Esta semana as taxas de juro, em vários países na zona euro, renovaram mínimos históricos. Em Portugal, os investidores recebem apenas 0,5% para terem dívida a dez anos, enquanto que para as obrigações alemãs estão dispostos a pagar, sim, pagar, 0,3%. Não se consegue contar o número de vezes que Mario Draghi salvou o euro, mas conseguirá salvar a economia?

Por um lado, temos o “euro económico” que parece cada vez mais irrecuperável, por muito que as taxas de juro baixem. A zona euro está no meio de uma guerra de poder pelo futuro, a tecnologia, e não tem empresas à altura nem um sistema financeiro robusto que permita afirmar-se como alternativa à China ou aos EUA.

Por outro lado, temos o “euro político”, que esse sim foi posto a salvo dos partidos mais extremistas. Os partidos no poder dos governos europeus não se podem queixar de falta de ajuda do BCE. Amplamente criticado por ser um dos bancos que demorou mais a reagir à crise financeira, hoje branqueia todas as acções dos governos. Ao sinalizar que pode baixar ainda mais as taxas de juro, o BCE indica aos investidores que podem emprestar aos Estados, a taxas de juro negativas, ou seja pagando em vez de receber juros, porque sabem que alguém no fim pagará a conta. E o BCE já disse estar lá com um cartão de crédito ilimitado para o fazer.

A restruturação será feita lentamente e à custa do BCE, tal como muitos partidos desejavam. Mas se assim é deveria ser feito de imediato, e teria mais resultado caso financiasse uma parte do Orçamento Europeu, para o investimento em infra-estruturas tão necessárias ao desenvolvimento tecnológico, económico e social da população. Ou porque não dar mais um passo e apoiar a constituição de uma segurança social europeia, onde seja garantido um valor mínimo na reforma?

Financiar os Estados que apenas estão a gerir a sua enorme montanha de dívida abstraindo-se do investimento é adiar o futuro de várias gerações. Vimos no Japão e estamos a senti-lo na Europa. Quando as taxas de juro a 30 anos na Alemanha convergem para zero, sabemos que teremos um longo Inverno, pautado por mudanças profundas. E percebemos de onde virão essas mudanças.

Nas últimas semanas o ouro regressou em força aos radares dos investidores, e as criptomoedas, agora animadas pelo lançamento da “Libra”, registaram subidas estratosféricas. A ordem mundial futura não passa por países, mas por uma nova realidade, o ciberespaço. Os bancos centrais e o actual modelo do sistema financeiro estão a tornar-se obsoletos, e apresentam-se como um obstáculo ao desenvolvimento.

Basta perguntar o que acontecerá se a nova criptomoeda, a Libra, cuja base de clientes será superior a 2,5 mil milhões de pessoas, começar a remunerar os seus clientes, seja por “cashbacks” ou emissão de mais libras. Se a confiança vier para ficar, então acabou de ser criada a moeda mundial, substituindo-se aos Direitos de Saque Especial (DSE) do FMI, que nunca foram grande coisa senão burocracia.

Não tenhamos dúvida que esse novo mundo vai engolir todo o sistema financeiro e com ele os que agora se encontram ao leme dos bancos centrais.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.