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José Neves: “Vamos contratar várias centenas de pessoas em Portugal em 2018”

A plataforma de retalho online Farfetch quer ser líder em todos os grandes mercados de moda de luxo. A Ásia vai ser o grande motor, enquanto uma entrada em bolsa é o destino natural, explica o CEO.
  • Cristina Bernardo
12 Novembro 2017, 18h00

Qual é a motivação da Farfetch em estar presente na Web Summit? É um exercício de marketing geral ou há alguma novidade concreta que vão anunciar?
Eu conheço o Paddy Cosgrave há muitos anos. Lembro-me de ir à Web Summit em Dublin quando era uma coisa pequeníssima, com apenas algumas centenas de pessoas. Agora tornou-se neste mega-evento e sendo em Portugal é um motivo de enorme orgulho para todos nós portugueses, para todo o ecosistema das startups portuguesas e por isso para nós ter aqui uma presença é obrigatório, um imperativo, apoiar a Web Summit e apoiar o ecosistema português também.

A Farfetch demonstra um crescimento tão rápido que é quase impossível acompanhar. Quais são os últimos números?
Vendemos mais de duas mil marcas, temos mil empresas que usam a plataforma, 750 dessas empresas são boutiques, portanto são lojas multi-marca, 250 são as grandes marcas mundiais como a Gucci, Valentino, Prada, etc. E temos mais de dois mil colaboradores em 11 escritórios. São estes os números principais.

Qual é a rota de crescimento prevista? Onde é que é que está o seu foco, é aumentar o número de marcas, de clientes, de diversificar o modelo?
Temos uma missão de internacionalização muito ambiciosa, queremos estar em todos os grandes mercados mundiais de moda de luxo, sermos número um nesses mercados e esgotarmos esses mercados em todo o seu potencial. Temos 11 escritórios em todo o mundo, 11 línguas, estamos com uma presença muito forte na China, onde fechamos uma joint-venture com a JD.com de 400 milhões de dólares em julho, e que já está a dar frutos. A China está a crescer mais de 100% ao ano, a triple-digits como costumamos dizer, e toda a zona da Ásia vai ser sem dúvida o grande motor da Farfetch.
Mas continuamos a ter muito sucesso nos Estados Unidos, que é o nosso maior mercado, no Brasil e em toda a América Latina, somos o único player que está presente na América Latina, na própria Rússia e obviamente na Europa. Estamos a atacar por todas as frentes e muito globalizados.

Como marketplace, a Farfetch tem o desafio de, por um lado, aumentar a procura e por outro criar a oferta a uma escala tão grande. Como é que a empresa gere este desafio?
Essencialmente, temos equipas dedicadas a encontrar as melhores lojas multi-marca em todo o mundo, estamos em 40 países desde Austrália, Japão, Médio Oriente, todos os países da Europa, América do Norte e do Sul, e essa equipa que faz o scout das melhores marcas e multi-marcas para se juntarem à plataforma. Isso é do lado do supply. O lado do demand está ligado à estratégia de internacionalização da empresa, com a expansão quer a nível de escritórios quer de línguas, quer de meios de pagamento, de serviço ao cliente e outros.

A Farfetch opera com três tipos de parcerias: as boutiques ou lojas, as grandes marcas e um serviço white label que é a empresa a criar os sites para outras marcas. Qual é a importância relativa dessas três formas de parceria e quais são as novidades?
Começámos como marketplace de boutiques, há dois anos e meio começámos a abrir às marcas terem diretamente acesso à plataforma. A Gucci foi uma das primeiras e lançámos com eles o serviço de entrega em 90 minutos em 10 cidades, que foi completamente revolucionário, não há nenhuma empresa que faça isso em cinco continentes. Está a correr com muito sucesso, tanto que estamos a alargar a todas as outras marcas. Entretanto já temos 250 marcas a vender diretamente na plataforma. Do grupo Kering temos a Gucci, a Balenciaga, a Christopher Kane e outras, do grupo Louis Vuitton temos várias marcas como a Givenchy e a Fendi e depois temos as grandes marcas independentes como a Valentino e a Balmain. Temos as maiores griffes mundiais a já usar a plataforma diretamente.

E o que é que eles procuram, é a vossa capacidade de ir buscar mercado, clientes e ao mesmo tempo a vossa expertise na logística?
A presença na Farfetch dá-lhes acesso a um público extraordinário. O nosso público tem 36 anos de média de idade, são os chamados millennials, altamente qualificados, portanto é o público-alvo destas marcas. A nossa transação média anda nos 700 dólares e completamente global. Não há muitos players que possam dar às marcas, mesmo às grandes marcas, este tipo de visibilidade. É o grande atrativo. Depois obviamente todo o serviço ao cliente, a logística, todos os aspetos de comércio electrónico associados à nossa plataforma facilitam muito a entrada no negócio.

Falamos ainda do white label. Estão a apostar muito nisso?
Sim, o white label, que chamamos o Farfetch Black & White, temos 10 marcas de luxo neste momento a usar a plataforma. Temos duas marcas do grupo Kering, uma marca do grupo Louis Vuitton e as outras são marcas independentes. Vamos pelo menos duplicar isso em 2018, vamos continuar a expansão.

Portugal é o centro operacional da Farfetch, com uma base perto de Guimarães, uma na Maia, um escritório em Lisboa. Qual é a importância de Portugal numa empresa que está a crescer tão rapidamente em vários continentes?
Portugal é fundamental. Eu digo sempre com muito orgulho que a Farfetch é luso-britânica de nascença portanto é como se tivesse uma mãe inglesa e um pai português ou vice-versa. Começamos desde o dia um com escritórios em Portugal e no Reino Unido, é em Portugal que temos a maior equipa, é em Portugal que se concentra a engenharia. É com muito orgulho que eu digo que a Farfetch é uma plataforma à escala global criada em Portugal, made in Portugal. Penso que é um caso único. E portanto é absolutamente estratégico continuarmos com esta presença aqui e penso que muitas empresas estão a descobrir Portugal como um país fantástico para desenvolver negócios na área da tecnologia.

Isso leva nos à próxima pergunta. Os outros players no retalho online de moda começam a mostrar sinais de interesse em vir para Portugal aproveitar essas vantagens operacionais. Como é que isto poderá afectar a Farfetch, por exemplo ao nível da captação de talento?
Vemos com muito entusiasmo e alegria que o nosso país está a ter sucesso, que está a atrair outras empresas e isto é bom. É bom porque nos obriga a nós e a outras startups portuguesas a tornar as nossas empresas locais fantásticas para se trabalhar. Eu dou o exemplo de uma iniciativa única no nosso setor que é o Farfetch for All. Todos os colaboradores da Farfetch têm stock options da empresa, seja qual for a função. Pode ser uma pessoa que trabalha na recepção ou um engenheiro ou um arquiteto de sistemas, todos nós teremos o benefício da criação de valor que estamos a fazer. Isso é muito raro mesmo no setor da tecnologia e então se falarmos no setor da moda não conheço empresas que façam isso. Esse tipo de incentivos são a melhor resposta ao aquecimento do mercado de trabalho.

Com essa garantia que a base operacional vai continuar em Portugal, como é que vê essa base a crescer em termos de criação de emprego?
Nós vamos contratar várias centenas de pessoas para o ano em Portugal. Não damos números oficiais, mas somos já 1.400 em Portugal e foram centenas de pessoas que se juntaram à Farfetch este ano e esse ritmo vai continuar. Vamos continuar a criar emprego no nosso país com muito vigor.

Queremos perceber também a estratégia financeira. A JD.com investiu cerca de 400 milhões de dólares em julho, no ano passado a empresa já tinha angariado 110 milhões de dólares numa altura em que era avaliada em 1.500 milhões de dólares. Quais são as necessidades de financiamento atualmente? Estão a planear uma nova ronda de captação de investimento?
Não temos necessidades de financiamento. O negócio com a JD foi um negócio mais estratégico que financeiro. Nós precisávamos de ter um parceiro estratégico na China e há dois grandes players. Há o bloco JD.com com a Tencent, que são os donos da WeChat. A Tencent tem 28% da JD, portanto no fundo a nossa parceria é também uma parceria com o WeChat e a Tencent. E depois há o Ali Baba. São dois grandes titãs, tal como existe por exemplo uma Google e um Facebook nos Estados Unidos.
Foi mais estratégico do que nós precisarmos de financiamento. Como referiu muito bem, já tínhamos feito um levantamento no ano anterior. Portanto estamos numa fase de investimento muito forte, vamos continuar a fazê-lo, é o que faz sentido, continuar a expandir de forma muito forte, sendo que estes negócios foram feitos de forma estratégica, mas obviamente também reforçam o balanço da empresa.

No ano passado, numa entrevista que deu durante a Web Summit, falou num IPO, numa entrada em bolsa, e que poderia considerar isso dentro de dois ou três anos. Com esse calendário isso quer dizer que agora daqui a um ou dois anos vamos ver esse IPO?
Nós não temos planos concretos para um IPO. Aquilo que eu disse sempre é que tendo como investidores empresas de private equity e venture capitalists, o destino natural da Farfetch nalgum ponto da sua vida será um lançamento em bolsa. Mas é apenas isso. Levou a muita especulação, mas por enquanto não há planos concretos.

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