos ou de tomar decisões difíceis. Todos sabemos que a dívida grega é impagável. É uma questão de tempo até ao perdão ou outra crise que ditará definitivamente o futuro da Grécia.

Os portugueses têm pago com sacrifícios os devaneios e ambições de alguns que vêem na Europa a sua salvação, longe do povo que os elege, mas junto da elite que governa. Este rastilho, já aceso e comum a outros países, levará a nacionalismos, a proteccionismos e à hegemonia dos EUA sobre a Europa. À falta de seriedade, resta-nos pensar em milagres.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.