Não há dúvida que 2019 promete ser um ano frenético em anúncios, o que não espanta porque é também ano eleitoral. Só nos primeiros dias, o Governo já anunciou três grandes investimentos públicos, todos no setor dos transportes. Convém não esquecer que, nos últimos três anos, quase não houve intervenções com esta dimensão, ficando o Governo a menos de 20% do total dos investimentos públicos a que se propôs no início do mandato.

Começando pela expansão do Metro de Lisboa, foi lançado há dois dias o concurso para a construção das novas estações (Estrela e Santos) e o consequente prolongamento das linhas amarela e verde. As obras iniciam-se ainda este ano e o investimento ultrapassa os 200 milhões de euros até 2022, sem qualquer valor acrescentado para a requalificação da rede existente.

Na mesma semana, o Governo anunciou a aquisição de 22 novos comboios para a CP pelo custo de 168 milhões a oito anos. Já em fase da liberalização do transporte ferroviário na União Europeia, que entrou em vigor a 1 de janeiro, parece óbvio que o investimento é claramente insuficiente para responder aos problemas atuais e futuros da CP, uma vez que o que se impunha seria a recuperação de material circulante imobilizado e de dezenas de comboios parados e inoperacionais e, naturalmente, a preparação da empresa para um novo paradigma de prestação de serviços ferroviários.

Para completar o ciclo de grandes anúncios, e ao melhor estilo de José Sócrates quando lançou Alcochete em 2008, eis que o Governo, em mais uma bem montada operação de marketing, apresenta ao país o acordo para a construção de um novo aeroporto no Montijo, complementar ao Aeroporto Humberto Delgado, num investimento global até 2062 (próximos 43 anos) de 1.747 milhões de euros.

Parece muito obra, mas em bom rigor e numa leitura mais atenta aos factos, o que se conclui é que o anúncio se refere à expansão do Aeroporto Humberto Delgado, esse sim, um acordo fechado no montante de 650 milhões, já agora um terço do anunciado.

Ou seja, a autorização da construção no aeroporto no Montijo ainda exige a Avaliação de Impacto Estratégico Ambiental, o que significa que se anunciou uma nova infraestrutura sem qualquer garantia de que ela venha mesmo a existir naquele local e naqueles termos. Citando o próprio Ministro Pedro Marques no seu discurso na cerimónia, “nenhum aeroporto começará a ser construído sem as competentes autorizações ambientais e sem que todas as medidas mitigadoras e compensatórias sejam definidas e assumidas”. Também vale a pena olhar para os investimentos para perceber melhor onde é que o Governo aposta mais: o valor previsto para o Montijo é inferior ao atribuído à requalificação do Aeroporto Humberto Delgado (520 milhões para 650 milhões).

Em julho último, num artigo intitulado ‘Nas asas dos interesses’, referi a necessidade de se investir primeiro num aeroporto existente antes de partir para a construção de uma infraestrutura nova. Pois o primeiro-ministro, num daqueles passes mágicos que tão bem o caracteriza, não faz a coisa por menos e avança para as duas obras, sem certeza alguma, mas com grande convicção!

Sim, claro que o país precisa de aumentar a sua capacidade aeroportuária, para, entre outras razões, dar resposta ao crescimento de um setor estratégico para a economia nacional como é o Turismo. O atual aeroporto de Lisboa ficou, em 2018, nos quase 30 milhões de viagens, insuficientes face à procura. Mas há muito que se percebe que a aposta deveria assentar na expansão do atual e não num novo, até porque já existem dois internacionais a sul do Tejo. Acresce que a localização do Aeroporto Humberto Delgado, no centro de Lisboa, é uma vantagem única em relação a outras capitais europeias.

O que aconteceu por estes dias e no que a aeroportos diz respeito foi uma verdadeira feira de intenções para justificar um acordo de revisão de investimentos com a concessionária que vai, finalmente, investir. Será com uma nova fórmula de aumento das taxas aeroportuárias na Portela que as obras de expansão do Humberto Delgado serão financiadas. Pois, na verdade, será com estes aumentos de taxas que se financiará os tais 650 milhões de “investimento” de que se fala. Porque os restantes 1.200 milhões não passam de uma miragem. Uma miragem aeroportuária.