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Isabel da Silva Mendes: “Ordem dos Advogados está sem voz, silenciosa, distante”

A advogada da SPS e vogal do Conselho de Deontologia de Lisboa oficializou esta quinta-feira a sua candidatura a bastonária. Em entrevista ao Jornal Económico, refere que pretende alterar os Estatutos da Ordem e dar maior incidência à deontologia, publicidade, proteção de privacidade, inteligência artificial e regulação de plataformas digitais.
16 Maio 2019, 20h00

A advogada Isabel da Silva Mendes oficializou esta quinta-feira a sua candidatura a bastonária da Ordem dos Advogados (OA) para o triénio de 2020-2022. Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Lusíada de Lisboa e advogada da SPS desde 2015, Isabel da Silvas Mendes pretende negociar “urgentemente” a atualização dos valores tabelados para pagamento de honorários no apoio judiciário e combater de forma “intransigente” a procuradoria ilícita. Em entrevista ao Jornal Económico, a atual vogal do Conselho de Deontologia de Lisboa traça as linhas gerais da sua corrida à liderança da OA, critica o silêncio desta estrutura e diz que os profissionais da advocacia merecem uma Ordem “transparente”.

Candidata-se a bastonária porque pretende “pôr ordem na Ordem”. Em que sentido?

A administração, a justiça, não existe sem o advogado. E a Ordem não tem razão de ser se continuar distante do advogado, amorfa, silenciosa, inativa. E é precisamente esta realidade que pretendemos inverter.

Quais são as suas prioridades?

Quero estar onde estão os advogados, ouvir as suas preocupações, recolher as suas propostas, sensibilizar para uma maior interação destes com a Ordem, alterar os Estatutos da Ordem dos Advogados com maior incidência em temas como deontologia, publicidade, proteção de privacidade, inteligência artificial ou regulação de plataformas digitais. Irei sempre bater-me pela defesa intransigente dos direitos dos Advogados e das suas condições de vida; porque quero devolver-lhes a confiança perdida. Quero também preparar os Advogados para as novas formas e matérias de Direito que as novas tecnologias e a Inteligência Artificial irão levantar. E, consequentemente, outra das prioridades é negociar urgentemente a atualização dos valores tabelados para pagamento de honorários no apoio judiciário. Outro tema preponderante para nós será o combate acérrimo à procuradoria ilícita.

Defende que vive in loco os problemas dos advogados. Quais são as principais dificuldades da classe?

Defendo que vivo por dentro os problemas dos advogados, porque é um facto. Tenho mais de 30 anos de exercício, em prática individual e em prática societária, e muitos destes no apoio judiciário. Sou advogada de tribunal, dei aulas em diferentes instituições de ensino, sou membro do júri nas provas de agregação dos estagiários há vários anos, entre outras. Por tudo isto, conheço bem a realidade da Ordem e os anseios de quem chega, o entusiasmo e o brilho nos olhos de quem acredita no ser Advogado. E, acima de todos os outros, considero que as principais dificuldades da classe atualmente são a falta de trabalho, de dinheiro, de segurança, de respeito e de representatividade.

Como caracteriza a Ordem dos Advogados neste momento?

É uma Ordem sem voz, silenciosa, distante dos advogados, demasiado institucionalizada. E é muito por este motivo que um dos meus principais objetivos, vencendo as eleições, passa exactamente por aproximar a Ordem dos Advogados e transformá-la em parte ativa na solução dos seus problemas do dia-a-dia.

Os outros candidatos têm apontado alguma inércia e afastamento aos advogados. É verdade?

Quando falamos com os advogados, estes perguntam “para que existe a Ordem, senão para cobrar quotas e intentar processos disciplinares?”. Isto é necessário, mas não esgota o objeto e fim da Ordem dos Advogados. Com 93 anos de existência, os advogados merecem que a sua Ordem seja próxima, proativa, rigorosa, transparente, inovadora e que justifique a sua existência.

Também vai prescindir do ordenado na OA?

Não concebo que o bastonato seja exercido em part-time. A exigência das funções determina dedicação total, exclusiva, nem pode ser de outro modo. Não pode haver desculpas. Portanto, não irei prescindir da remuneração adequada ao exercício das funções.

Antevê uma segunda volta nas eleições de novembro, à semelhança das últimas votações?

Tendo em conta o número de candidatos que já se posicionaram, e sendo certo que os Advogados estão ainda mais desmotivados, ao dia de hoje parece-me muito provável que a segunda volta seja decidia entre mim e outro candidato, que, por todos me merecerem consideração institucional, não revelo o nome.

Guilherme Figueiredo admite que possa ser necessário alterar a Constituição para proteger vítimas de violência doméstica. Concorda?

É pressuposto da nossa candidatura o princípio da igualdade. E este pressuposto refere-se ao advogado enquanto profissional, masculino ou feminino, em prática individual ou societária. Pela sua intervenção, a OA deve estar na primeira linha do combate a todas as desigualdades e violências, incluindo a doméstica. Mas considero que há muito mais a alterar antes da Constituição da República Portuguesa. Como já referido, é urgente a alteração dos Estatutos da OA, cuja lei se mantém no essencial com os princípios de 2005. A revisão de 2015 teve apenas como objetivo a sua adequação ao disposto sobre as Associações Públicas e Profissionais.

Quando é que Portugal terá uma lista de advogados área da violência doméstica e de género? Estava previsto começar a formação especializada para advogados em outubro. Houve desenvolvimentos?

Este é o exemplo do que acontece atualmente no seio da Ordem, porque não lhe sei dar uma resposta concreta sobre esse tema. Nenhuma informação circula sobre isso, as discussões que deviam ser prévias não existem, a informação e participação são nulas.

A Autoridade Tributária e Aduaneira teve instruções para cobrar dívidas de quotas em atraso na Ordem, que adiantou prever receber sete milhões de euros desta forma. O processo avançou?

O processo não avançou, esta “promessa” foi um fiasco, e pouco se recebeu. Mas os valores são indicadores do estado em que os advogados se encontram: sem dinheiro para cumprirem com as suas obrigações, isto porque, sendo os Advogados pessoas de bem, se os atrasos acontecem é porque estes não têm como pagar.

A revisão do Estatuto dos Magistrados Judiciais, nos termos em que está, parece-lhe adequada?

Aguardemos. A seu tempo me pronunciarei.

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