[weglot_switcher]

Novo Banco: valor dos juros gerados pelos ativos do CCA pode compensar parte das injeções do FdR

Os deputados têm levantado a questão de os juros associados aos ativos do mecanismo de capital contingente, quando não são recebidos acrescerem às perdas, mas quando são recebidos não abaterem às perdas. A audição desta terça-feira foi a João Gomes Ferreira, partner da Deloitte, que fez a auditoria especial ao Novo Banco.
20 Abril 2021, 13h58

Na audição no âmbito da comissão de inquérito às perdas do Novo Banco, o partner da Deloitte João Gomes Ferreira explicou o impacto que terão no reembolso ao Fundo de Resolução os juros gerados pelos ativos que estão cobertos pelo mecanismo de capitalização contingente (CCA).

Recorde-se que os deputados têm levantado a questão de os juros associados aos ativos do mecanismo de capital contingente, quando não são recebidos acrescerem às perdas, mas quando são recebidos não abaterem às perdas.

João Gomes Ferreira explicou que na data da maturidade do mecanismo (CCA) faz-se um balanço das perdas dos ativos cobertos pelo CCA e o valor injetado pelo Fundo de Resolução (FdR). Se, por hipótese, as perdas fossem os 3.890 milhões de euros e a injeção do FdR fosse esses 3.890 milhões (teto máximo do mecanismo), então todo o valor gerados em juros seriam revertidos para o Fundo de Resolução. Mas se as perdas geradas pelos ativos sob o CCA forem superiores, por exemplo, se fossem 4.200 milhões de euros, e tendo, neste caso, o Fundo injetado o máximo possível que são os 3.890 milhões, essa diferença (que neste exemplo é de 310 milhões) iria ser abatido ao valor dos juros que o banco tem de dar ao Fundo de Resolução no final do mecanismo.

“As perdas de ativos que não são cobertas pelo mecanismo vão abater ao montante de juros a receber para determinar o cashback final”, explicou o partner da Deloitte, que fez a auditoria independente ao Novo Banco.

Portanto os juros nunca agravam o montante total de injeções do Fundo de Resolução ao abrigo do Acordo de Capitalização Contingente.

Recorde-se que o Fundo de Resolução paga ao Novo Banco o montante correspondente às perdas nos ativos abrangidos; mas poderá pagar menos do que as perdas nesses ativos se a insuficiência nos rácios de capital for inferior ao montante das perdas. Pois o Fundo de Resolução é chamado a cobrir as perdas com ativos CCA cumulativamente com o cumprimento do rácio de CET1 de 12%. Isso é que é o acordo de capitalização contingente. Portanto se as perdas forem superiores à deficiência de capital regulatório, o FdR só paga a diferença para o capital ficar bem face ao requisito.

A última auditoria da Deloitte aos resultados de 2019 do Novo Banco indica que os valores pagos pelo Fundo de Resolução até ao final daquele ano foram inferiores em 640 milhões de euros às perdas registadas nos ativos protegidos pelo mecanismo de capital contingente.

Este tema já tinha sido abordado na audição ao ex-coordenador da venda do Novo Banco à Lone Star, Sérgio Monteiro. Nessa audição os deputados confrontaram ainda o inquirido com o facto de os juros associados aos ativos do mecanismo de capital contingente, quando não são recebidos acrescerem às perdas, mas quando são recebidos não abaterem às perdas. Sérgio Monteiro explicou que o encontro de contas é feito no final dos oito anos do mecanismo, segundo o que ficou no contrato. Há uma diferença temporal. “Esta condição foi imposta pelo BCE”, revelou o ex-consultor.

A duração do mecanismo está definida em aproximadamente 8 anos, até 31 dezembro 2025 (a CCA Maturity Date), data que pode ser prorrogada por um ano adicional caso o valor líquido das CCA Assets não desça abaixo de um nível acordado, segundo uma apresentação do Novo Banco.

João Gomes Ferreira foi ainda com as perdas do Novo Banco no fundo de reestruturação Fundo Vallis, em que o banco perdeu a totalidade do investimento de 137 milhões de euros, segundo os deputados. O partner da Deloitte reconheceu que foi uma reestruturação de crédito a construtoras que correu mal e que “envolveu os maiores bancos da praça”. O Fundo Vallis foi  criado para garantir a reestruturação financeira de várias empresas do sector da construção. Em novembro de 2012, o então BES, em conjunto com mais três instituições bancárias portuguesas (Caixa Geral de Depósitos, BCP e Banif) entram no Fundo Vallis com sede no Luxemburgo e um total de investimento de 122,2 milhões de euros.

Este fundo era financiado através de unidades de participação subscritas pelos bancos, mas tinha uma estrutura de gestão própria (o presidente da Sociedade Gestora foi Pedro Gonçalves, ex-presidente da Soares da Costa) que iria receber os ativos que tinham sido dados em em colateral dos créditos, e tentar fazer a valorização dessas construtoras.

A primeira aquisição do fundo Vallis foi a Edifer, seguindo-se-lhe a Hagen, a Monte Adriano, a Eusébios; depois foi anunciada também a compra da Britalar e da Ramos Catarino.

A fusão dos grupos Edifer, Monte Adriano, Hagen e Eusébios resultou mais tarde no Grupo Elevo, depois da aquisição ao Fundo Vallis pela Nacala Holdings, liderada por Gilberto Rodrigues e Pedro Antelo, respetivamente, ex-CEO e ex-CFO da Mota-Engil África. A Ramos Catarino juntou-se ao Grupo Elevo (que a Nacala controlava desde setembro de 2017) e à Opway (desde dezembro de 2017), a construtora do ex-universo Espírito Santo.

Entre a consolidação das construtoras Edifer, Monte Adriano, Hagen e Eusébios no fundo Vallis, a venda do Grupo Elevo à Nacala Holdings e a alienação da restante dívida do Elevo a um fundo estrangeiro, a banca ‘cortou’ milhões de euros da dívida inicial, tal como noticiou o Jornal Económico.

Sobre a venda de imóveis, o partner da Deloitte explicou que as vendas individuais têm sempre um haircut menos do que as vendas de portfólios. Mas ressalvou que as vendas individuais só abrangem os imóveis que são “mais fáceis de escoar”.

João Gomes Ferreira é o partner da Deloitte que fez a auditoria aos atos de gestão do BES/Novo. Banco no período entre 2000 e 2018, ou seja, abarcando quer o período antes quer depois da resolução do BES, como a criação do Novo Banco.

Pelas 15h00, será a vez do responsável da EY, António Filipe Brás, depor perante os deputados.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.