Elon Musk, co-fundador da Tesla, teve esta semana uma surpresa ao ver a empresa perder em bolsa mais de três mil milhões de dólares, após um episódio desagradável com um analista que lhe colocou algumas questões incómodas sobre os desafios financeiros do grupo, que no primeiro trimestre teve um prejuízo de quase 800 milhões de dólares.

“Essas questões são muito áridas. Estão a matar-me”, disse Musk em resposta a uma pergunta sobre as reservas relativas ao Tesla Modelo 3, que foi apresentado como sendo capaz de fazer a empresa sair do ‘vermelho’. Segundo a Reuters, minutos antes Musk tinha cortado a palavra a outro analista que o questionara sobre a eventual necessidade de um reforço de capital e pediu para lhe colocarem questões que não fossem “aborrecidas”. Em resumo, Musk perdeu uma boa oportunidade para estar calado e o único aspeto positivo é que, felizmente para os analistas, não tinha à mão um dos vistosos lança chamas que colocou recentemente no mercado, para “fins recreativos”. O certo é que o episódio saiu muito caro aos acionistas da Tesla, a começar pelo próprio Musk, pois as ações da companhia afundaram 7% após este comportamento inusitado por parte de um gestor que tem levantado milhares de milhões de dólares no mercado de capitais.

Musk, que alguns consideram um génio, será um exemplar raro no que toca aos dotes de visionário e à sua atitude pouco convencional mas, infelizmente, nada tem de raro no pouco respeito que demonstra pelo dinheiro dos investidores que nele confiaram.

Vem isto a propósito da discussão que tem sido feita em alguns círculos sobre as normas de contabilidade que alegadamente não servem para as startups. Temos regras de contabilidade do século XIX para empresas do século XXI, dizem algumas pessoas do nosso ecossistema empreendedor.

É verdade que existem argumentos válidos para sustentar que a contabilidade tradicional não é adequada para medir o potencial de criação de valor permitido pelas novas tecnologias. Há com certeza aspetos e normas que se podem rever. Mas por muitas voltas que se dêem às contas, uma startup que acumula prejuízos de milhões durante anos a fio não deixa de ser uma empresa que perde dinheiro.

Podemos argumentar, claro, que o retorno para o acionista poderá ser assegurado não com o cash que a empresa deveria libertar todos os anos, mas com a venda da sua participação a um comprador que reconheça o potencial do projeto. Até porque o ciclo temporal medido por anos fiscais pode não ser adequado a este tipo de projetos. Isto acontece com muitas empresas que não dão lucro nos primeiros anos, mas que têm tecnologias altamente inovadoras que, nas mãos certas e com as estruturas adequadas, poderão gerar retornos significativos. Acontece também em empresas onde o valor de uma marca é tal que pode compensar os resultados negativos que se obtêm no imediato, permitindo dar a volta e atingir o lucro no médio prazo.

Mas ninguém investe dinheiro para o perder ou, o que vai dar ao mesmo, para o recuperar apenas daqui a 30 ou 40 anos. Quaisquer que sejam as regras de contabilidade, em todo o lado os princípios são os mesmos: o lucro é aquilo que obtemos depois de pagar os custos, os juros e os impostos. Ao contrário do que por vezes vemos, sobretudo na nossa imprensa e em algum discurso oficial, o sucesso de um projeto deve ser medido pela capacidade de criar valor e não por ser capaz de levantar milhões de euros em rondas sucessivas de financiamento. Isto era válido no século XIX e continua a sê-lo hoje.

 

P.S.: Os principais partidos perceberam finalmente que é possível fazer um juízo ético e político sobre as suspeitas que incidem sobre José Sócrates e Manuel Pinho. O próprio PS diz estar “envergonhado”. Mas a “vergonha” de César e Galamba faz lembrar o “não tenho memória” de Zeinal Bava. É uma palavra que não compromete quem a profere.