Quando a banca nacionalizada criou a SIBS e a marca Multibanco na primeira metade dos anos 80 do século passado, seria difícil prever que um dia a empresa e as plataformas de pagamentos detidas pelos bancos enfrentassem o atual dilema. A plataforma cresceu com condições de eficiência que não são possíveis de repetir: volume, fidelidade, investimento e estabilidade de capital baseada em acionistas/clientes, todos com centros de decisão em Portugal, nessa altura.

Estas condições foram aproveitadas, criando uma rede de ATM de grande capilaridade e com funcionalidades diferenciadoras em relação aos congéneres, e uma rede de POS baseada, essencialmente, num esquema (MultiBanco) nacional fechado, com custos controlados para os bancos do sistema, que funciona tendo por base o cooperativismo. Estas unidades de produção/cooperativas têm vantagens e problemas: inexistência de diferenciação de serviço para clientes, risco de os clientes mais inovadores pagarem o investimento de que outros beneficiam, mas também custos baixos. A velocidade cooperativa é a do mais lento dos cooperantes.

Os portugueses, por seu lado, perceberam a conveniência e tornaram-se dependentes desta plataforma. Os paradigmas mudam, por vezes radicalmente. Mas as mudanças podem ser antecipadas. Em Portugal não foram.

Acontece que as alterações referidas ocorrem neste período histórico de “tempestade perfeita” na banca, particularmente em Portugal. No período de maior e acelerado ritmo de inovação suportada pela tecnologia, o sistema tem de lidar com níveis de regulação esmagadores, enormes necessidades de capital, margens financeiras diminutas, acionistas insatisfeitos, necessidades de redução de custos, novas formas de relacionamento com os clientes, encerramento de balcões (e redução ATM daí resultante), NPL, novos players não bancários concorrentes (fintech ventures, gigantes tecnológicos, redes sociais), etc.

Muitos mercados na Europa anteciparam esta evolução e impulsionaram o crave-out nestas cooperativas, conseguindo vender as suas participações, com valorizações maiores do que a generalidade das transações em outras indústrias (entre 9 a 13 vezes o EBITDA), garantindo que os serviços sejam desenvolvidos por não concorrentes com capacidade de investimento. Portugal não o fez.

Ao legado de referência nesta área, Portugal passou a acrescentar um risco estratégico de particular relevância. Vejamos. Foi anunciada a procura de um parceiro no início do verão passado; foi iniciado um processo com advisors internacionais especializados; ao fim de nove meses, o Santander anuncia que não vende (porque acredita na empresa). O BPI/La Caixa, após longas negociações, assinou um contrato (o primeiro, ao que parece) com a SIBS – tendo a duração de três anos, sem penalidade de saída. Claro que se tentou melhor, mas, provavelmente, não foi possível.

Por outro lado, as grandes disrupções com acrónimos como Inteligência Artificial aplicada aos serviços financeiros, Data Analitics, Everything as a Service, Machine Learning, Blockchain, IT Unbound, entre outros, têm como denominador comum um investimento brutal, uma mudança radical na espinha dorsal dos sistemas de suporte à relação com os clientes e operativas.

Temos assim cooperantes relevantes que podem sair a qualquer momento, ao passo que para outros não há racional económico para investirem sozinhos e existem, ainda, os que não vão querer suportar os investimentos necessários mais do que uma vez. Alguns dizem que não à pressa, mas o valor acionista decresce diariamente. Este não parece ser o tempo das cooperativas.