À hora de fecho desta crónica ainda não era conhecida a decisão instrutória do processo Marquês. Independentemente daquilo que for a decisão do juiz, é claro que a justiça vai ser questionada e, sobretudo, as instituições perderão credibilidade.

O principal arguido é o ex-PM José Sócrates e qualquer que seja o veredito quanto à decisão instrutória haverá críticas e análises. Quer seja indiciado, quer não, pelos vários crimes de que o Ministério Público (MP) o acusa, claramente o cidadão comum fará uma leitura daquilo que é a máquina da justiça. Aliás, o ex-PM foi condenado na praça pública, mas tudo se pode inverter.

O que esteve em causa ao longo dos últimos seis penosos anos foi algo sobre o qual se pode dizer que tudo correu mal. Desde logo, o MP foi gerindo o processo de forma política, houve maior interesse em difamar, mesmo muito do lado PS, que assim via uma forma fácil de evitar um novo candidato à Presidência da República.

Depois porque o mesmo MP não aproveitou o tempo para fazer uma investigação profunda. Neste tipo de processo prefere-se, e não sabemos quem, expor o caso à opinião pública e provocar uma condenação social. E, independentemente, de se gostar ou não da pessoa, aquilo que nunca deveria ter acontecido foi a violação do segredo de justiça. A investigação deveria ter sido feita no silêncio, mas havia a tentação e só dessa forma é que se compreende que estivessem jornalistas à espera da prisão do ex-PM no aeroporto.

Daqui concluímos que a preocupação mediática que marcou uma perseguição política pessoal foi a grande razão para a falha deste processo. E mesmo o tempo de investigação é algo absurdo. Não se faz a ninguém, mesmo não gostando do personagem. Esteve quase um ano preso e a investigação levou seis anos. E esteve preso para quê?

Seria para não prejudicar a recolha de provas, e se ao fim de um ano o MP não tiver conseguido boas provas, então deve limpar as mãos à parede.

Do nosso lado, e incluo alguns camaradas de profissão, estamos conscientes de que fizemos um trabalho jornalístico correto ao levantar suspeitas e contar histórias. Quem trabalhou mal foi a máquina da justiça. Independentemente da decisão de pronúncia ou não, o atual juiz leva com as culpas sociais, mas as figuras anteriores não ficam bem na fotografia. Há um claro descrédito para a justiça enquanto o segredo de justiça não for respeitado e não são os jornalistas que o violam, mas quem dentro do sistema vai aos processos e “bufa”.

Na recente entrevista à Lusa do ainda presidente do Supremo Tribunal de Justiça, António Joaquim Piçarra, é claro quando fala da decisão instrutória do processo Marquês e diz que terá repercussões na política e na justiça. O tempo do processo é inexplicável e insustentável e o espaço mediático não é para os juízes, afirma. Diz ainda que o DCIAP não tem de fazer a instrução quando não há acusação.

Recordemos, a propósito, um outro caso ainda mais rebuscado, que envolveu o ex-edil de Lisboa Carmona Rodrigues, que esteve nove anos enredado num processo para depois ser inocentado. Sempre que há um famoso é fartar vilanagem, procurando-se uma justiça do público e não uma justiça pública.

Globalmente, os juízes têm de deixar de pensar politicamente e investigar ou assumir que não conseguem. O risco latente é o cidadão comum assumir que o martelo da justiça é para os pobres e fracos, porque se confunde interesse público com interesse do público.