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‘Match-fixing’: “Deve haver tolerância zero para quem entra nestes esquemas”

Numa altura em que a sociedade portuguesa parece ter ganho consciência de que o match-fixing é real, o Jornal Económico falou com Luís Aguilar, autor do livro “Aposta Suja”, sobre as causas e consequências desta realidade.
28 Dezembro 2017, 16h31

“O match-fixing (ou jogos combinados) é a maior ameaça ao futebol. Redes de crime organizado utilizam o mercado das apostas (legal e ilegal) para viciarem resultados de jogos em todo o mundo. Jogadores, treinadores e árbitros deixam-se seduzir pela força do dinheiro e adulteram resultados nas mais variadas competições. Um fenómeno que se alastra desde as divisões secundárias às principais competições do mundo do futebol. Os homens que arranjam jogos são conhecidos como fixers. Aproximam-se de jogadores e tentam suborná-los para perderem determinado jogo. Estão em toda a parte. Incluindo em Portugal”. Foi com estas palavras, que explicam de forma resumida o fenómeno do match-fixing, que foi apresentado o livro “Aposta Suja”, em setembro de 2015, da autoria do jornalista Luís Aguilar. Numa altura em que a sociedade portuguesa parece ter consciência de que o match-fixing é real, o Jornal Económico falou com Luís Aguilar, autor do livro “Aposta Suja”, sobre as causas e consequências desta realidade.

Esta situação, que alegadamente envolve jogadores do Rio Ave, pode ser a “ponta do icebergue” de algo muito mais denso no que diz respeito ao match-fixing no futebol português?

É difícil responder. O que sabemos é que não é a primeira vez que surgem indícios de jogos combinados no futebol português, seja por causa do mercado de apostas ou de razões desportivas (e muitas vezes estas duas vontades unem-se). Neste caso concreto do Rio Ave, porém, nem sequer sabemos se os jogadores estão envolvidos. Até podem ter sido contactados para esse fim e não aceitaram. O certo é que o match-fixing é um fenómeno global, que atinge todo o desporto mundial, e ninguém pode ficar espantado que o mesmo também tenha entrado em Portugal.

No livro “Aposta Suja”, de 2015, mencionou que o contexto do futebol português era propício para que este fenómeno pudesse ganhar raízes em Portugal. À luz do que conhecemos hoje, Portugal está mesmo na rota deste fenómeno?

Está há algum tempo e daí que a FPF e o Sindicato dos Jogadores tenham dado passos importantes no sentido de combater este fenómeno. Por um lado a vigilância, através do acordo celebrado entre a FPF e a Sportradar, e por outro a prevenção e informação junto dos jogadores, para que possam afastar-se deste tipo de ameaça, e que tem sido bem desenvolvida pelo Sindicato. Também é preciso lembrar que a situação de ontem não ocorreu ontem. É relativa à época passada e os jogadores foram ouvidos há seis meses. Nesta situação concreta não podemos dizer que é um caso isolado nem sequer que houve aqui um caso. Ainda é cedo para tirar esse tipo de conclusões. Os jogadores, sejam eles do Rio Ave ou de qualquer outro clube, são inocentes até prova em contrário. O que sabemos é que existe uma maior vigilância nestas matérias, seja por parte das instâncias desportivas e das autoridades. E esse tem de ser o caminho. O match-fixing existe em todo o lado. E não é a assobiar para o lado que pode ser combatido e travado. E isto é válido para o futebol e para muitas outras modalidades, nomeadamente o ténis, onde se conhecem vários casos a nível internacional.

Até que ponto as autoridades em Portugal estão preparadas para lidar com a questão do match-fixing?

Começam a estar mais preparadas. Há muita informação. Há um conhecimento sobre os intermediários, as origens destes, o modus operandi. Há uma maior colaboração entre instituições desportivas e polícia. Estamos a falar de equipas especializadas para tratar de um fenómeno muito especifico. E essas equipas começaram a ser criadas há algum tempo, estão no terreno e têm um forte conhecimento da forma como devem actuar.

Que repercussões desportivas podem gerar este tipo de situações?

No caso de se provarem ilícitos, podem fazer com que certas equipas percam pontos e até sejam despromovidas. De resto, tivemos casos desses no futebol italiano. E depois há o lado humano. Os desportistas que são apanhados neste tipo de manobras dificilmente voltam a ter carreira. Ficam sempre com essa mancha. Deve haver tolerância zero para todos aqueles que entram nestes esquemas, mas antes disso deve também haver pedagogia e, acima de tudo, regulamentos mais severos para os clubes que entram em incumprimento salarial (de resto posso afirmar que esse não é o caso do Rio Ave, um clube cumpridor).

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