O encerramento temporário da economia foi devastador para todas as indústrias que dependem do turismo. O sector da aviação, mais penalizado, irá sofrer resgates ou nacionalizações equivalentes aos verificados no sector financeiro durante a grande crise de 2008. Não admira por isso que Warren Buffet tenha feito marcha atrás na sua estratégia de acumulação de acções do sector da aviação, uma vez que, se a história se repetir, não será rentável durante muitos e longos anos. O mesmo acontecerá no sector automóvel, e até alguns segmentos do imobiliário.

Nos EUA a pandemia acelerou um movimento em curso nos últimos anos, o de fecho de lojas em centros comerciais, ou de cadeias de distribuição que não se adaptaram ao mercado digital. Só no último ano tinham sido anunciado o encerramento de mais de dez mil lojas, um movimento que irá acentuar-se, com consequências imprevisíveis para os fundos de investimento imobiliário investidos nestes activos. Para além da liquidez que está condicionada à venda de imóveis, alguns fundos de investimento imobiliário enfrentam agora a diminuição de valor dos seus activos, ou seja, imóveis sem rentabilidade. A título de exemplo, nos EUA, as obrigações colateralizadas por imóveis comerciais baixam mais de 30%, num sinal de que o choque neste segmento irá ter consequências para investidores e sector financeiro, para além de colocar uma enorme pressão na gestão destes activos.

Outro problema surge quando olhamos para a performance dos fundos de pensões públicos. A desvalorização dos mercados financeiros teve um impacto na rentabilidade destes fundos de pensões públicos americanos, como não se via há 40 anos. No primeiro trimestre de 2020, estes fundos desvalorizaram cerca de 13,2%, sendo que representam reformas de professores, bombeiros, funcionários públicos, etc.

A já difícil tarefa de garantir dinheiro para pagar pensões aos trabalhadores, devido às taxas de juro negativas, agravou-se com a desvalorização dos activos. Se já existia um défice futuro, derivado do envelhecimento da população, agora é certo que serão os diversos orçamentos públicos a financiar o sistema de segurança social, retirando capacidade de investimento em infraestruturas ou na economia.

A resposta da zona euro continua tímida, cheia de jogos e tentativas de adiar o problema, como se ele se resolvesse por si. Não é possível retomar os níveis de actividade económica sem a vacinação da população mundial, devido ao turismo, sistema de trocas e globalização. Existe ainda outro factor – o de quem tem mais dinheiro. A Sanofi, empresa francesa que está a desenvolver uma vacina para a Covid-19, irá priorizar as encomendas oriundas dos EUA.

Quando pensamos que a situação não pode ficar pior, regressam as ameaças à estabilidade mundial, com as acusações à China de responsabilidade na criação do vírus e de manipulação da informação, naquele que será um caminho sem retorno nos progressos alcançados pela globalização e trocas comerciais.

Este caminho perigoso que Trump está a trilhar, pode até colher louros junto do eleitorado americano, mas a longo prazo, a proibição de empresas chinesas cotarem ou até actuarem no mercado americano terá consequências imprevisíveis nas trocas comerciais.

Infelizmente, a Europa pensou em muita legislação e burocracias, mas nunca na possibilidade de um dia poder substituir os EUA, posicionando-se como uma alternativa ao mercado de capitais americano.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.