As eleições americanas, ao darem a maioria na Câmara dos Representantes ao Partido Democrático, criaram uma situação de “governo dividido”: se os Republicanos, e em particular o presidente, controlam o Senado (o que lhe permite, por exemplo, nomear os juízes do Supremo Tribunal), já para legislar têm que procurar um equilíbrio com os democratas (que podem, por exemplo, abrir inquéritos sobre ações suas).

Isto faz pensar que Trump seria brando nas suas relações com os congressistas, e que faria uma gestão cuidadosa dos dossiês, dando mais atenção às posições dos democratas. Cruel engano, vamos ter mais do mesmo, com um presidente que tem agora um bode expiatório de eleição – pode permitir-se mais do que antes, pois qualquer fracasso passará a dever-se “aos outros”; para quem é especialista em fake news, também aqui é só mais do mesmo.

O primeiro sinal deste estado de coisas, e bem à moda do presidente, chegou pelo Twitter, o seu veículo preferido para falar aos americanos. No fim de semana, referiu-se ao congressista democrata Adam Schiff (que deverá ser o novo presidente do House Intelligence Committee e que terá dito que nessas funções irá apoiar Mueller na sua investigação sobre o envolvimento da Rússia nas eleições de 2016) pelo epíteto “little Adam Schitt”.

Isto acontece depois da Casa Branca e Trump passarem uma semana a queixar-se da falta de “decoro”, no seguimento da controvérsia com a CNN e o jornalista Jim Acosta, a quem a Administração revogou as credenciais e um juiz mandou devolver. Trump respondeu então com: “Decorum. You can’t just take three questions and four questions, and just stand up and not sit down. Decorum. You have to practice decorum.” Note-se o “you” no final, em vez de “we”, o que significa que Trump não se considera abrangido. De Schiff mereceu um “Wow, Mr. President, that’s a good one. Was that like your answers to Mr. Mueller’s questions, or did you write this one yourself?”

O segundo sinal respeita à cimeira anual do Fórum de Cooperação Económica Ásia-Pacífico, onde EUA e China se desentenderam e, pela primeira vez, foi impossível chegar a um comunicado final. O desacordo estaria na frase “we agreed to fight protectionism including all unfair trade practices”, que os chineses queriam ver suprimida. A delegação chinesa terá “invadido” o gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros da Papua-Nova Guiné, país onde se realizou a cimeira, e teve que ser retirada pela segurança. Fica claro daqui que a guerra comercial que se desenha entre EUA e China está para ficar, e que a probabilidade de algum tipo de acordo a poder evitar é praticamente nula.

Vamos continuar a ver o elefante na loja de porcelana, apropriado nos EUA pois o elefante é o símbolo do Partido Republicano, maior e mais feio que o burro democrata. Mas no resto do mundo – ou seja, da loja de porcelana – afinal, elefantes, são dois.