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“Não temos muitos funcionários públicos”

Ministra do Simplex revela que o programa está a poupar milhares de horas de trabalho no Estado. A prioridade vai ser requalificar o pessoal com funções que deixaram de existir.
  • Cristina Bernardo
30 Julho 2017, 16h49

Maria Manuel Leitão Marques é o rosto do Simplex. Lançou o programa como secretária de Estado nos governos do PS, entre 2005 e 2011, e retomou-o agora como ministra da Presidência e da Modernização Administrativa. Em entrevista ao Jornal Económico, garante que as Finanças nunca travaram investimentos no programa devido a restrições orçamentais.

Que balanço se faz deste novo Simplex? Que avanço destacaria?
O avanço é sempre relativo. O Simplex é principalmente uma questão de mudança de cultura. E isso não se faz apenas com um determinado número de medidas cumpridas, ou por decreto-lei. A nossa abordagem da reforma do Estado é fazê-la com um conjunto de medidas cujos objetivos são muito claros, cujo tempo de conclusão de cada medida é previamente fixado, e em que os nossos funcionários são agentes de mudança e de inovação. Concluímos 89% das medidas que deviam estar concluídas até ao final de maio de 2017, concluímos algumas medidas plurianuais em que nos adiantámos, mas temos medidas em atraso.

O que justificou esses atrasos?
Ou o processo legislativo se atrasou, ou o processo legislativo tem de ser consensualizado entre diferentes ministérios, ou o concurso público atrasou-se ou foi contestado e portanto não conseguimos desenvolver a funcionalidade a tempo. Também há casos de serviços que se enganaram a planear, foram muito ousados e definiram uma data que depois não conseguiram cumprir. Ficam mal na fotografia, ninguém gosta, e espero que para o ano sejam mais rigorosos no planeamento. Essas medidas não ficam abandonadas.

Qual a maior dificuldade na implementação do Simplex? Trabalhar com os vários ministérios?
As medidas colaborativas são sempre as mais difíceis, não vou esconder essa verdade. Mas também são aquelas que nos entusiasmam mais, porque são as mais disruptivas, mais inovadoras. No Cartão do Cidadão, por exemplo, havia 14 entidades públicas só no núcleo principal da medida. Na empresa na hora havia três ou quatro.

Em que estão agora a trabalhar?
Estamos a trabalhar numa medida que se chama Espaço Óbito. Não tem um nome simpático, mas é um pesadelo as pessoas que estão numa fase menos alegre da sua vida terem de tratar dos procedimentos relacionados com a morte de um familiar e não saberem onde ir. Estamos a tentar concentrar tudo num só ponto. Outra medida, mais alegre, é poder registar o bebé na maternidade, pedir logo o boletim de vacina, ter médico de família atribuído, ficar logo com o cartão do cidadão.

Quando é que essas medidas estarão disponíveis?
O Nascer Cidadão já está integrado em muitas maternidades do país. O Espaço Óbito está agora em protótipo, com uma nova abordagem muito pouco comum na administração pública, que é um laboratório de experimentação onde prototipamos serviços novos que são muito disruptivos, para termos a certeza de que estamos a desenhá-los bem. Fizemos o teste com os cidadãos com o do Óbito, para perceber se os cidadãos compreendiam a linguagem, que, às vezes, é muito técnica, encriptada. Esperamos instalar o primeiro balcão na Loja do Cidadão que vai abrir no Saldanha.

Que outros serviços estão nesse laboratório?
Os três projetos com que começámos foi o Espaço Óbito – não foi fácil encontrar um nome para este serviço –, o Balcão Único do Emprego, que já está em fase de teste, e um outro menos visível para fora, mas que é muito importante para dentro: o Roteiro da Despesa. Estamos a mapear todos os procedimentos associados à realização de uma despesa para otmizá-los. Não para facilitar a realização da despesa, mas para facilitar o procedimento, reduzir papel, redundâncias. É uma vertente interna do Simplex que também é muito importante.

Qual o impacto económico do programa Simplex?
Mandámos avaliar o impacto global de 14 medidas e temos resultados para 11. Apontam para uma poupança direta para as empresas de cerca de 560 milhões de euros por ano, em horas de trabalho ou custos administrativos, pelo facto de termos simplificado estes 11 procedimentos, como a informação empresarial simplificada, o pagamento de impostos diretos ou a declaração mensal de remunerações para a Segurança Social. Medimos também os ganhos para o Estado, ou seja, quanto é que o Estado poupa em termos de horas ou dias de trabalho. As mesmas 11 medidas pouparam 470 mil horas de trabalho, equivalentes a 50 dias de trabalho por ano.

Isso pode significar uma redução de pessoal na administração pública?
Se nos compararmos com outros países democráticos e com o mesmo índice de desenvolvimento, não temos muitos funcionários públicos. Podemos ter muitos nalgumas áreas que já perderam importância, e podemos ter um problema de mobilidade interna e de qualificações. Mas temos falta de pessoas com competências digitais, por exemplo. Podemos requalificar e mudar para outras funções mais qualificadas que não sejam ir buscar o livro, tirar a fotocópia, enviar a certidão.

Pode ser uma forma de dinamizar o programa de excedentários da administração pública, que agora se chama revalorização?
É importante que o programa seja feito, porque estamos a valorizar, a qualificar para aquilo que precisamos que seja a administração no futuro, e não para o que foi no passado. Ainda me lembro que não havia um serviço público que não tivesse uma datilógrafa. Hoje não está lá nenhuma, mas não despedimos ninguém. Temos de gerir os recursos humanos valorizando-os e qualificando-os para novas funções quando algumas desaparecem.

A inovação é importante mas há serviços, nomeadamente a Segurança Social, onde há muitas queixas de falta de funcionários, de sistemas informáticos que não funcionam, de prestações sociais que demoram muito a ser processadas…
É verdade. Temos muitas queixas, daí a necessidade de fazer o Simplex. Mesmo as coisas que estão bem precisam de ser revisitadas. E depois há muitas coisas que ainda não resolvemos, que não estão bem. A Segurança Social perdeu três mil funcionários entre 2011 e 2015 e é uma área onde não podemos passar o atendimento para o online, porque muitos cidadãos precisam de um atendimento presencial demorado. Muitas vezes, é um misto de apoio e de atendimento social. No Simplex 2017 é uma das áreas com mais medidas, e das mais importantes. Precisamos de melhorar muito o atendimento presencial e online, e também de repor o que o anterior governo acabou, que é o callcenter.

Quando é que uma pessoa vai poder tratar da reforma pela internet? Não apenas um simulador, mas fazer o pedido, saber quanto se vai receber.
Essa medida ainda não está no Simplex porque precisamos de ter os backoffices informatizados, precisamos de digitalizar para prestar o serviço na internet. Enquanto não tivermos o sistema de pensões totalmente informatizado, não o conseguimos dar essa resposta. É um trabalho que estamos a fazer, mas não temos ainda uma data.

A queda de investimento público no ano passado não teve implicações nas medidas do Simplex?
Em primeiro lugar, o investimento está a subir, este ano, em todos os domínios. A queda do ano passado foi devida a problemas na utilização de fundos comunitários. E nós temos um programa, o sistema de apoio à modernização administrativa, que usa fundos comunitários e que apoia prioritariamente medidas do Simplex, por isso não creio que isso tenha acontecido.

Nunca o ministro das Finanças lhe disse para não avançar com uma medida devido a restrições financeiras?
Nunca. É suposto que os ministros, quando inscrevem as medidas, tenham assegurada a dotação orçamental para implementá-las.

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão.

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